Título: Tributaristas divergem sobre efeitos
Autor: Pereira , Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/03/2008, Nacional, p. A8
Item mais polêmico é recolhimento do novo ICMS no Estado de destino
Depois de meses de espera, a proposta de reforma tributária, enfim, foi apresentada semana passada pelo governo, sob o olhar reticente de especialistas e empresários. Ninguém nega que a iniciativa foi um grande avanço para o País, mas os resultados que as mudanças vão promover no sistema tributário e na economia nacional fazem parte de uma imensa nuvem de dúvidas de toda sociedade. Isso sem considerar o risco de a proposta de emenda constitucional ser rejeitada pelo Congresso.
'Não é a reforma dos nossos sonhos, mas é boa, melhora o sistema nacional. A dúvida é saber se ela será aprovada. Particularmente, acho que não passa', destaca o tributarista Clóvis Panzarini, ex-coordenador da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.
Na avaliação dele, o ponto mais delicado, e que já começou a causar polêmica, refere-se ao recolhimento do novo ICMS no Estado de destino, no caso de operações interestaduais. Isso acarreta fortes perdas aos Estados mais produtivos - como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná -, que exportam para Estados menos produtivos.
A proposta do governo é criar um Fundo de Equalização de Receitas (FER) para compensar eventuais perdas. 'Mas esse fundo não tem musculatura suficiente para suprir os prejuízos causados aos maiores Estados', avalia Panzarini. Ele acha que a destinação de 1,8% dos recursos dos Fundos de Participação dos Estados e Municípios para a formação do FER é muito pouco.
Outra preocupação, também associada aos Estados, é o fato de o governo transferir a regulamentação para o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). 'Se hoje, que o Confaz trabalha com incentivos fiscais, ele não consegue evitar a guerra fiscal, pode-se imaginar o que ocorrerá com todos sendo regulados pelo órgão', critica o tributarista Ives Gandra. Ele explica que por enquanto é difícil avaliar se a reforma alcançará os objetivos propostos, porque ainda não se conhecem as alíquotas dos novos impostos e outros detalhamentos.
'Não consigo ver como vão promover tantas mudanças sem aumentar a carga tributária. Meus receios não foram afastados pelo discurso de Bernard Appy (secretário do Ministério da Fazenda)', destaca Gandra. Com a experiência de anos no setor, ele acha difícil dizer até mesmo se a reforma simplificará ou não o sistema tributário. 'Toda mudança passa por um período em que complica mais do que simplifica.'
GRANDES FORTUNAS
O consultor em finanças pública Amir Khair não tem dúvida de que a criação do IVA e a unificação das legislações estaduais vão simplificar o sistema e pôr fim à guerra fiscal entre os Estados. 'O Brasil é o único país do mundo que tem ICMS com alíquota estadual', diz. Para Khair, ex-secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo, um dos pontos fortes da reforma é a criação do imposto sobre grandes fortunas: 'Esse tributo vai permitir melhor distribuição de renda à população e também permitir que o governo consiga reduzir a carga tributária sobre a produção.'
O professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Fernando Zilveti tem opinião contrária: 'Nunca houve neste país agregação de impostos sem aumento de carga tributária. A simplificação nem sempre beneficia o contribuinte.' A proposta de reforma tributária decepcionou, diz, pois se trata de uma reforma mitigada: 'Na minha avaliação, só o novo ICMS surtirá efeito positivo. O resto não vai ajudar o contribuinte.'
Outro tributarista que comentou a proposta foi o sócio do escritório Braga&Marafon, Waine Domingos Peron. Para ele, umas das principais medidas da proposta é a implementação de incentivos fiscais em âmbito nacional. Peron explica que, embora seja proibido, hoje muitos Estados conseguem atrair investimentos com isenções de impostos. 'Se a proposta passar, os incentivos fiscais serão para o País todo. O que é uma ótima notícia.'
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