Título: Resistência brasileira está surpreendendo
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/03/2008, Economia, p. B10

Para o ex-presidente do Banco Central, o maior risco para o Brasil hoje é a inflação e não a crise americana

O maior risco hoje para o crescimento brasileiro é a inflação interna e não a crise econômica americana. A análise foi feita pelo ex-presidente do Banco Central (BC) Carlos Langoni, presidente do Centro de Economia Mundial, da Fundação Getulio Vargas (FGV). Segundo ele, o banco central americano (Fed) está indo até onde pode para evitar uma crise de insolvência. O economista avalia que nenhum país está completamente imune aos problemas internacionais, mas reconhece que a capacidade de resistência brasileira está surpreendendo.

Os EUA correm risco de crise sistêmica no setor financeiro?

Nem o Bernanke (Ben, presidente do Fed) nem ninguém tem a capacidade de responder isso. Não se pode culpar (o Fed)por falta de ousadia. Ele está indo até o limite.

O que o Fed quis salvando o Bear Stearns por meio do JP Morgan?

Deixar claro para o público que fundos pequenos podem até quebrar, mas com grandes instituições não vamos permitir que isso aconteça.

O Brasil está imune às turbulências internacionais?

Imune, ninguém está. Agora, surpreende a capacidade de resistência da economia brasileira. A crise veio quando o Brasil já tinha completado o ajuste externo e avançado em ajustes internos, num cenário externo que se deteriorou, mas preserva o preço de commodities, quando pela primeira vez o Brasil estava com sua arquitetura macroeconômica consistente.

Por quanto tempo o País conseguirá continuar assim?

Até agora o impacto é muito pequeno. Muito mais no mercado acionário. A perspectiva de risco está relativamente estável. A economia continuará crescendo, impulsionada pela demanda interna, talvez 4,5%.

A robustez das contas externas é um trunfo para o Brasil. O avanço das importações pode anular isso?

Vamos entrar numa fase de déficit em conta corrente, que deve se consolidar entre US$ 7 bilhões e US$ 10 bilhões, e essa virada vai levar o mercado a rever expectativas em relação ao câmbio, que caminhará para R$ 1,80 ou pouco mais.

Qual o maior risco ao crescimento do País? A crise externa ou repique inflacionário?

A perspectiva de inflação. A economia está muito aquecida e alguns setores chegaram ao limite do uso da capacidade.

O BC estará certo em voltar a elevar a Selic, caso a demanda interna permaneça aquecida?

Não, não é a solução ideal. Com o Fed cortando os juros, o real se valorizaria ainda mais. A solução é manter a taxa Selic e elevar a meta de superávit primário de 3,8% para 4,5%, ou seja, cortar gasto público.