Título: Será o caso do G-8 em Áquila?
Autor: Lapouge, Gilles
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/07/2009, Economia, p. B4

O G-8, que iniciou seus trabalhos na Itália, engloba os oito países mais ricos do mundo: EUA, Canadá, Japão, Alemanha, França, Grã-Bretanha, Itália e Rússia. O exuberante e jocoso premiê italiano, Silvio Berlusconi, que hospeda o encontro, teve a ideia barroca de receber seus colegas em L´ Aquila, na região de Abruzzo, cidade que há pouco tempo foi massacrada por um terremoto.

Foi boa a ideia? Ostentosa como ele próprio, mas perigosa.

Em primeiro lugar, os infelizes cujas casas desapareceram no terremoto, estão furiosos vendo ministros e altos funcionários internacionais se exibindo na cidade morta. Além disso, a reunião do G-8 se realizando no local de um desastre geológico, não seria uma maneira de confessar que esses encontros estão no seu ocaso? Ontem, o presidente brasileiro jogou um punhado de terra sobre o caixão do G-8, anunciando o seu fim. O grupo deve passar para as mãos do seu sucessor, o G-20 que, desde novembro de 2008 em Washington, e sobretudo depois da reunião de Londres em março, tem hoje mais credibilidade que o G-8, porque congrega outros países até agora ignorados pela Europa e EUA.

Rajiv Kuimar, da Índia, repetiu o cântico de Lula: "O G-8 deve anunciar seu desaparecimento sem que se espere para ver se o G-20 sobrevive e é eficaz", afirmou. Uma demanda que parece ter aprovação de Angela Merkel e Nicolas Sarkozy, sempre querendo mostrar que é um homem moderno.

Contudo, o G-8 não deve desaparecer logo. Pelo contrário, vai sobreviver pelo menos mais dois anos. Por que? Para que se possa prolongar o diálogo entre o G-8 e o G-5.

Mas o fato é que são tantos "Gs"! G-8, G-20... Temos o G-8, o mais antigo, que agrupa os países ricos; o G-20, dos países mais poderosos. E a esses dois "Gs", acrescente-se o mais recente, o G-5, das grandes potências emergentes: Brasil, México, Índia, China e África do Sul.

E é só? Não...Um outro "G" se anuncia, o G-13, cuja primeira reunião deve se realizar hoje em L´ Aquila, e que nasce da soma do G-8 e do G-5. Mas há rumores sugerindo que esse G-13 pode virar bruscamente um G-14, porque o Egito também quer uma cadeira.

Mas a lista não pára aí. Há outro "G" em gestação. No momento ele se coloca sensatamente por trás da cortina, mas logo mais vai entrar em cena. É o G-16, que vai se consagrar ao clima e à luta contra o protecionismo. E há tanta coisa a ser feita que outro "G" deve ser criado, formado da reunião do G-8 com grandes países da África. Mas esse "G" ainda não tem número, pois a lista de países africanos não foi ainda fechada.

Em L´ Áquila estão sendo debatidos outros assuntos mais concretos, mais cruciais. Em primeiro lugar, fala-se de uma nova repartição de votos dos países emergentes nas duas grandes instituições financeiras: Banco Mundial e FMI.

Como não ficar chocado com o tratamento dado há mais de meio século a países que estão entre os mais importantes do planeta? O Brasil, 11ª economia mundial, tem só 1,38% de direito de voto nessas organizações, enquanto a simpática mas minúscula Bélgica tem 2,09%.

Os dirigentes dos países ricos concordam que há injustiças. Mas quando se trata de passar da palavra aos atos, começam a pensar em outra coisa.

Uma proposta inteligente foi feita por Jean-Claude Juncker, de Luxemburgo. Para liberar direitos de voto em favor dos países emergentes, poderia se reagrupar os países "sub-representados" no FMI ou no Banco Mundial. Por exemplo, os 27 países europeus, que hoje têm 32,4% de votos no FMI, seriam agrupados numa entidade, reduzindo a parte de cada um, de modo que o conjunto dos europeus ficaria com 20% ou 21%.

Essa operação permitiria liberar uma porcentagem de votos a ser redistribuída entre os países hoje sub-representados. Claro, cada um dos 27 países europeus teria diminuída a sua parte. Em compensação, a Europa reagrupada pode ganhar uma força nova. Teria mais votos que os EUA, que tem 16,7%.

Uma tática engenhosa: cada país europeu perderia, mas a Europa unida ganharia. Pergunta-se: essa hipótese de trabalho seduziu os grandes amigos dos países emergentes, especialmente Sarkozy ou Angela Merkel? Claro que não!

* Gilles Lapouge é correspondente em Paris