Título: Mortos no Tibete podem ser 100
Autor: Trevisan, Cláudia
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/03/2008, Internacional, p. A19

É o que afirma o governo tibetano no exílio; Pequim, que só confirma dez mortes, dá ultimato a manifestantes

Cláudia Trevisan

O número de mortos no confronto de sexta-feira entre manifestantes e policiais na capital do Tibete, Lhasa, pode ser 100, segundo o governo tibetano no exílio chefiado pelo dalai-lama. O governo da China reconheceu ontem 10 mortes, enquanto a Campanha Internacional pelo Tibete afirmou que o número de vítimas é de no mínimo 25.

Em meio à violência, o governo chinês deu um ultimato aos manifestantes para que se rendam até amanhã. 'Os criminosos que não se entregarem até o fim do prazo serão severamente castigados', de acordo com comunicado oficial.

A apuração do número exato de mortes é dificultada pelo forte controle sobre a informação e o acesso à região exercido por Pequim. As autoridades suspenderam as viagens de estrangeiros ao Tibete, especialmente de jornalistas, e há uma forte campanha na mídia oficial chinesa para retratar os manifestantes como vândalos que atacaram pessoas inocentes, atearam fogo em lojas e agrediram policiais. O governo tibetano no exílio pediu a intervenção da ONU para interromper o que classificou como 'violação dos direitos humanos' no Tibete.

Enquanto os ativistas tibetanos sustentam que as mortes foram provocadas pela repressão policial, o governo de Pequim afirma que elas ocorreram em razão dos incêndios iniciados pelos manifestantes. 'As vítimas eram todas civis inocentes, que queimaram até morrer', sustentou a agência oficial de notícias Nova China. A TV estatal CCTV apresentou ontem, pela primeira vez, imagens dos confrontos.

A violência explodiu em Lhasa no início da tarde de sexta-feira, no quinto dia de protestos que marcaram o aniversário do fracassado levante contra o domínio chinês no Tibete, ocorrido em 1959. Na época, a rebelião foi reprimida pelo Exército de Libertação Popular. O dalai-lama, líder espiritual dos tibetanos, exilou-se na Índia, onde criou um governo paralelo na cidade de Dharamsala. As manifestações da semana passada foram as mais violentas desde 1989, quando a lei marcial vigorou no Tibete durante 13 meses.

Ontem, a cidade de Lhasa parecia estar sob estado de emergência, com pessoas proibidas de sair de casa e o Exército nas ruas, disse por telefone de Londres ao Estado Kate Saunders, da Campanha Internacional pelo Tibete, a partir de relatos de tibetanos no exílio.

Fora do Tibete, centenas de monges do mosteiro Labrang, na província chinesa de Gansu, protestaram ontem pelo segundo dia consecutivo e foram dispersados pela polícia com o uso de gás lacrimogêneo.

A imprensa chinesa apontou o dalai-lama como responsável pelos confrontos de sexta-feira. 'Violência apoiada por dalai amedronta Lhasa' era o título repetido nos jornais oficiais. 'Um funcionário do governo tibetano disse à Nova China que há evidência suficiente para provar que a sabotagem em Lhasa foi 'organizada, premeditada e concebida' pelo grupo do dalai. A violência, envolvendo espancamentos, quebra-quebra, pilhagem e incêndios, perturbou a ordem pública e colocou em risco a vida e a propriedade das pessoas', dizia trecho do despacho distribuído pela agência oficial de notícias da China.

O chefe do governo tibetano, Qiangba Puncog, também atribui os confrontos ao dalai-lama. 'A conspiração dos separatistas será derrotada. Nós vamos enfrentá-los de maneira firme, de acordo com a lei', disse o tibetano em Pequim, durante a reunião do Congresso Nacional do Povo, o Parlamento chinês.

O governo chinês sustenta que o Tibete é parte de seu território há séculos e não admite atividades separatistas. Os tibetanos integram o grupo de 55 'minorias étnicas' que habitam a China e têm cultura, língua e religião próprias. Elas representam 8,4% da população. Os restantes 91,6% são formados pelos chineses han. Os ativistas que defendem maior autonomia ou a independência do Tibete querem aproveitar a visibilidade internacional que a China terá com a Olimpíada de agosto para propagar sua causa. Além de Lhasa, a semana passada foi marcada por manifestações na Índia e no Nepal, onde dezenas de tibetanos foram presos.

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