Título: Planalto cobra Orçamento e ameaça enxurrada de MPs
Autor: Abreu, Beatriz e Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/03/2008, Nacional, p. A6

Garibaldi prometeu votar proposta orçamentária na quinta-feira; União tem só até o início de julho para fazer repasses, por causa das eleições

O Palácio do Planalto está ameaçando o Congresso com uma 'enxurrada de medidas provisórias' se o Orçamento não for votado nesta semana. A ameaça foi feita pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e tornada pública pelo presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN). O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, tratou da ameaça com o próprio Garibaldi e o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP).

Garibaldi prometeu a votação do Orçamento para quinta-feira, prazo considerado 'no limite' pelo governo, que corre o risco de não conseguir repassar a Estados e municípios os recursos dos investimentos dentro dos prazos da legislação eleitoral. O presidente do Senado foi explícito ao dizer que o governo poderia entupir o Legislativo com 'nem uma nem duas, mas uma enxurrada de medidas provisórias'.

Por causa das eleições de outubro, os repasses só poderão ser feitos até o início de julho, 90 dias antes das eleições. Sem o Orçamento, o Planalto teme o atraso, principalmente, no desembolso dos financiamentos para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), hipótese que Dilma não quer considerar. As obras do PAC ajudarão no palanque das eleições municipais, a partir do segundo semestre.

Em reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros ministros, na qual se avaliou a lentidão do Congresso na votação do Orçamento, a ministra da Casa Civil cobrou de Paulo Bernardo pressão para viabilizar sua aprovação. 'Se houver atraso no PAC, a responsabilidade será sua', disse, dirigindo-se ao colega do Planejamento.

No início da semana, Bernardo fez um apelo a Garibaldi e Chinaglia e alertou para a possibilidade de o governo editar uma série de medidas provisórias para desobstruir a liberação de recursos. A proposta foi votada na Comissão Mista de Orçamento quinta-feira e chega ao plenário nesta semana.

A tensão entre Executivo e Legislativo, no entanto, ainda se mantém em nível elevado. A ameaça de uma 'enxurrada de MPs' acirra os ânimos dos parlamentares, que se sentem desconfortáveis com o avanço cada vez maior do Executivo sobre as atividades legislativas.

Mas diante da proposta de entupir o Congresso de MPs, Lula discordou de Dilma. 'Não concordo com o que vocês estão propondo', disse o presidente, manifestando preocupação, contudo, com o fato de que uma eventual restrição na edição de medidas provisórias crie dificuldades à governabilidade.

As MPs têm monopolizado as votações no Legislativo e passaram a ser o principal motivo de apreensão e queixas de Garibaldi e Chinaglia. Eles discutem restrições para sua edição e tramitação. 'Editar novas medidas provisórias é o caminho mais curto para o governo ter novas derrotas', afirmou o deputado Flávio Dino (PC do B-MA), resumindo o ambiente de desagrado na Casa. Aliado de Lula, ele prevê que, qualquer que seja a solução institucional para limitar a edição de MPs, ela só terá efeito em 2009.

A tramitação de propostas de emenda constitucional - como é o caso do projeto que muda a edição de MPs - pode levar vários meses até ser concluída, já que precisa ter os votos de três quintos de cada Casa, em dois turnos. 'Agora, a solução é política', pregou Dino. Na Câmara, os deputados não avançam em projetos de lei. A proposta de uma nova política para o salário mínimo, por exemplo, nem sequer foi apreciada e outra MP foi necessária para validar a entrada em vigor sábado do aumento para R$ 415.

IMPASSE

Desde o ano passado, a Câmara só vota MPs. Em 2007, mais de uma centena de sessões tiveram a pauta obstruída por elas. 'O volume de medidas provisórias é grande. Precisamos juntos sair desse impasse que hoje não interessa a ninguém', afirmou o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, em visita à Câmara.

As suspeitas levantadas na votação da Comissão de Orçamento quinta-feira reforçaram o entendimento de que a relação do governo com sua base tem se pautado por trocas e boa parte dos parlamentares atua como 'despachante', preocupado em levar dinheiro para as bases ou trocar votos por cargos.

A Comissão de Orçamento aprovou um anexo ao projeto, com mais de meio bilhão de reais, que o PSDB contesta, acusando um grupo de parlamentares de manipular o colegiado para beneficiar emendas de seu interesse. É na comissão que se dão as negociações para a destinação das verbas da União. E ocupar cargos e levar dinheiro do Orçamento para obras nas bases eleitorais são os principais mecanismos de grande parte dos parlamentares para mostrar prestígio com o eleitor.