Título: EUA rejeitam boicote olímpico
Autor: Trevisan, Cláudia
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/03/2008, Internacional, p. A14

Em meio à violência no Tibete, comitê americano diz que ação não teria nenhum impacto

Os EUA afirmaram ontem que não boicotarão os Jogos Olímpicos de Pequim, apesar dos violentos confrontos entre policiais chineses e manifestantes no Tibete. ¿Se você fizer um ranking das piores idéias, o boicote olímpico estaria em 1º lugar¿, afirmou o porta-voz do Comitê Olímpico dos EUA, Darryl Seibel, para quem o boicote puniria apenas os atletas, sem obter resultados concretos.

Após ter feito pesados investimentos de infra-estrutura para ser sede da Olimpíada, um boicote seria um duro golpe para a China. Até agora, porém, tanto os EUA quanto os países europeus descartaram a possibilidade de não participarem dos jogos.

Ontem, Pequim afirmou que nenhuma arma de fogo foi utilizada na repressão ao protesto realizado sexta-feira em Lhasa, capital do Tibete, que deixou 16 mortos, segundo as autoridades de Pequim, e pelo menos 80, de acordo com ativistas tibetanos exilados na Índia. O premiê Wen Jiabao afirmou que as autoridades agiram com comedimento para pôr fim aos protestos e responsabilizou o dalai-lama pela violência.

Apesar de negar o uso da força e sustentar que a situação em Lhasa está sob controle, a China recusa-se a permitir a entrada de jornalistas e observadores estrangeiros na região, sob o argumento de que não pode garantir sua segurança.

À zero hora de terça-feira (13 horas de ontem em Brasília), venceu o ultimato que as autoridades deram para os rebeldes se entregarem ou enfrentarem ¿severa punição¿. Em entrevista coletiva convocada às pressas para 21 horas locais de segunda-feira, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Liu Jianchao, não informou o que poderia ocorrer após a meia-noite. Disse apenas que os acusados serão tratados ¿de acordo com a lei¿. O porta-voz também não informou o número de pessoas presas ou que se haviam entregado até ontem.

Liu afirmou ¿não ter conhecimento¿ de que vários sites noticiosos ficaram fora do ar nos últimos dias por ação dos censores chineses, por trazerem informações sobre os confrontos em Lhasa, entre os quais o YouTube. Logo no início da entrevista, Liu afirmou que várias embaixadas e consulados da China ao redor do mundo tinham sido alvo de ataques ¿em larga escala¿ de grupos tibetanos. No momento em que a entrevista foi concedida, havia poucos registros nas agências internacionais de protestos contra representações chinesas no exterior.

A estratégia da China é apresentar os rebeldes tibetanos como um grupo de vândalos, que atacou inocentes em Lhasa. O porta-voz sustentou que o governo chinês possui evidências de que o dalai-lama, líder espiritual dos tibetanos, esteve envolvido na organização das manifestações dos últimos dias.

PROTESTO EM PEQUIM

Horas antes da entrevista, 40 estudantes da Universidade Central para Nacionalidades, em Pequim, realizaram protesto pacífico de apoio aos manifestantes tibetanos, no primeiro eco do movimento na capital chinesa.

As demonstrações no Tibete foram as mais violentas desde 1989, quando protestos contra a China levaram à imposição da lei marcial por 13 meses na região, na época governada pelo atual presidente, Hu Jintao. Também em 1989, Pequim enfrentou a mais séria ameaça à sua autoridade quando milhares de estudantes acamparam por dois meses na Praça da Paz Celestial para pedir reformas democratizantes. Tanto os atos de Lhasa quando os de Pequim foram reprimidos pelo Exército de Libertação Popular.

As recentes demonstrações no Tibete começaram há pouco mais de uma semana, para marcar o 49º aniversário do fracassado levante de 1959 contra o domínio chinês, que forçou o exílio do dalai-lama na Índia.

O Centro Tibetano para Direito Humanos e Democracia, de Dharamsala, sede do governo tibetano no exílio, afirmou que também houve manifestações de 700 estudantes em Sichuan, em protestos contra a prisão de 40 estudantes tibetanos que haviam pedido a volta do dalai-lama à China.