Título: Uma proposta mais ousada
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2008, Economia, p. B2

O relator da subcomissão de reforma tributária do Senado, Francisco Dornelles (PP-RJ), vai apresentar, até o final deste mês, uma proposta de reforma mais ousada do que aquela formulada pelo governo. Na proposta de Dornelles, à qual este colunista teve acesso, o Brasil terá apenas um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) que substituirá cinco tributos atualmente existentes. Apenas o Imposto sobre Serviços (ISS), cobrado pelos municípios, será preservado.

O único IVA nacional, a ser proposto por Dornelles, substituirá o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), que incide sobre combustíveis.

A proposta do governo, encaminhada ao Congresso no final de fevereiro, prevê a criação de um IVA federal (que substituiria a Cofins, o PIS, a Cide e o salário educação), de um IVA estadual (que seria o novo ICMS) e a manutenção do IPI. Se ela for aprovada, o Brasil ficaria, portanto, com três IVAs, ou seja, três impostos a serem cobrados no sistema de débito e crédito. O ISS também seria preservado.

O principal objetivo da proposta de Dornelles é promover uma simplificação do sistema, que reduza aquilo que os especialistas chamam de 'carga oculta' dos tributos, ou seja, o custo que o contribuinte tem para cumprir com suas obrigações fiscais. Há estudos, disponíveis na subcomissão do Senado, que indicam que uma empresa leva, no Brasil, cerca de 2.600 horas por ano para pagar todos os seus tributos. Nos EUA, elas gastam 257 horas.

Com o único IVA nacional, argumenta Dornelles em sua proposta, haveria mais transparência tributária, pois o consumidor saberia quanto está pagando de imposto ao receber a nota fiscal pela compra de cada mercadoria ou serviço. O modelo proposto pelo senador é muito parecido com o atualmente utilizado na União Européia.

Depois de apresentada, a proposta de Dornelles será discutida no âmbito da sub-comissão do Senado, com a realização de audiências públicas, quando serão ouvidos especialistas no assunto. Assim, na prática, o Senado trabalhará numa direção e a Câmara dos Deputados, onde está tramitando a proposta do governo, em outra.

A subcomissão de Reforma tributária do Senado foi criada por iniciativa do presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), senador Aloizio Mercadante (PT-SP). Ela é presidida pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) e conta com sete senadores titulares. Os partidos mais expressivos têm participação na sub-comissão.

Outra diferença é que a proposta de Dornelles não prevê prazo de transição para a entrada em vigor das novas regras. Pelo projeto do governo, as mudanças no ICMS serão feitas de forma gradual, ao longo de oito anos, e só entrarão plenamente em vigor em 2016. Esse prazo é considerado exagerado por vários Estados, entre eles São Paulo, mas foi adotado para atender aqueles que concederam incentivos fiscais, no âmbito da chamada guerra fiscal.

O IVA nacional proposto por Dornelles será criado e regulamentado por legislação federal, mas sua fiscalização ficará por conta dos Estados. As alíquotas serão seletivas, segundo categorias a serem fixadas em lei complementar. Caberá ao Senado definir o enquadramento das mercadorias e serviços em cada faixa de alíquota.

O IVA nacional terá sua receita partilhada entre a União (cota-parte federal) e os Estados (cota-parte estadual). A divisão da receita será feita diretamente pela rede bancária, sem transitar pelos cofres do Tesouro do Estado em que for recolhida.

Para que os Estados não tenham perdas de receita na distribuição da cota-parte estadual, a proposta de Dornelles prevê a criação de um fundo de compensação com receita federal. A proposta do governo, ao contrário, prevê que receitas que hoje já são dos Estados - como o fundo IPI exportação e a compensação pela chamada lei Kandir - serão utilizadas para cobrir eventuais perdas com as mudanças no ICMS. A participação da União não está definida.

Pela proposta de Dornelles, a cobrança do novo IVA nacional seria feita no Estado de origem da mercadoria ou do serviço, que ficaria responsável pela fiscalização. Para compensar o Estado, caberia a ele toda a receita proveniente das multas. A proposta prevê ainda a manutenção da diferenciação de alíquota do IVA na Zona Franca de Manaus, na mesma proporção do atual IPI.

A proposta de Dornelles proíbe que as alíquotas dos impostos sejam majoradas depois de 30 de junho de cada ano. Com isso, o senador pretende acabar com a atual prática de envio da proposta orçamentária ao Congresso em agosto, com receitas condicionadas a mudanças legislativas, que podem ser aprovadas até 31 de dezembro de cada ano.

A carga tributária das prestadoras de serviços não será elevada, pois a proposta permite que essas empresas sejam tributadas pelo regime de lucro presumido, como ocorre hoje com a tributação da Cofins e do PIS. A proposta de Dornelles está mais perto das teses defendidas pelos empresários e é parecida com aquela defendida pelo governo, antes do recuo por pressão dos governadores.