Título: Impressão de contra-ataque
Autor: Ming,Celso
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/07/2009, Economia, p. B2

A decisão de realizar esta reunião de cúpula do Grupo dos Oito (G-8) países mais ricos do mundo na cidade de L?Aquila, na Itália, pretendeu ser um símbolo de reconstrução. L?Aquila foi o epicentro do terremoto que em abril matou 300 pessoas. A ideia foi tirar da cúpula decisões para a recuperação da economia global depois da maior crise financeira desde os anos 30.

Além do G-8, reúnem-se por lá os principais emergentes do G-5 (China, Brasil, Índia, México e África do Sul). O risco é o de que a cúpula se limite ao símbolo e não consiga nada de palpável para a reedificação da economia global.

O encontro levará três dias e já se sabe de algumas dificuldades para tirar dali ações concretas. O debate sobre meio ambiente parece prejudicado, na medida em que o presidente da China, Hu Jintao, teve de voltar a Pequim para cuidar dos distúrbios no noroeste do seu país, onde já morreram 156 pessoas. Assim, o principal opositor de um amplo acordo sobre proteção ambiental não estará lá para assumir os compromissos.

Os rascunhos da declaração final desta cúpula, a ser divulgada sexta-feira, dizem que não há razão especial para entender que a crise esteja sendo revertida. E essa parece ser a resposta direta à chanceler da Alemanha, Angela Merkel, que vem insistindo em que Tesouros e bancos centrais preparem a estratégia de saída para enxugar os quase US$ 10 trilhões em recursos públicos derramados no combate ao incêndio.

Embora haja sinais de recuperação pipocando ao redor do mundo, as mais recentes informações sobre a situação do emprego global sinalizam que a atividade econômica nos países industrializados continua piorando.

Até agora, as reuniões de cúpula, seja no formato G-8, seja no G-20, produziram mais teatro do que ação no contra-ataque ordenado à crise global. Mas não dá para sustentar que isso tenha sido inútil. Ao contrário, produziu resultados positivos. Por exemplo, acabou com o pânico. Hoje, os mercados ainda derretem ou esquentam, mas sem o estresse visto em outubro e novembro.

Outra consequência positiva foi ter passado a impressão de que, apesar da bagunça financeira, há comando global. Em certa medida, a confiança foi restabelecida. Mas, a rigor, os problemas mais profundos persistem.

Alguns progressos têm sido registrados, mas a situação das instituições financeiras continua ruim. Os bancos americanos seguem superalavancados, na média, em 35 vezes seu patrimônio. E os europeus ainda mais, em 45 vezes, enquanto o recomendado pelos Acordos de Basileia é de no máximo 12 vezes. Para camuflar o problemão com os créditos podres, as autoridades dos Estados Unidos adotaram a "flexibilização da marcação a mercado", pela qual os bancos são autorizados a atribuir a seus ativos o valor que eles próprios acham que têm. Além disso, os testes de estresse aplicados pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) e pelo Tesouro americano nos principais bancos do país, para saber de quanto mais capital necessitam, foram negociados com os próprios bancos - seja lá o que isso signifique.

Enfim, pouco parece ter mudado. Fica inevitável concluir que não há políticas à mão para enfrentar o núcleo da crise. E, sem essas políticas, os maiorais do mundo se limitarão a passar a impressão de que estão agindo.

Confira

É mais profundo - Uma frase do rascunho do comunicado do G-8 avisa que o crescimento sustentável depende de que se restabeleçam os equilíbrios dos balanços dos pagamentos.

É o reconhecimento de que a excessiva liquidez na economia global e a enorme poupança asiática têm como contrapartida os rombos gêmeos dos Estados Unidos, o orçamentário e o da conta corrente.

Por aí se vê que não basta pedir uma nova moeda internacional de reserva. Vai ser preciso reequacionar o jogo global. E isso exigirá mais consumo na China e mais poupança nos Estados Unidos.