Título: Governo tenta conter discurso ambientalista
Autor: Moraes, Marcelo de
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/09/2009, economia, p. B5

Protesto do Greenpeace e ?efeito Marina? marcam cerimônia do pré-sal

A iminente candidatura presidencial da senadora Marina Silva (PV-AC) trouxe o debate do tema ambiental diretamente para o lançamento do marco regulatório da exploração de petróleo no pré-sal. Mesmo sem a presença da senadora, o tema virou personagem central na festa do governo, sendo abordado diretamente pelo presidente Lula e pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, em seus discursos de ontem.

Para ressaltar ainda mais essa discussão, ativistas do Greenpeace causaram grande mal-estar aos governistas, conseguindo driblar a segurança e invadir o palanque do evento. Conseguiram se colocar na frente de Lula com faixas de protesto contra a falta de preocupação com a poluição causada pelo petróleo. "Pré-sal e poluição: não dá pra falar de um sem falar do outro", diziam as faixas.

Lula e Dilma procuraram ignorar o protesto e incluir o tema ambiental em seus discursos, tentando transmitir a mensagem de preocupação com o assunto. Com isso, já procuram reduzir o impacto eleitoral que a candidatura de Marina, importante ativista ambiental e ex-ministra do Meio Ambiente, possa vir a ter.

"O fato é que o pré-sal nos abrirá as portas deste futuro se soubermos transformar essa imensa riqueza mineral, esta imensa riqueza natural em riqueza humana, social e ambiental", afirmou Dilma. A ministra lembrou ainda que os recursos que poderão ser gerados com a exploração da camada do pré-sal significarão "a preservação do meio ambiente".

Lula também entrou no assunto. "O pré-sal é um passaporte para o futuro. Sua principal destinação deve ser a educação das novas gerações, a cultura, o meio ambiente, o combate à pobreza e uma aposta no conhecimento científico e tecnológico, por meio da inovação. Vamos investir seus recursos naquilo que temos de mais precioso e promissor: nossos filhos, nossos netos, nosso futuro."

Para o Greenpeace, o protesto foi um alerta contra os problemas ambientais que podem ser provocados pela exploração do pré-sal. Em texto postado ontem à tarde no blog do Greenpeace, o protesto foi abordado diretamente e o governo foi tratado de forma crítica.

"O meio ambiente não foi convidado para a cerimônia do marco regulatório do pré-sal, mas o Greenpeace fez questão de ir à festa. Muito tem se discutido sobre o pré-sal, mas até agora o presidente Lula não disse nada sobre seus impactos ambientais. Queremos ver esse assunto na pauta do governo", diz o texto.

PALANQUE

Diante de uma platEia de políticos e técnicos das áreas de energia e infraestrutura, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, ensaiou o discurso de candidata à Presidência. Pegou um tema eminentemente técnico, como a exploração do pré-sal, e não perdeu a chance de anunciar os possíveis ganhos diretos para a população.

Acabou ganhando sorrisos de aprovação do presidente Lula, sentado ao lado do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e do presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), possíveis parceiros de Dilma na campanha presidencial.

Dilma foi diretamente a esse ponto, atendendo à orientação de Lula e de dirigentes petistas. Eles avaliam que o pré-sal pode ter grande potencial eleitoral na campanha, se for bem explicado à população. Mas também acham que pode se tornar um fator nulo se for abordado apenas de forma técnica.

"A exploração do pré-sal é um tema que interessa de perto a cada um de nós, homens e mulheres, deste fantástico País", disparou a ministra, de cara. "Os projetos que hoje apresentamos falam de um caminho mais rápido e seguro em direção ao futuro. Um futuro que já começou, acreditamos, com as conquistas obtidas no governo do presidente Lula. E que a partir de agora têm uma oportunidade única de serem ampliadas e aceleradas com o pré-sal." Em seguida, ela traduziu o projeto para a linguagem de palanque. "Isso significa mais tecnologia, desenvolvimento humano, empregos."

COLABOROU TÂNIA MONTEIRO

PARTILHA DE POSIÇÕES

Quem apoia e quem é crítico da nova política do petróleo

Quem ganha

Presidente Lula: Usou as reservas de petróleo no pré-sal para lançar uma política pública de cunho estatista, o que permite um discurso eleitoral nacionalista em 2010.

Dilma Rousseff: Pré-candidata de Lula à sucessão presidencial, a ministra-chefe da Casa Civil herda a política de Lula no palanque, em 2010.

Petrobrás: A empresa pública do petróleo sai fortalecida: será a operadora única do pré-sal e vai ganhar até R$ 100 bilhões em um processo de capitalização que pode deixá-la mais estatal e menos pública (com menos espaço para os investidores privados serem acionistas da empresa).

Estados petroleiros: Ao manter as atuais regras de cobrança e rateio de royalties, os Estados grandes produtores de petróleo, que já ganhavam muito, vão ganhar muito mais porque a produção somente na província do pré-sal pode corresponder a todo o petróleo produzido hoje fora do pré-sal

Estados não petroleiros: Também vão ganhar mais do que ganham hoje porque a produção do pré-sal, ao manter a política atual de distribuição de royalties, vai ampliar os recursos para dividir entre Estados produtores e não produtores.

PMDB: O partido vai usar a tramitação dos projetos das regras do pré-sal para barganhar ainda mais com a posição de aliado principal do projeto de Dilma 2010. Vai ser um dos braços de apoio do Planalto como relator dos projetos de lei do pré-sal. No Senado, depois da crise da gestão Sarney, o PMDB será vital para tentar aprovar os projetos.

C&T, Educação, Cultura e Meio Ambiente: O governo promete privilegiar essas áreas com investimentos bancados pelos recursos do pré-sal.

Quem perde

Oposição: Além de não concordar com o marco regulatório do pré-sal, ainda terá de enfrentar o discurso nacionalista do "pré-sal é nosso". Foi o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) que, em 1997, aprovou a atual Lei do Petróleo (9.478), que o governo Lula deixou de lado para aprovar um novo marco regulatório para o pré-sal.

Acionista da Petrobrás: Se a capitalização da Petrobrás também fizer crescer a participação da União como acionista, os investidores privados que são sócios da estatal perderão espaço e poder.

Empresas privadas: Desde que foi aprovada a Lei do Petróleo, a competição, mesmo a Petrobrás não tendo perdido o monopólio de refino, trouxe uma centena de petroleiras. Essas empresas criticam o governo por tornar a Petrobrás a única operadora do pré-sal.