Título: Em 15 anos de Real, aluguéis sobem 633,52%
Autor: Racy, Sonia
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/07/2009, Economia, p. B4

Alimentos subiram menos que os 207,69% da inflação acumulada; preço de televisor caiu 50%

Paulo Justus

A inflação acumulada nos 15 anos que o Plano Real completa hoje equivale à variação que antes ocorria em poucos meses. Na medição do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), a inflação de julho de 1994 até a terceira semana de junho deste ano foi de 207,69%. Um mês antes do surgimento do plano, em junho de 1994, a inflação medida pelo índice foi de 51%.

A maior parte dessa alta ocorreu nos primeiros cinco anos do Plano Real. De julho de 1994 a junho de 1999, o IPC registrou alta de 69%. Nos cinco anos seguintes, a variação foi de 44,81% e nos último quinquênio encerrado em junho de 2009, o índice registrou alta de 25,58%.

Entre 20 itens que compõe os gastos das famílias, o aluguel foi o componente com a maior inflação nos últimos 15 anos, com variação de 633,5%. Da mesma forma que a inflação geral, a maior parte dessa alta se concentrou nos cinco primeiros anos do Real. "Durante o processo de inflação muito elevada os aluguéis nunca conseguiram alcançar a inflação" diz Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central, de 1997 a 1999, e sócio-fundador da gestora de recursos Rio Bravo.

Segundo Franco, o combate à inflação, que ainda se manteve elevada para os padrões internacionais nos primeiros anos do Real, foi crucial para a sobrevivência do plano. "Nós não teríamos conseguido indexar a economia e ser bem sucedidos com o plano se a gente não tivesse conseguido ter trazido a inflação, em meados de 1996, para abaixo de 5%" afirma. De acordo com o economista, só depois que as pessoas se sentiram confortáveis com a inflação é que passaram a assinar contratos longos e confiar na estabilidade econômica.

Para o economista da FGV Projetos Fernando Blumenschein, a redução da inflação permitiu liberar mais capital para o investimento produtivo. "Antes, muitos recursos eram alocados para a administração financeira. Como esses custos diminuíram, puderam ser direcionados para o aumento da eficiência e produtividade."

A maior produtividade explica, em parte, por que a maioria dos produtos alimentícios apresentou variação inferior à média da inflação. No levantamento da Fipe, apenas o feijão carioca teve aumento de preços superior ao IPC nos 15 anos de Real. Outros itens, como arroz (com variação de 140%), coxão mole (183,4%), frango (192,5%) e leite longa vida (130,6%) ficaram abaixo da alta do índice.

MERCADO ALTERADO

Para o professor de economia da Universidade de São Paulo (USP) Heron do Carmo, especialista no acompanhamento de preços, a consolidação de grandes redes de supermercados também ajudou a conter a alta nos alimentos. "Isso mudou o jogo de forças com as indústrias e diminuiu as margens do setor." No período, novas tecnologias entraram no mercado e derrubaram o preço de itens como a televisão, que caiu 49,8%.

Os itens com a maior inflação desde a criação do Plano Real estão ligados ao setor de serviços. Educação particular, médico e planos de saúde apresentaram uma inflação maior que o dobro do índice geral. "Isso se deve à mudança na composição das famílias, que estão menores e gastam mais na educação e assistência médica", diz Carmo.

Outro fator a ser levado em conta é o aumento da renda da população. Em julho de 1994, o salário mínimo de R$ 64,79 era 9,1 vezes menor que o necessário para suprir as necessidades básicas individuais e da família, de acordo com o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Em maio de 2009, com o mínimo em R$ 465, essa relação caiu para 4,4 vezes.

"A diminuição dessa relação mostra aumento de 50% no poder de compra nos últimos 15 anos", diz o professor da Faculdade de Informática e Administração Paulista Marcos Crivelaro.