Título: Retaliação aos EUA terá de machucar
Autor: Marin,Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/09/2009, Economia, p. B10

Amorim diz que retaliações devem forçar EUA a abandonarem subsídios

A retaliação do Brasil aos Estados Unidos, autorizada pela Organização Mundial do Comércio (OMC) em função dos subsídios americanos à produção e à exportação de algodão, não será definida de forma "emocional" nem significará "um tiro no pé", antecipou ontem o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Mas terá de "machucar" os EUA, de modo a induzir Washington a eliminar essas subvenções.

Conforme informou o chanceler, a "listinha" de bens, serviços e patentes americanas que estarão sujeitos a sanções será negociada pelo Itamaraty com o Ministério da Saúde e com a Câmara de Comércio Exterior (Camex) e estará pronta "em breve".

Anteontem, a OMC autorizou o governo brasileiro a aplicar um total que pode chegar a US$ 800 milhões em sanções contra os EUA em 2009. Desse valor, US$ 640 milhões deverão variar, nos próximos anos, conforme a liberação de subsídios internos e de garantias de crédito à exportação do produto pelos EUA. Se os desembolsos aumentarem, o montante da retaliação igualmente será elevado.

"Ninguém vai dar tiro no próprio pé, eu prometo", afirmou Amorim. "A retaliação deve ser vista dessa maneira: não é emotiva, tem uma dimensão política e seu objetivo é fazer com que o país que adota práticas e leis erradas as modifique, de modo a torná-las compatíveis com as regras da OMC." A retaliação, em princípio, somente será suspensa se Washington eliminar as duas subvenções. Segundo Amorim, a presença dessa "listinha" será estimulante para as possíveis negociações nesse sentido com os EUA.

Conforme destacou, o fato de a OMC ter autorizado o Brasil a aplicar parte da retaliação de forma cruzada - relativa ao comércio de um produto, o algodão, mas aplicada aos setores de serviços e propriedade intelectual - será útil para convencer Washington.

"Vamos escolher os setores que menos nos afetem e que mais afetem os EUA. Ninguém vai criar um problema em uma área que afete, por exemplo, a disponibilidade de um remédio", explicou, ao avançar sobre a possível retaliação sobre patentes farmacêuticas.

O chanceler lembrou que a retaliação cruzada entrou no rol de punições previstas pelo sistema de solução de controvérsias na etapa final das negociações da Rodada Uruguai (1986-1994), por exigência do Brasil. Os EUA insistiam na adoção apenas da outra via - em casos de propriedade intelectual e de serviços, que as sanções recaíssem ao comércio de bens. Os negociadores brasileiros resistiam a essa fórmula. Mas, em reunião restrita com os EUA, Índia e União Europeia, propuseram a criação da retaliação cruzada nas duas direções e obtiveram consenso.