Título: Especialista critica ato que mantém censura
Autor: Macedo,Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/09/2009, Nacional, p. A15

Para professor Fredie Didier, decisão do TJ é ""escandalosa""

"A decisão é escandalosa", declarou ontem o professor Fredie Didier, de processo civil, sobre o julgamento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) que reconheceu a suspeição do desembargador Dácio Vieira, mas manteve de pé o decreto de censura por ele imposto ao Estado. "Um absurdo total porque se o tribunal reconhece o estado de suspeição do magistrado no período em que proferiu sua decisão como é que não determina a anulação de seus atos?"

O silêncio foi imposto ao Estado em 31 de julho, a pedido do empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Na última terça-feira, em reunião reservada, o Conselho Especial do TJ-DF afastou Vieira da ação, acolhendo exceção de suspeição proposta pelo jornal. O julgamento, porém, não interferiu na decisão anteriormente tomada pelo desembargador, "uma vez que são dois temas distintos".

"Como é que o tribunal reconhece suspeição e não anula o ato praticado por quem a própria corte considera suspeito?", insiste Didier, daUniversidade Federal da Bahia. "Imagine-se que se tivesse dado uma decisão final contra o Estadão, ela iria ser mantida?"

"O nosso Código de Processo Civil não fala nada sobre a consequência do julgamento da suspeição", observa Didier. "Mas temos como regra expressa dispositivos sobre isso nos regimentos internos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça e também no artigo 101 do Código de Processo Penal. As redações são semelhantes no sentido de que julgada procedente a suspeição ficarão nulos os atos praticados. Me parece muito claro: os atos decisórios praticados sob o estado de suspeição são nulos."

Para o professor Oscar Vilhena, da Direito GV, e diretor jurídico da Conectas Direitos Humanos, a decisão do TJ-DF foi "extremamente conservadora". "O tribunal poderia ter declarado a suspeição e também determinado a invalidação dos atos pretéritos. A meu ver seria a decisão mais adequada, mas como não há previsão obrigatória no Código de Processo Civil para que isso ocorra o tribunal simplesmente declarou a suspeição e transferiu a responsabilidade ao novo juiz do feito. E quanto aos atos pretéritos? Bom, esses serão reapreciados pelo novo desembargador relator."

Vilhena considera que "também deve ser invalidado o ato de alguém que não teria legitimidade para praticá-lo porque suspeito". Ele assinala que "a suspeição não gera presunção de invalidade, mas o tribunal poderia mesmo ter dado uma decisão melhor".

Cronologia do caso

31/7

O desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, informa o Estado da proibição de publicar informações sobre a Operação Boi Barrica (PF), envolvendo o empresário Fernando Sarney, filho de José Sarney

1/8

Jornal revela que Vieira, ex-consultor do Senado, é do convívio dos Sarney e do ex-diretor do Senado Agaciel Maia. A Associação Nacional de Jornais (ANJ), outras entidades, senadores e o ex-ministro do STF Carlos Velloso criticam decisão

12/8

Estado entra com mandado de segurança. O recurso tem o objetivo de garantir o reconhecimento de direito líquido e certo, incontestável, que está sendo violado ou ameaçado por ato ilegal ou inconstitucional de uma autoridade

13/8

O desembargador Waldir Leôncio Cordeiro, da 2.ª Câmara Cível do TJ, mantém censura ao jornal, ao não acolher pedido de liminar no mandado de segurança. Cordeiro deixa para deliberar após receber dados de Vieira e da Procuradoria

21/8

Estado ingressa com nova exceção de suspeição do desembargador Dácio Vieira. A base do recurso é extraída da própria decisão de Vieira, quando ele ignorou um primeiro pedido para que se declarasse suspeito no caso

15/9

TJ-DF declara Vieira suspeito para decidir sobre o pedido de censura. A decisão afasta o desembargador do caso. O agravo de instrumento de Fernando Sarney será redistribuído para outro desembargador do mesmo tribunal