Título: Poder de estatal do pré-sal divide governo
Autor: Lima,Kelly ; Pamplona, Nicola
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/08/2009, Economia, p. B9

Proposta apoiada por Lobão prevê poder de fiscalização da partilha

Kelly Lima e Nicola Pamplona, RIO

O poder de atuação da nova estatal foi um dos temas polêmicos na reunião de apresentação no novo marco regulatório para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na quarta-feira. Segundo fontes próximas da comissão interministerial, uma corrente defende maiores poderes para a nova empresa, entre eles o de fiscalizar as concessões. Outra vertente quer uma atuação mais restrita, mantendo a fiscalização nas mãos da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

A primeira hipótese tem apoio do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, que teria sugerido que a estatal seja responsável por acompanhar o desenvolvimento dos projetos do pré-sal, fiscalizando a partilha entre a estatal e seus parceiros. "Há um temor quanto ao esvaziamento e enfraquecimento da ANP, que é, por definição, o órgão regulador", comentou outra fonte contrária à proposta.

O escopo de atuação da nova estatal é visto com preocupação dentro da ANP, que já havia perdido, no início do governo Lula, a responsabilidade pela definição dos blocos que vão a leilão. Hoje, a agência apresenta uma lista de sugestões ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que dá a palavra final. Internamente, executivos da agência esperam que a atribuição de fiscalizar os contratos seja mantida.

Uma fonte próxima da agência lembra que há pontos importantes a fiscalizar em contratos de partilha de produção, além da partilha propriamente dita, como a recuperação dos custos de investimento nos projetos. Geralmente, esses custos são informados ao órgão regulador, para que defina quanto deverá ser ressarcido ao investidor antes da partilha do lucro.

Presente ao encontro de anteontem, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, disse, porém, que há consciência de que o órgão regulador teve seu papel preservado. "Está muito clara a delimitação do papel da ANP, que será preservado, e da nova empresa", disse.

Outro executivo com acesso à reunião disse considerar "natural" a existência de opiniões divergentes dentro do governo. "O grupo apresentou vários caminhos possíveis e o presidente quer refletir para decidir quais os melhores. Trata-se de um tema de enorme importância para o País", afirmou.

PARTILHA

De acordo com os anteprojetos apresentados a Lula, o contrato de partilha será dividido em três partes. A primeira é da Petrobrás, que será operadora de todas as áreas, com participação ainda indefinida. A segunda parte do bloco ficará com o investidor e será disputada em leilão, do qual a Petrobrás pode concorrer, elevando a sua fatia para perto dos 100% - uma parte de cada projeto será destinada à estatal.

A forma como vai se garantir a participação mínima da Petrobrás nos blocos do pré-sal em que a empresa for apenas a operadora é outra divergência que trava a conclusão dos trabalhos de elaboração do novo marco regulatório. Segundo fontes do governo, a estatal quer ter assegurada em lei uma fatia de 30% da produção dos blocos nesses casos. Já a Casa Civil e o Ministério de Minas e Energia preferem que o porcentual seja definido caso a caso pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

O governo já decidiu que a Petrobrás terá um papel preponderante na exploração e produção do pré-sal. Em alguns casos, o CNPE poderá destinar blocos à empresa diretamente, sem licitação. Em outros, a estatal disputará leilões com empresas privadas pelo controle das áreas de produção.

Mesmo se perder a disputa, atuará como operadora em todos os blocos e, nesses casos, terá uma participação mínima nos resultados. É nesse ponto que, segundo uma fonte, "falta o acerto de detalhes".

No Ministério da Fazenda, o assunto é tratado mais como "pendência" do que como "divergência". Uma fonte da Pasta ressaltou, porém, que, se for decidido por um porcentual permanente, o mesmo deve ser previsto em lei assim que o marco regulatório for fechado, diferentemente da decisão caso a caso em que as participações seriam discriminadas apenas nos avisos de leilão.

A grande preocupação da Petrobrás, de acordo com essa fonte, é que, sendo apenas operadora, estaria mais sujeita aos ônus do que nos bônus da atividade. "Qual o interesse da estatal nisso?", perguntou.

COLABORARAM MÔNICA CIARELLI, LEONARDO GOY e CÉLIA FROUFE

O DIABO MORA NOS DETALHES

Outorga: Quando leiloar uma área para exploração, o governo vai ou não cobrar uma antecipação de receitas? Fazenda defende que sim. Casa Civil acha que não, para não encarecer o óleo nem afastar potenciais competidores.

Royalties: Os recursos pagos a Estados e municípios onde há exploração de petróleo devem ou não ser ampliados? Ministério de Minas e Energia acha que sim, para estender a distribuição de renda às áreas onde não há exploração.

Outros setores do governo acham que os royalties devem ficar como estão. A distribuição de renda seria feita pelo fundo social.

Fundo Soberano: Para onde deve ir a parcela da União no pré-sal? A Fazenda defende que o dinheiro vá para o Fundo Soberano que já existe. Outras áreas acham que o dinheiro deveria ir integralmente para o fundo social. O Ministério de Minas e Energia defendeu a criação de outro fundo soberano, exclusivo para investir o dinheiro do pré-sal no exterior.

Rendimento: Quanto do dinheiro do pré-sal deve ser gasto em educação e assistência social? Na Noruega, que serviu de modelo às discussões, o dinheiro é aplicado num fundo que investe no exterior e só uma parte do rendimento é gasta no país. Aqui, há quem defenda não restringir o gasto aos rendimentos das aplicações.

Nova estatal: Como será o orçamento da nova estatal? Um porcentual dos contratos de exploração ou recursos do Tesouro Nacional? Onde a nova estatal será sediada?

-------------------------------------------------------------------------------- adicionada no sistema