Título: Senado quer responsabilizar só ex-diretores por atos secretos
Autor: Colon, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/06/2009, Nacional, p. A4

Para advogado-geral da Casa, ilícito foi não dar publicidade de decisões e "culpado é o autor dessa não-publicação"

Leandro Colon

O departamento jurídico do Senado avalia que a solução para cobrar os prejuízos causados por atos secretos usados para distribuir privilégios a parlamentares e funcionários da Casa será responsabilizar quem escondeu os documentos - os ex-diretores Agaciel Maia e João Carlos Zoghbi. Também está claro para o setor que pessoas nomeadas para os cargos criados pelos atos secretos não terão de devolver o dinheiro recebido, porque a lei não permite.

Como a jurisprudência impede que se tomem salários de quem prestou serviços, é remota a hipótese de anulação dos 300 atos sigilosos descobertos pela Primeira Secretaria. Por outro lado, é viável cancelar, ao menos, as decisões que tratam de privilégios atuais e futuros, como o que estende a marido ou mulher de ex-parlamentar a assistência médica vitalícia.

A saída estudada pelo setor jurídico do Senado é uma forma de tentar diminuir a pressão política e de órgãos de fiscalização, como o Tribunal de Contas da União (TCU), em cima do comando do Senado.

O tema fará parte da reunião da Mesa Diretora na próxima semana. E não será a primeira vez que o assunto estará em pauta. Agaciel e Zoghbi prestaram depoimento no dia 3 e negaram aos senadores a existência dessa prática. Mas ela existia. Agora, alguns parlamentares cobram punição - por quebra de dever funcional - e a anulação dos cerca de 300 documentos descobertos pela Primeira Secretaria e revelados pelo Estado na quarta-feira.

O advogado-geral do Senado, Luiz Fernando Bandeira de Mello, explicou ontem que deve apresentar parecer que tente diminuir o estrago para a imagem da Casa. "A princípio, não tem como pedir de volta o dinheiro de quem trabalhou. Apesar do ato secreto, o serviço, teoricamente, foi prestado. O culpado é o autor dessa não-publicação. O ilícito foi não dar publicidade. Se for comprovada a má-fé, caberá a ele (ex-diretor) esse ressarcimento", afirmou.

NETO

A anulação de todos os atos implicaria o cancelamento de exonerações secretas, como a de João Fernando Sarney, neto do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), lotado no gabinete de Epitácio Cafeteira (PTB-MA) até outubro de 2008. "Isso criaria um problema, pois ele continuaria empregado e teria de receber por esse período", disse o advogado.

A Advocacia-Geral é responsável por opinar e conduzir as decisões jurídicas do Senado. Hoje, é um órgão muito mais próximo do primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), do que de Sarney, padrinho político do ex-advogado-geral Alberto Cascais, exonerado no ano passado por tentar burlar a lei antinepotismo do Supremo Tribunal Federal (STF).

Cascais e Sarney estavam presentes ao casamento de Maiana, filha de Agaciel, na noite de quarta-feira. Bandeira e Heráclito não foram convidados. O primeiro-secretário sabe que o cancelamento de todas as decisões tomadas sob sigilo criaria um mal-estar com Sarney, um dos responsáveis pelo poder desenfreado de Agaciel no Senado nos últimos 15 anos. Muitos atos sigilosos foram produzidos na gestão de Sarney e na de Renan Calheiros (PMDB-AL) na presidência da Casa.

Os dois foram beneficiados pelas medidas, com indicações secretas de afilhados políticos e parentes. O próprio Heráclito se complicaria com a anulação de todos os atos, pois era integrante da Mesa Diretora quando essa prática se consumava rotineiramente.

O procurador Marinus Marsico, representante do Ministério Público no TCU, defende a anulação de todas as decisões, mas admite a dificuldade em receber o dinheiro de volta. "Se um serviço foi prestado, não há como ressarcir os valores", explicou. "Vamos entrar num problema jurídico. A questão é responsabilizar quem fez isso."