Título: OAB quer fim das doações secretas aos candidatos
Autor: Lopes, Eugênio
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/09/2009, Nacional, p. A6

Entidade vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal se forem mantidas as contribuições que, ao passar pelos partidos, ocultam sua fonte

A Ordem dos Advogados do Brasil pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal caso seja mantida, no projeto de reforma eleitora, a possibilidade de candidatos receberem as chamadas doações ocultas.

Graças a uma brecha na legislação que o Congresso não dá mostras de querer fechar, empresas e pessoas físicas podem financiar campanhas sem que sua identidade seja revelada. Basta que a doação seja feita ao partido, e não ao candidato.

Nas eleições para a Prefeitura de São Paulo, em 2008, doadores camuflados pelos partidos foram fonte de R$ 42,9 milhões para as quatro principais campanhas nada menos do que 53% da arrecadação declarada. Em 2006, tanto o PT quanto o PSDB se utilizaram do artifício para custear despesas de seus candidatos à presidência , Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin.

Segundo Marcus Vinicius Furtado Coelho, da Comissão da Legislação da OAB, o projeto da reforma eleitoral aprovado pelo Senado e que voltará a ser analisado pela Câmara é inconstitucional em dois aspectos. Primeiro, fere o princípio da publicidade, ao impedir que os eleitores saibam quem são os financiadores dos candidatos. E, segundo, não dá a Justiça Eleitoral todas as informações necessárias para o julgamento das contas de campanha um atropelo ao chamado exercício de jurisdição.

¿É uma brecha muito conveniente para candidatos que não querem transparência¿, disse o advogado Alberto Rollo, especialista em legislação eleitoral. Ele observou que os partidos só prestam contas das doações recebidas no ano seguinte ao da eleição, quando os vencedores já estão diplomados e empossados. Como um partido pode receber recursos de múltiplas fontes e distribuí-los para vários candidatos em diferentes cidades ou que concorrem a cargos distintos, torna-se impossível avaliar qual é a conexão entre doadores e políticos.

Além disso, Rollo destacou que, com a doação ao partido, tam´bem pode ser burlado o teto de contribuições previsto na lei eleitoral de 2% do faturamento anual para empresas e de 10% da renda para pessoas físicas.

¿É uma sacanagem¿, resumiu Cláudio Weber Abramo, diretor da OnG Transparência Brasil, que fiscaliza a atuação de agentes públicos no País. Ele lamentou a rejeição de emenda do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que determinava a revelação dos autores das contribuições ainda no decorrer das campanhas, e não somente após as eleições, como ocorre atualmente. ¿O padrão das doações expõe os compromissos dos políticos. Se querem esconder, é porque pretendem enganar os eleitores¿.

¿Os empresários não dão dinheiro por causa dos belos olhos dos candidatos. É nas doações que transparência tem de começar", cobrou Rosângela Giembinsky, uma das coordenadoras do Movimento Voto Consciente, outra organização não-governamental voltada ao monitoramento de políticos.

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) também põe questões a constitucionalidade ria nova lei, após a aprovação pela Câmara. "Já que não houve disposição dos parlamentares para dar transparência ao processo, o caminho natural é o Supremo¿, disse Mozart Valadares Pires, presidente da entidade. Para ele, ¿todos os escândalos têm origem no financiamento eleitoral¿.

Tema é consensual no Congresso

A manutenção das doações ocultas para as campanhas eleitorais foi um dos poucos pontos de consenso entre a Câmara e o Senado na minirreforma eleitoral. Deputados e senadores da base aliada e de partidos de oposição se uniram para permitir que as empresas possam fazer contribuições aos diretórios dos partidos, que repassam os recursos aos comitês financeiros ou mesmo diretamente aos candidatos. Isso evita que o candidato fique ¿carimbado¿ pela doação de determinada empresa.

Hoje, as doações camufladas ocorrem graças a brechas na legislação . Com a aprovação da reforma, a modalidade será autorizada de forma explícita.

O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) tentou eliminar as doações ocultas. Mas teve suas emendas rejeitadas, pois senadores consideraram sua proposta um ¿inibidor¿ do financiamento eleitoral. Uma das poucas a apoiar sua iniciativa foi a senadora Marina Silva (AC), provável presidenciável pelo PV.

Eugênia Lopes