Título: Para Lula, G-8 perdeu a importância política
Autor: Andrei Netto
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/07/2009, Economia, p. B8

Presidente brasileiro diz que, sem os emergentes, representação política do grupo dos países mais ricos para discutir a crise ""já não vale mais""

Andrei Netto

O G-8 (grupo dos oito países mais industrializados e a Rússia) não morreu, mas não tem mais poder de decisão sobre a crise do sistema financeiro internacional. A análise foi feita ontem, em Sirte, na Líbia, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e revigora o esforço que o governo brasileiro tem feito para manter vivo o principal grupo do qual participa, o G-20 (grupo dos 20 países mais industrializados).

Segundo o chefe de Estado brasileiro, a reunião dos sete países mais ricos do mundo, mais a Rússia, que ocorrerá em Áquila, na Itália, marca a continuidade do G-8, mas "sem importância".

As declarações mostraram uma ligeira falta de sintonia entre o presidente e o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Há 20 dias, em Paris, o chanceler havia afirmado que o G-8 "estava morto" desde a Cúpula de Londres do G-20, em abril. Ontem, Lula se disse menos "otimista" do que seu ministro, mas menosprezou a reunião das maiores potências. "Do ponto de vista da representação política, para discutir a crise, o G-8 já não vale mais. Esse não vale mais", reiterou.

Lula disse não acreditar no futuro de um grupo que não conta com a participação de países emergentes como China, Índia e Brasil. "O G-20 vai continuar, o G-8 vai continuar. Sem importância, porque não tem sentido: o mundo hoje não depende somente dos países ricos. Os países emergentes têm uma importância e uma ascendência na economia mais importante que os países ricos", sustentou. Descontraído, Amorim interrompeu Lula e afirmou: "Salvou meu emprego, presidente".

O G-8 se reunirá na próxima semana, entre 8 e 11 de julho, em Áquila, na Itália. O Brasil é convidado apenas para o segundo dia, quando os países emergentes se reunirão com as potências industrializadas. Há cerca de um mês, o governo tem se esforçado para reduzir o peso internacional do G-8, lutando pela sobrevivência do G-20. Parte desse esforço foi realizado na Cúpula dos Brics (Brasil, Índia, Rússia e China), realizada em Ecaterimburgo, na Rússia, há 15 dias.

Sobre sua participação em Áquila, Lula disse que deve voltar a insistir na importância da conclusão do acordo da Rodada Doha, demonstrando satisfação pelo avanço da posição norte-americana sobre as negociações comerciais. "Me parece que agora o Obama já admite conversar. Os interlocutores norte-americanos já estão estabelecendo uma conversa e eu espero que a gente avance", sintetizou.

Outro foco de Lula será insistir no cumprimento das medidas acordadas na Cúpula de Londres do G-20, entre os quais a regulação dos paraísos fiscais, a injeção de recursos no Fundo Monetário Internacional (FMI) e a flexibilização da concessão de empréstimos para países em desenvolvimento. "Nós temos de cumprir as decisões que tomamos em Londres, como colocar mais dinheiro no FMI. O Brasil já colocou a sua parte, a China já colocou a parte dela, a Rússia também. Agora é preciso saber se estão emprestando o dinheiro para os países mais pobres sem condicionalidades."

DÓLAR

O presidente também voltou a comentar as discussões em curso entre os Brics para substituir o dólar nas transações comerciais do grupo.

"O (presidente do Banco Central Henrique) Meirelles esteve na Basileia com a incumbência de estabelecer conversas com a China, a Índia e a Rússia para ver se começamos a criar condições para fazer trocas comerciais entre nós nas nossas moedas, sem ingerência do dólar", lembrou. Lula descartou, porém, que a atitude seja tomada sem o conhecimento dos parceiros industrializados. "É um processo que está caminhando e que será discutido no G-20."