Título: Cansaço abate defensores de Zelaya
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/07/2009, Internacional, p. A10

Impedidos de chegar à fronteira, partidários de líder deposto de Honduras querem abandonar ?resistência? a golpe

Roberto Lameirinhas, LAS MANOS, HONDURAS

Após quatro dias de mobilização para tentar chegar à fronteira com a Nicarágua, partidários do presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, mostravam ontem sinais de desânimo. Impedidos pelos bloqueios policiais de encontrar-se com o líder, muitos já buscavam meios para abandonar o ponto de maior concentração da "resistência" ao golpe militar do dia 28, em El Paraiso, a cerca de 20 quilômetros da cidade fronteiriça de Las Manos.

"Não há comida para todos aqui, somos assalariados e muitos de nós não podem correr o risco de perder mais um dia de trabalho amanhã", disse uma das líderes dos piquetes e bloqueio de estradas de El Paraiso, Silvia Flores. "Estamos cercados e cansados. Não podemos ir até a fronteira nem retroceder", declarou, por seu lado, o militante Cesar Castro, que vestia uma camiseta com uma imagem de Ernesto Che Guevara.

Depois de recuar de sua intenção, anunciada na véspera, de acampar na zona de fronteira de Las Manos, Zelaya pouco saiu ontem do quarto do Hotel Frontera, na cidade nicaraguense de Ocotal. Diferentemente do sábado e da sexta-feira - quando atravessou por poucos metros e minutos a fronteira e pisou pela primeira vez em solo hondurenho desde o dia 28 -, não tinha aparecido até o fim da tarde do domingo no posto de alfândega.

Para assessores do governo de facto de Roberto Micheletti, Zelaya tem visto suas opções para retomar o poder reduzindo-se a cada dia. A chamada "insurreição popular" convocada pelo líder deposto para levá-lo de volta a Tegucigalpa não chegou nem a se constituir. Só uma pequena, embora ruidosa, claque vinda da Nicarágua o saudou durante suas duas visitas à zona de fronteira - servindo de cenário para as pouco imparciais câmeras da emissora Telesur, cujo maior acionista é o Estado venezuelano controlado por Hugo Chávez.

No sábado, em conversa com um grupo de jornalistas estrangeiros na fronteira, o próprio Zelaya admitiu que depende da mobilização popular para manter o apoio da comunidade internacional. Embora a saída diplomática pareça a saída que lhe sobra, Zelaya criticou a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, que havia qualificado de "imprudente" a tentativa dele de voltar a Honduras. Ele também deu a entender que não irá a Washington amanhã para encontrar-se com Hillary. "Se o Departamento de Estado quer se reunir comigo, terá de vir a Ocotal."

Zelaya disse que mantém "estreito contato" com o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, com quem vem trabalhando para "afinar a estratégia diplomática" para pressionar o governo Micheletti.

Por sua parte, as Forças Armadas de Honduras emitiram ontem um comunicado reiterando sua subordinação ao poder civil, deixando claro que aceitarão qualquer acordo firmado pelas força políticas - o que incluiria, implicitamente, a possível restituição do poder a Zelaya. O general Romeo Vásquez Velásquez, comandante do Estado-Maior do Exército, voltou a justificar no sábado a expulsão do presidente do país, alegando que cumpriu ordens do Judiciário e Legislativo. Em processos sumários, os dois poderes afirmam ter destituído Zelaya em razão de sua insistência em realizar uma consulta popular não vinculante que abriria caminho para uma mudança constitucional que lhe permitiria voltar a ser eleito.

IDAS E VINDAS

Retorno: Desde os primeiros dias após o golpe, Zelaya prometia voltar, desafiando a ameaça do governo de facto de prendê-lo. Depois da fracassada tentativa de pousar em seu país no dia 5, cruzou fronteira em Las Manos na sexta-feira, mas voltou minutos depois à Nicarágua

Diplomacia: Depois de seus assessores terem confirmado sua presença amanhã em Washington, para reunião com secretária de Estado Hillary Clinton, Zelaya criticou a chefe da diplomacia americana e descartou viagem

Acampamento - Zelaya anunciou, no sábado, que traria barracas, água e comida para acampar a poucos metros da fronteira à espera de líderes de movimentos sociais que estariam "chegando pelas montanhas" para traçar estratégia de retorno a Tegucigalpa. Mas, horas depois, voltou a hotel na cidade nicaraguense de Ocotal