Título: Projeto executivo malfeito abre brechas
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/07/2009, Economia, p. B3

Segundo especialista, fica fácil promover sobrepreço

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A falta ou a má qualidade de um projeto executivo é o primeiro passo para a ocorrência de uma série de problemas numa obra, desde surpresas no local de construção até irregularidades. Segundo especialistas, sem um documento consistente, fica "fácil" até mesmo promover o sobrepreço no valor dos empreendimentos. Isso porque o projeto entra em um nível tão grande de desorganização que dificulta o acompanhamento da execução da obra.

"Um projeto básico levanta todos os detalhes que vão envolver a construção, como as espécies vegetais e animais e as sondagens no subsolo. Além disso, ele sugere as melhores tecnologias dispostas no mercado para dar eficiência à obra", afirma o presidente do Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco), José Roberto Bernasconi. "Da mesma forma, o projeto traz os preços dos materiais e prazos de conclusão da obra."

É claro que algumas vezes os engenheiros vão se deparar com situações desconhecidas, como sítios arqueológicos. Mas, com um projeto básico de qualidade nas mãos, dificilmente um empreendimento dobrará de preço. Segundo o presidente do Sindicato Nacional da Construção Civil (Sinicon), Luiz Fernando dos Santos Reis, tem sido muito comum o custo dos projetos darem um salto durante o processo de construção. "Já vi casos de obras em que o cliente diz que vai custar R$ 300 milhões, mas já sei que vai custar R$ 1 bilhão." Isso tem sido um grande chamariz para o Tribunal de Contas da União (TCU), que tem exigido revisões em alguns contratos.

No Porto de Itaqui, por exemplo, as obras de dragagem, alargamento do cais, ampliação do terminal e recuperação de alguns berços tiveram os contratos revisados por determinação do tribunal. Segundo o gerente de engenharia do porto, Luiz Alvim, a Empresa Maranhense de Administração Portuária (Emap), que administra o porto, fez algumas considerações e reduziu os valores.

No caso da dragagem, o valor deve cair para R$ 40 milhões. No primeiro balanço do PAC, essa obra estava orçada em R$ 49,5 milhões. No último relatório, subiu para R$ 55 milhões. O mesmo deve ocorrer com o alargamento do cais e ampliação do porto, que terá o preço reduzido em R$ 1 milhão.

"O tribunal pediu para reduzir alguns itens que estavam em duplicidade. Além disso, determinou que retirássemos os valores referentes à cobrança de CPMF (cobrada até 2007). Fizemos todos os ajustes." Uma das construtoras, no entanto, não aceitou a redução dos valores e recorreu da decisão.

O diretor executivo da Associação Paulista de Empresários de Obras Públicas (Apeop), Carlos Eduardo Lima Jorge, vislumbra novas revisões de contratos pela frente, a exemplo do que tem ocorrido em Itaqui. Segundo ele, em 2008, para acelerar e liberar recursos do PAC, houve um aumento nas assinaturas de convênios, sem os devidos cuidados.

"Nesse amontoado de documentos, havia muitos projetos incompletos e mal executados que foram usados em licitação. Agora, começam a refazer os contratos porque os ministérios e o órgão repassador (a Caixa) não aceitam", destaca Jorge.

O executivo lamenta que o País ainda não tenha adquirido a cultura do planejamento e dos projetos básicos, como ocorre em países da Europa e até mesmo no Chile. "Nesses locais, há uma preocupação muito grande com a qualidade dos estudos. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vem tentando criar um banco de projetos."