Título: Para o que der e vier
Autor: Kramer, Dora
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/03/2008, Nacional, p. A6

Se existe um partido que não se aflige com a eleição de 2010, é o PMDB. Não precisa de discurso, desistiu de recuperar a irrecuperável identidade perdida lá atrás, na luta pela redemocratização, e dispensa até mesmo um bom candidato porque, caso raro na política, consegue sobreviver entre as grandes legendas sem disputar eleições presidenciais.

Com bancadas fortes no Congresso, presença organizada em todo o País e um time de profissionais bem treinados no exercício do poder, o PMDB será sempre um aliado desejado por quem quer que tome assento no Planalto.

Hoje o PMDB é mais que um partido. É uma equipe prestadora de serviços que podem ser executados no Congresso, nos ministérios e nas eleições mediante o trabalho de diretórios bem estruturados na quase totalidade dos municípios e a concessão de um bom espaço no horário gratuito de rádio e televisão garantido pela representação numerosa no Parlamento.

Mas o PMDB não seria esse objeto de cobiça se não fizesse, primordial e competentemente, política. Por meio dela conseguiu construir uma inédita unidade no início do segundo mandato do presidente Luiz Inácio da Silva, tornando-se ainda mais valioso e imprescindível aos governos, todos eles reféns de um sistema eleitoral que não produz maiorias parlamentares correspondentes aos votos obtidos pelos chefes do Poder Executivo.

Nessa arte de ¿fazer política¿ se inclui posicionar-se bem em períodos pré-eleitorais, a fim de valorizar o cacife da legenda, mas sem as atribulações do atual parceiro, o PT, e do antigo companheiro, o PSDB.

Seja eleito o ¿poste¿ de Lula no PT, um candidato de outro partido por ele apoiado, ou um dos dois tucanos presentes ao páreo, os pemedebistas têm lugar garantido na ¿base aliada¿.

Só que conseguirá isso em melhores condições quanto mais eficiência demonstrar na fase preliminar, que no caso da sucessão de Lula já começou, em virtude da antecipação do processo patrocinada pelo próprio presidente, receoso de perder espaço para a oposição.

E se Lula lança seus experimentos, o PMDB também se acha no direito de fazer os seus.

No mais vistoso deles, faz dupla com o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, num movimento bom para ambos. Ao mineiro, garante inserção fortalecida na cena da escolha do candidato do PSDB; ao PMDB permite mostrar ao PT que o partido tem suas alternativas e não precisa ficar a reboque dos planos de Lula.

A menos que lá na frente o presidente esteja tão forte a ponto de eleger qualquer um.

Enquanto isso não se resolve, tenta produzir um pré-candidato que dê face à tese da candidatura própria que o partido sempre lança na rua e derruba depois na convenção.

Desta vez, porém, há uma diferença, dizem os pemedebistas do primeiro time: como ainda não existem opções seguras de aliança, porque o PT não tem candidato natural e o PSDB ainda não superou a fase da briga interna, de repente o cenário se complica e o partido consegue mesmo ter um candidato viável.

Preferencialmente, seria o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. É do partido, começou o mandato defendendo temas de repercussão nacional, é jovem e poderia atuar no vácuo da fadiga de material da disputa entre petistas e tucanos.

Cabral, no entanto, não parece disposto a aceitar o desafio. Quando se aborda o assunto internamente com ele, o governador desconversa.

Como tudo o que o PMDB precisa agora é de visibilidade e Aécio Neves também, os dois se juntaram num projeto sem roteiro preestabelecido, cujo objetivo, por ora, não vai além da produção de hipóteses com o intuito de mostrar que estão no jogo para o que der e vier.

Da onça

Apesar de encarar com realismo as conversas com Aécio Neves, a cúpula do PMDB tem dito que o tucano anda balançado e já não está tão receoso e refratário à idéia de sair do PSDB.

De acordo com essa versão, o governador de Minas começou a dar ouvidos ao argumento de que não tem nada a perder concorrendo à Presidência pelo PMDB, porque, na pior das hipóteses, fica conhecido nacionalmente para disputar a próxima.

Pois é, mas fica também sem mandato durante quatro anos, tendo Lula como possível adversário pela frente.

Via livre

Constatação de um interlocutor freqüente do presidente Lula: se puder eleger o sucessor, melhor; se não puder, fará tudo para não ser sucedido por alguém que lhe seja francamente antagônico.

A fila

Está confirmado: logo após a eleição municipal, PT, PMDB e parte expressiva do PSDB começarão a se mexer para aprovar emenda constitucional acabando com a reeleição e instituindo mandato de cinco anos.

O objetivo é reduzir em três anos o rodízio sucessório e ¿organizar melhor a fila¿ de candidatos presidenciais.