Título: Projetos do pré-sal dão mais poder ao governo
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/09/2009, Economia, p. B3

Objetivo de ampliar o papel do Estado no setor petrolífero é claro

Os quatro projetos de lei apresentados ontem pelo governo federal para regulamentar a exploração da camada do pré-sal deixam clara a decisão de ampliar fortemente o papel do Estado na indústria do petróleo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez questão de ressaltar a diferença entre o modelo anunciado ontem e aquele criado por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, em 1997. Naquele ano, Fernando Henrique sancionou a Lei que acabou com o monopólio da Petrobrás na exploração do petróleo, abrindo caminho para a entrada das grandes multinacionais.

"Diziam que a Petrobrás era o último dinossauro a ser desmantelado no País", disse Lula. "Foram tempos de pensamentos subalternos." Com o sistema de partilha, cuja criação é o principal item do novo marco regulatório anunciado ontem, a União será dona de todo o petróleo existente no pré-sal. Ela poderá dividi-lo ou não com um sócio privado, dependendo das condições. Se a reserva for potencialmente boa, poderá contratar diretamente a Petrobrás, sem fazer licitação, para extrair o óleo.

ONIPRESENTE

A Petrobrás será onipresente nos campos do pré-sal e em outras áreas produtoras que o governo considerar estratégicas. Só a empresa estatal poderá operar os campos. Nas áreas em que a União abrir a oportunidade para a participação de empresas privadas, a estatal terá uma participação de, no mínimo, 30% no consórcio vencedor.

Outra presença obrigatória em todos os consórcios será a nova estatal, chamada Petro-Sal, cuja criação também foi proposta ontem pelo governo. Essa nova estatal vai administrar os contratos da União com os sócios privados e repassará ao governo informações que hoje estão centralizadas nas empresas, como, por exemplo, o custo de produção.

As empresas privadas, por sua vez, não terão vida fácil sob o novo marco regulatório. Nos campos considerados de relativamente maior risco, elas serão convidadas a entrar como sócias da União. Ganhará a disputa aquela que concordar em ficar com a menor parte do petróleo produzido. Além disso, a empresa vencedora terá de antecipar parte das receitas à União, na forma de um bônus de assinatura a ser pago ao final do leilão.

Todos os custos associados à investigação quanto à existência ou não de petróleo na área, além dos relacionados ao desenvolvimento da produção, ficarão por conta do sócio privado. Se o campo se revelar produtivo do ponto de vista comercial, as empresas privadas serão reembolsadas em óleo. Se o campo não for produtivo, elas ficarão no prejuízo.

GUINADA

Em comparação com as atuais regras de exploração de petróleo no País, as novas regras propostas ontem representam uma guinada. Hoje, o regime é de concessão. Nele, a União cede às empresas áreas a serem exploradas. O petróleo é das empresas, não da União.

O governo acredita que pode impor regras duras à exploração de petróleo porque hoje as empresas privadas têm acesso a apenas 10% das reservas mundiais de petróleo. Ou seja, elas estão ansiosas por novas oportunidades de negócio. Além disso, a equipe de Lula está convencida que a camada do pré-sal é uma área de baixo risco de exploração, por isso não faltarão interessados em participar dos projetos na área.

MÃO FORTE

A mão forte do Estado dirigindo a exploração do petróleo não é exclusividade do Brasil. A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, deixou isso claro ontem ao citar o caso da Noruega, um país desenvolvido e democrático. Lá, de acordo com ministra, o rei decide que as empresas A e B vão se associar para explorar uma determinada área.

O dinheiro arrecadado pela União terá como finalidades principais, pelos planos anunciados ontem, a melhora no sistema educacional brasileiro, a redução da pobreza, o desenvolvimento científico e tecnológico e uma política industrial própria para o setor de petróleo. Na última hora, além disso, foram incluídas entre as prioridades para a utilização dos recursos o meio ambiente e a cultura.

Os projetos serão financiados com os rendimentos que a União vier a obter com a aplicação dos recursos do pré-sal no Brasil ou no exterior. Na mesma linha de Estado forte, os bancos oficiais federais serão convidados a operar o dinheiro.