Título: Voltamos à era do monopólio estatal
Autor: Monteiro,Tânia
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/09/2009, Economia, p. B6
Entrevista - John Forman: ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP); para consultor, modelo de exploração do pré-sal é inusitado e não deixa claro como será a repartição dos resultados
Ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP), criada em 1997, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, na esteira da flexibilização do monopólio estatal na exploração do petróleo, o engenheiro John Forman vê na proposta de novo modelo do pré-sal, apresentada ontem pelo governo federal, uma volta exatamente aos tempos do monopólio estatal. Como sinais desse movimento, ele cita o esvaziamento do órgão regulador e a concentração de decisões nas mãos do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e da Petrobrás. Questionando a falta de informação sobre detalhes importantes das propostas apresentadas pelo governo federal, o hoje consultor afirma que o modelo proposto é "inusitado", por misturar características diferentes e, até mesmo, contraditórias. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Como o senhor avalia a proposta apresentada pelo governo?
Está tudo mais ou menos dentro daquilo que foi colocado nas últimas semanas. Mas agora ouvi o (ministro de Minas e Energia, Edison) Lobão falando que, por enquanto, vai ter royalties e participação especial, até que uma nova lei venha modificar tudo. Esse negócio de contrato de partilha com royalties e participação especial é meio inusitado. Qual é o objetivo da partilha? Ela é adotada em países que não possuem um sistema fiscal implantado e onde, portanto, é difícil ter acesso à renda do petróleo por meio de cobrança de impostos. Então como é que fica? A empresa vai tirar o petróleo, ficar com uma parte que cobre os custos e depois dividir com o governo o lucro.
Parece que o governo deixou a decisão sobre os royalties para o Congresso...
O ministro Lobão disse que isso é enquanto não vier a nova lei (dos royalties). Ele está querendo modificar o modelo sem explicitar o que é mais importante, que é a repartição do resultado. Na verdade, ainda há muito a explicar sobre a proposta. O que é área estratégica? Isso vai ser determinado quando e por quem? Isso já está dito? Com base em quê? Essas decisões, na verdade, ficarão concentradas no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).
E o que acontece com a Agência Nacional do Petróleo (ANP)?
Você vai abrir mão da ANP, que passa a ser uma fiscalizadora do que já existe aí e, quando isso acabar, ela naturalmente vai se extinguir. Vai ter uma empresa que vai ser dona disso, mas não vai ser a operadora, e a Petrobrás vai operar tudo... Quer dizer, nós estamos voltando a um modelo basicamente monopolista. Porque, se não se sabe o que vai ser ofertado, quando vai ser ofertado e quem vai definir o que, como é que fica? Como as empresas vão conseguir se preparar?
Mas não há sistema semelhante em outros países?
O modelo norueguês foi muito mencionado durante todo esse processo (de definição das regras). Mas lá tem a (estatal) Petoro, que participa nos blocos, com a distinção de que ela investe e assume riscos. Se perdeu, perdeu. Se ganhar, ganhou. Aqui, pela proposta que vimos, a operadora vai correr todo o risco. Ela carrega a Petro-Sal e Petrobrás em toda a exploração. Se for bem-sucedida, ótimo. Se for mal sucedida, o custo é todo dela. Desse jeito não é o modelo norueguês.