Título: Não vou esperar para ver o que vai acontecer
Autor: Domingos, João
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/03/2008, Vida&, p. A22

Nestor parou de serrar madeira

Único ainda vivo dos quatro filhos de um casal de migrantes alemães que, como tantos outros, foi para o Rio Grande do Sul, Nestor Schmidt, de 67 anos, tomou uma atitude radical para um madeireiro de Tailândia. Decidiu não serrar mais um centímetro de madeira em protesto contra a falta de documentação e certificados das toras que chegavam às suas duas serrarias.

Hoje, usa seu maquinário para prestar serviços a terceiros. Antes de assinar contrato, exige que mostrem documentação da madeira.

O patrimônio da madeireira e das serrarias de Nestor, que tem dois filhos como sócios, é de cerca de R$ 4 milhões. São três caminhões próprios para puxar madeira, três tratores, um trator florestal (para entrar na mata e tirar a tora), três carregadeiras (como pás mecânicas, só que com uma espécie de alicate no lugar da lâmina), uma patrola e duas serrarias. ¿Não tivemos outra alternativa a não ser parar. Fechei por falta de madeira legal. Preferi não esperar para ver o que vai acontecer¿, disse.

Com o dinheiro que ganharam na madeireira, Nestor e os filhos compraram três fazendas. Juntas, somam cerca de 6 mil hectares. ¿Nós temos madeira lá, temos estoque. Poderíamos estar serrando nossa madeira, mas resolvemos dar um tempo, diversificar a atividade. Vamos mexer com gado também, plantar mandioca, ver como fazer para engarrafar suco, tudo dentro da legalidade.¿ Ele disse que muitos dos problemas vividos hoje pelos madeireiros foram causados pelo próprio setor. ¿Não se prepararam para a escassez da madeira.¿

Nestor afirmou que a decisão de paralisar as atividades das serrarias se deu por dois fatores: falta de certificação da madeira e para mostrar que o governo não ajuda, atrasa alvarás das madeiras legais, além de fazer vista grossa para os que roubam madeira nas terras dos que preservam a floresta. ¿Por aí existem os sem-terra. Em Tailândia, temos os sem-tora, que entram nas terras dos outros, levam a madeira e a vendem¿, disse.

Para manter suas três fazendas preservadas, Nestor e os filhos gastam dinheiro com o pagamento de vigias, na tentativa de impedir que roubem a madeira. Há também outro problema. Como a área é destinada à preservação, os sem-terra costumam invadi-la, alegando que são improdutivas e que deveriam ser desapropriadas. Por enquanto, Nestor conseguiu que a Justiça lhe garantisse a reintegração de posse.

Em 1988, Nestor montou sua madeireira. ¿Já não havia espaço para todo mundo. Vim para cá porque tinha madeireiras e essa é uma atividade de que gosto, a única que aprendi. Pensava sempre: `Se conseguir comprar uma serraria, posso chamar meus filhos para cá¿.¿ Nascido em Santa Cruz do Sul (RS), era pequeno quando o pai morreu em acidente rodoviário. A mãe vendeu tudo e levou os quatro filhos para Concórdia (SC). Lá, comprou um sítio. Quando adulto, começou a trabalhar numa serraria. ¿Comecei nos serviços gerais. Depois, aprendi a limpar tora e dirigir caminhão.¿

Atualmente, mesmo com a serraria fechada, ele não fica parado. ¿O que a gente ganha com prestação de serviço não dá para fazer capital, mas dá para viver. Enquanto isso, a gente vai planejando o que fazer.¿

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