Título: Senado vai terceirizar segurança, após desviar 190 agentes da função
Autor: Colon, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/07/2009, Nacional, p. A4

Licitação prevê 239 servidores, a R$ 10 milhões por ano, para proteger senadores, funcionários e prédios

Leandro Colon, BRASÍLIA

O Senado anunciou ontem uma licitação para gastar R$ 10 milhões por ano na contratação de 239 novos seguranças terceirizados, com o objetivo de proteger senadores, servidores e os prédios da instituição. A solução que economizaria esse dinheiro, no entanto, está escondida em gabinetes e secretarias da Casa. Há pelo menos 190 servidores efetivos do Senado registrados como policiais legislativos, mas em desvios de função, segundo levantamento feito pelo Estado. Esses funcionários deveriam, teoricamente, atuar na segurança da Casa, mas cumprem expediente nos gabinetes dos senadores e nas secretarias, passando longe da tarefa de polícia. Em 18 de setembro de 2003, um ato da Mesa Diretora, então presidida por José Sarney (PMDB-AP) pela segunda vez, transformou 146 servidores do setor de transportes - a maioria motoristas - em policiais legislativos, numa manobra comandada pelo então diretor-geral, Agaciel Maia, que acabou elevando os salários de muitos desses funcionários. Na prática, porém, ninguém virou policial interno. Nada mudou. A expressão "policial legislativo federal" aparece só no contracheque, que varia de R$ 8 mil a R$ 20 mil, dependendo do tempo de serviço e das gratificações.

Em vez de atuar na proteção do Senado, essas pessoas foram deslocadas para tarefas administrativas, enquanto a Casa gasta milhões na terceirização do setor. O Estado identificou, com base no Portal da Transparência, policiais efetivos nos gabinetes de 28 senadores, duas lideranças partidárias, serviço médico, diretoria-geral, comissões permanentes e setores como geração de energia, arquivo, eventos, produção jornalística (TV e Rádio Senado), além de várias outras secretarias.

Na Subsecretaria de Obras, por exemplo, trabalham dois policiais. Outros três cumprem expediente na Subsecretaria de Convergência Tecnológica. Um cuida da "manutenção de veículos", outro cumpre expediente no serviço de multimídia da gráfica e mais três trabalham no serviço de "impressão eletrônica" do mesmo setor.

Sobra, oficialmente, um contingente de 150 servidores efetivos trabalhando de fato para a Polícia Legislativa, que se divide em quatro subsecretarias. Desse montante, 90 são lotados no policiamento diurno e noturno, tarefa que consta na licitação divulgada ontem.

O comando da polícia alega que esses funcionários - alguns concursados e outros efetivados nos anos 80 no famoso "trem da alegria" do então presidente da Casa, Moacyr Dalla (ES) - já estão ocupados com outras tarefas e não podem assumir a missão destinada às empresas terceirizadas.

BRAÇO POLÍTICO

A polícia do Senado sempre foi um braço político de Agaciel. O diretor dela, Pedro Ricardo Araújo, é aliado do ex-diretor e do ex-presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL). A terceirização de mão de obra tem sido um foco de suspeita de corrupção nos últimos anos. Uma sindicância interna, a pedido da Primeira-Secretaria, detectou falhas em 34 contratos, inclusive de vigilância interna.

A licitação para contratar esse serviço externo está marcada para o próximo dia 27. Quem vencer a próxima concorrência vai assumir a segurança de 126 postos de vigilância armada e desarmada do Senado. O edital foi preparado a partir de um projeto da própria Polícia Legislativa. O texto do edital divulgado ontem coincide com funções que deveriam ser exercidas pela polícia da própria Casa.

Segundo o documento, a empresa vencedora deverá receber cerca de R$ 762 mil por mês para fazer segurança dos "bens patrimoniais" e o resguardo "da segurança física das autoridades, servidores e usuários" e das "instalações físicas", além do controle de acesso aos prédios do Senado e das residências oficiais dos senadores.

Na residência da presidência da Casa quatro seguranças serão terceirizados. Vão se juntar a oficiais do Exército e a 14 policiais efetivos que atuam na segurança de Sarney, que tem o direito de usar as Forças Armadas por ser ex-presidente da República. A empresa contratada terá de fazer, por exemplo, rondas ostensivas e impedir o acesso de pessoas "suspeitas", função que cabe, segundo o regimento interno, à Polícia do Senado. O regulamento administrativo é claro: a Polícia Legislativa deve cuidar, entre outras coisas, do "policiamento ostensivo" para proteção das autoridades e dos servidores, além do controle do acesso de pessoas às dependências do Senado.