Título: E as reformas?
Autor: Szajman ,Abram
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/09/2009, Economia, p. B2

Em seu discurso de posse, há seis anos e meio, disse o presidente Lula: "Vamos mudar com coragem e cuidado, tendo consciência de que a mudança é um processo gradativo e continuado. Mudança sem atropelos ou precipitações para que o resultado seja consistente e duradouro." Não acredito que, naquele dia, um só cidadão brasileiro tenha discordado das palavras do presidente. O País inteiro ansiava por mudanças. Hoje, porém, é significativa a frustração quando constatamos que, se as mudanças pretenderam ser gradativas, nunca chegaram a ser consumadas ou consistentes.

Isso ocorreu não por culpa exclusiva do Poder Executivo, mas pela estagnação existente no Legislativo. Naquele discurso, o presidente não especificou quais seriam todas as mudanças, mas todos sabemos que três reformas estão emperradas, embora sejam essenciais para o País: a eleitoral, a tributária e a previdenciária.

Em julho deste ano, a Câmara aprovou uma reforma eleitoral, com 11 pontos que tratam da próxima campanha eleitoral, todos voltados para o varejo, nenhum para o atacado. O primeiro ponto é redundante quando diz que está liberada a propaganda na internet. Na verdade, mesmo que essa propaganda viesse a ser proibida, jamais poderia ser fiscalizada. Uma das ferramentas básicas para a eleição de Barack Obama foi justamente o amplo uso da internet. Além disso, ficou demonstrado que nem um governo como o do Irã conseguiu controlar a internet durante as recentes convulsões políticas ocorridas naquele país.

Quando falo em atacado, refiro-me à absoluta necessidade de algum dia ser adotada a cláusula de barreira para a composição do Congresso. Julgo fundamental que um partido alcance, nacionalmente, um porcentual mínimo de votos para que possa exercer sua atividade parlamentar. Se não houver uma mudança nesse sentido, continuaremos assistindo ao pobre espetáculo proporcionado por mais de uma dezena de siglas inexpressivas que em nada contribuem para que o Parlamento seja um verdadeiro espelho da sociedade.

No tocante à reforma tributária, o governo já reconheceu que "a necessidade de uma revisão geral no complexo sistema tributário brasileiro é conhecida por todos os segmentos da sociedade". A partir da longa argumentação do Ministério da Fazenda, destaco algumas medidas que me parecem prioritárias: a desburocratização e simplificação do sistema; o aumento da formalidade; a eliminação da guerra fiscal entre os Estados; a redução dos custos tributários; a eliminação da cumulatividade de impostos nas cadeias de produção.

Como a Receita Federal vem apresentando sucessivos recordes de arrecadação, interrompidos apenas em razão da crise financeira internacional, esta é a hora ideal para que se concretize uma ampla reforma tributária em benefício da população brasileira como um todo e dos cofres da União, dos Estados e dos municípios. Destaco, ainda, a urgente necessidade da desoneração das folhas de salários que, se não for implementada, vai concorrer para uma informalidade cada vez mais perniciosa.

Quanto à reforma previdenciária, essa só poderá ser de fato efetiva se houver um aumento gradual e permanente dos salários da massa trabalhadora. Tanto o governo atual como o anterior fizeram reformas na Previdência, mas ficaram restritas ao âmbito do INSS, sem abordar a questão de forma abrangente. De todas as reformas, a previdenciária é a mais difícil e complexa de ser executada, porque exige da sociedade uma série de renúncias e sacrifícios, tais como o aumento da idade para a aposentadoria e a eliminação da discrepância entre os altos benefícios pagos aos funcionários públicos e os baixos rendimentos que se destinam aos funcionários da iniciativa privada.

Essas reformas dificilmente serão aprovadas num futuro próximo, porque haverá eleições em 2010 e, neste momento, os parlamentares não arriscarão nenhum tipo de voto que eventualmente seja mal acatado em suas bases eleitorais. Entretanto, também ocorrerão eleições em 2012, e assim sempre será, de dois em dois anos. Ou seja: se as reformas imprescindíveis para o País não forem desvinculadas dos anos eleitorais, jamais nos livraremos do gerúndio, com as reformas sendo propostas, sendo analisadas, sendo elogiadas ou criticadas, e nunca concretizadas.

*Abram Szajman é presidente da Federação e do Centro do Comércio do Estado de São Paulo e dos Conselhos Regionais do Sesc, do Senac e do Sebrae de São Paulo