Título: Gravação da PF mostra Fernando como operador da família Sarney
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/07/2009, Nacional, p. A4

Único dos três filhos a não entrar oficialmente para o mundo da política, ele se mostra eficiente articulador

Rodrigo Rangel e Leandro Colon

As gravações feitas pela Polícia Federal no âmbito da Operação Boi Barrica - com autorização judicial - revelam o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), como operador atuante nos negócios e também na política. Um dos alvos preferidos dele, revelam os diálogos, é o setor elétrico - nos telefonemas, interlocutores como o diretor da Eletrobrás, Astrogildo Quental, e o assessor do ministro Edison Lobão (Minas e Energia) Antonio Carlos Lima, o Pipoca.

Responsável pelo dia a dia das empresas do clã Sarney no Maranhão, Fernando, avesso aos holofotes e único dos três filhos de Marly e José Sarney a não entrar oficialmente para o mundo da política, se mostra um eficiente articulador, sempre preocupado com dinheiro e com os interesses da família no setor público.

Apontado pela Polícia Federal como chefe de uma organização criminosa com tentáculos sobre órgãos do governo federal comandados por apadrinhados do pai, Fernando esbanja poder. Nas interceptações da Boi Barrica, é personagem de muitas conversas cifradas, pontuadas por suspeitas. Num diálogo gravado pela polícia em 26 de março de 2008, por exemplo, Fernando e o irmão deputado Zequinha Sarney (PV-MA) falam sobre uma transação pendente no Maranhão.

"Aquele assunto, Fernando, lá do Maranhão, é 900 mil, não tem nada de 5 milhões, não", diz Zequinha. "O negócio é quente."

"Então é tudo procedimento. Procede tudo, né?", pergunta Fernando. O deputado responde: "Procede, mas não da maneira que tu falaste. Não era assim também não. Era nota fria."

Com o irmão, a quem chama de Zecão, Fernando também falava frequentemente sobre pesquisas eleitorais e a cobertura política dos veículos da família, no Maranhão.

Os contatos de Fernando, que por dia costumava atender e efetuar uma média de 150 chamadas em seu celular, se concentram entre o Maranhão e Brasília. Há dezenas de ligações, por exemplo, para Astrogildo Quental - até hoje diretor financeiro da Eletrobrás, por indicação de Sarney.

Nas conversas com Astrogildo, seu colega de faculdade, Fernando fala pouco. No máximo, sobre indicações para postos na estatal. "Vou ver se eu consigo com o Lobão, em Brasília, semana que vem", diz ele ao amigo, chamado de Astrinho, sobre um pleito do grupo no Ministério de Minas e Energia, comandado por Edison Lobão, outro indicado de Sarney. A dupla Fernando-Astrogildo prefere conversar pessoalmente. Há várias ligações para marcar reuniões.

Em outro diálogo a que o Estado teve acesso, Fernando é contatado pelo ex-senador Maguito Vilela, à época vice-presidente do Banco do Brasil. Também nesse caso, a conversa não se estende ao telefone. Maguito queria falar pessoalmente com Fernando. "Precisava falar com você na quarta-feira", diz ele. "Tenho estado muito com seu pai", observa Maguito, alçado ao cargo no Banco do Brasil pelo PMDB de Sarney.

""CENTRAL""

Fernando funciona como uma central de solução de problemas de todo tipo. Costuma ser acionado com frequência pelos auxiliares de seu pai no Senado. Em outro diálogo interceptado pela PF, quem liga para ele é Aluísio Mendes Filho, ajudante de ordens de Sarney e hoje na Subsecretaria de Inteligência do governo do Maranhão. Aluísio passa o telefone para Fernando César Mesquita, outro assessor de Sarney no Senado.

"O cara que é vice-presidente do Eike, o Paulo Monteiro, tá aí no Maranhão. Ele vai te procurar aí pra falar um negócio aí sobre esse problema da usina deles", diz Mesquita. "Diga a ele pra me ligar", responde Fernando. O Grupo EBX, de Eike Batista, estava às voltas, à época, com problemas na Justiça para instalação de uma usina termoelétrica nas imediações do Porto de Itaqui, no Maranhão.

Ao Estado, Mesquita disse que apenas intermediou o contato entre o representante da EBX e Fernando. "Eu conheço tanto o pessoal do Eike quanto o Fernando. Eles estão construindo uma termoelétrica no Maranhão e queriam um contato de relações públicas com o Fernando. Foi isso", afirmou.

Fernando também aparece em conversas com Pipoca - assessor de Lobão cuja mulher é dona de empresa de fachada que recebeu parte do dinheiro repassado pela Petrobrás à Fundação José Sarney. Numa das conversas, Pipoca reclama de mal-entendido envolvendo "coisas" que tinham conversado sobre a Eletrobrás. Fernando o consola. "Eu luto pra te botar no melhor dos mundos, Pipoca."

Nos diálogos, Fernando trata com igual desenvoltura e dedicação desde assuntos de negócios e nomeações no serviço público até assuntos mais comezinhos. Num dos diálogos, ele e um assessor de Sarney tratam de convites para a filha, Ana Clara, assistir à "missa do papa".

Procurado, o empresário não atendeu às ligações ontem. Em nota, seu advogado, Eduardo Ferrão, reagiu à divulgação, pelo Estado, das gravações feitas pela PF. A nota diz que as conversas são "estritamente privadas, sem qualquer conotação de ilicitudes". As conversas revelaram a mobilização da família para empregar no Senado o namorado de uma neta de Sarney. A nomeação saiu via ato secreto. O próprio Sarney foi gravado pela PF. Os diálogos revelaram sua relação com o ex-diretor do Senado Agaciel Maia nos favores a parentes e agregados, algo que o senador vinha negando. "Trata-se da divulgação mutilada de trechos de longas conversas telefônicas mantidas entre familiares", escreveu o advogado de Fernando. O Estado publicou as gravações na íntegra, sem nenhuma alteração.

25 Mar 08 13h44m20s Fernando conversa com uma mulher de nome Andréa , que lhe cobra resposta sobre um pleito no Ministério das Minas e Energia, comandado por Edison Lobão, indicação de seu pai, José Sarney. Fernando diz que deixou o assunto por conta de Antonio Carlos Lima o ¿Pipoca¿, assessor de Lobão cujo nome já havia aparecido no escândalo da Fundação José Sarney. Andréa ¿ Ta me ouvindo. Fernando ¿ Estou te ligando pra saber se tem alguma novidade. Fernando ¿ Presta atenção: vou estar em Brasília. E tenho que ligar às 18 horas pro Pipoca, assessor do Lobão, já deixei o assunto com ele. O Astrogildo e ele já estão a par do assunto para levar para o ministro para resolver nessa semana . Tu vai ligar pro Pipoca e fazer chegar de novo o currículo referencial do seu marido. Para ele ficar com isso na mão. Na quinta-feira to por aí para gente bater o martelo. Andréa ¿ No caso, ligo pro Antonio Carlos Lima de tarde? Fernando ¿ daqui a pouco, tu liga pra ele e combina. Andréa ¿ Boa sorte e muito obrigado. 26 Mar 2008 18h40min27s Fernando Sarney conversa com o irmão o deputado Zequinha Sarney. Sem entrar em detalhes, eles falam sobre um ¿negócio quente¿ de R$ 900 mil no Maranhão. ¿Era nota fria¿, diz o deputado ao irmão. Assessor do gabinete de Zequinha na Câmara ¿ Fernando, posso te passar o depuatdo? Fernando ¿ Pode Zequinha ¿ Alô Fernando ¿ Oi Zecão Zequinha ¿ Estava em São Paulo? Fernando ¿ Estou em São Paulo. Zequinha- Vai ficar aí até amanhã ou depois? Como ta sua vida? Fernando ¿ Não Zeca, amanhã to por aí na posse da Kátia. Zequinha ¿ Papai já chegou com a mamãe, já estão em casa. Aquele assunto, Fernando, lá do maranhão, é 900 mil, não tem nada de 5 milhões, não. Fernando ¿ Ah é? Zequinha - -E, eu falei pra ele e ele me deu uma esculhambação (inaudível). Eu falei foi Fernando que me disse. Fernando ¿ Ele já sabe? Zequinha ¿ Ele ligou pra Sérgio Macedo (atual secretário de Comunicação do governo Roseana Sarney). Fernando ¿ Quem passou a informação foi Sérgio Zequinha ¿ E ainda passou errado, filho da puta. Fernando ¿ Mas de qualquer jeito, se ta documentado, é importante Zequinha ¿ Não, é muito importante. O negócio é quente, não tem nada no (inaudível), importância nenhuma. Se fosse 10,30, 900, 5, não tem problema. O importante é processo. Fernando ¿ Então é tudo procedimento. Procede tudo, né? Zequinha ¿ Procede, mas não na maneira que tu falaste. Não era assim também não. Era nota fria. Fernando ¿ Mas está tudo lá, bonitinho. Zequinha ¿ Não sei, disse que sexta-feira vai receber mais não sei o quê, não entendi direito. Vamos ver, está tudo encaminhando tudo bem... 26 Marc 2008 18h 46m 13s Fernando Sarney atende um telefonema do ex-senado Maguito Vilela, à época vice-presidente do Banco do Brasil. Maguito diz que estava precisando falar com Fernando. Deixa claro que o assunto não podia ser tratado por telefone. Maguito ¿ Fernando, como vai rapaz, tudo bem? Fernando quando você vem a Brasilia? Fernando ¿ Eu tenho ido direto. Maguito ¿ Eu precisava falar com você quarta-feira. Fernando ¿ Senador, lhe prometo o seguinte, você ta no Banco do Brasil, né? Maguito ¿ Sim, estou na vice-presidência de governo. Tenho estado muito com seu pai. Fernando ¿ Eu amanhã vou passar por Brasília, se eu conseguir (...) Maguito ¿ Se tiver uma horinha, vou no aeroporto e converso com você ou você vem tomar um café aqui. Fernando ¿ Me dê seu celular (...) Então lhe ligo. Maguito ¿ Resolveu aquele problema em Goiânia, Fernando? Fernando ¿ Em parte, sim. Era mais um negócio de pagamento e o pessoal conseguiu compatibilizar foi pagando aos pouquinhos. Acho que conseguiu, porque ele queria um canal e um dialogo com o pessoal direto, e eu pude proporcionar. E acho que andou, porque eles não me ligaram mais. Fernando Sarney atende ligação do ajudante de ordem do pai. Sarney quer falar. O senador queria a avisar o filho sobre o andamento dos recursos que os advogados da família impetram no Superior Tribunal de Justiça para ter acesso aos autos da Operação Boi Barrica, que corria em segredo. Fernando Sarney ¿ Diga, Piccolo. Aluisio ¿ É Aluisio. FS ¿ Diga Aluisinho Aluisio ¿ Tudo tranqüilo? FS ¿ Tudo Aluisio ¿ Tava jogando uma bolinha? Ta cansado... FS ¿ Tava. To aqui no basquete. É isso aí. Aluisio ¿ Peraí que seu pai quer dar uma palavrinha contigo, Fernando. Um abraço. FS ¿ Ta outro. José Sarney ¿ Alô FS ¿ Benção, pai. Sarney ¿ Deus te abençoe, como vai? FS ¿ Tudo bom e tu? Sarney ¿ Olha, o processo foi distribuído, o novo, para o Galotti. FS ¿ Certo. Sarney ¿ Se pudesse falar como o teu amigo pra dar uma palavrinha... ta? FS ¿ Perfeitamente. Ta. Sarney ¿ Ta bom FS ¿ Ta bom. É, mas isso eu tenho que fazer pessoalmente. Pegar um avião e ir aí segunda, né? Sarney ¿ Não FS ¿ Não? Sarney ¿ Fala com ele pelo telefone. FS ¿ O meu? Nós estamos falando do segundo meu, né? Sarney ¿ É FS ¿ O meu, né? Sarney ¿ É. Do segundo seu. FS ¿ Ok, pra fazer a mesma coisa Sarney ¿ O que foi feito lá no STJ. FS ¿ Ta bom, ok. Sarney ¿ Tchau um abraço FS ¿ Ok, ok.