Título: A agenda da indústria
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2008, Notas e Informaçoes, p. A3

Quem quiser um bom roteiro para a modernização da economia brasileira pode encontrá-lo na agenda legislativa encaminhada ao Congresso Nacional pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). A agenda, de fato, não é apenas econômica. Inclui propostas de grande alcance institucional, como a adoção de uma disciplina mais estrita para a edição de medidas provisórias (MPs). Detalhe especialmente importante: nenhuma das propostas é nova. Todas constam de projetos em tramitação no Congresso, alguns há mais de 10 anos. A lista inclui também projetos de elaboração recentíssima, como o da reforma tributária, enviado neste mês ao Legislativo e relacionado entre os temas prioritários do setor industrial.

O ritual de entrega da agenda tem sido realizado em todo início de ano desde 1996. O documento, desta vez com tiragem de 25 mil exemplares, traz uma lista de 110 propostas legislativas sobre meio ambiente, relações trabalhistas, tributação, infra-estrutura, finanças, câmbio, relações internacionais e tecnologia, entre outros temas.

Cada projeto é resumido e analisado criticamente, com indicação dos pontos considerados positivos ou negativos pela CNI. A reforma tributária, por exemplo, é considerada urgente e positiva em seus aspectos mais amplos, mas seu prazo de implementação - até oito anos, depois de aprovada a emenda constitucional - é muito longo, segundo os analistas da indústria. É preciso, de acordo com sua recomendação, reduzir o prazo para desoneração das atividades produtivas. Os autores da agenda propõem, além dessa, outras modificações no projeto, como a inclusão de garantias contra a elevação da carga de tributos e uma delimitação mais precisa das atribuições do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).

O documento chama a atenção para projetos interessantes e quase esquecidos, como aquele relativo a direitos e garantias do contribuinte apresentado em 1999 pelo senador Jorge Bornhausen. É um projeto amplo e ambicioso, equivalente, no plano tributário, à lei de defesa do consumidor. O texto, segundo o documento da CNI, está na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado ¿para reexame da matéria¿.

Na abertura de cada seção, a Agenda Legislativa da Indústria apresenta a posição do setor a respeito de um conjunto temático, antes de apresentar os projetos em tramitação no Congresso. Essa introdução ajuda o leitor a entender a avaliação de cada proposta legislativa. Em relação ao comércio exterior, por exemplo, são listados como objetivos gerais: ¿redução da burocracia e da carga tributária, política cambial coerente com a estratégia exportadora, melhoria das condições de acesso a mercados externos, promoção comercial dos produtos brasileiros em mercados relevantes e equilíbrio nos tratamentos fitossanitários, aduaneiros, etc.¿

Nessa parte, a agenda inclui um projeto de 2006, de autoria dos senadores Renan Calheiros e Fernando Bezerra, sobre extinção da cobertura cambial nas exportações. Não por acaso, um dos autores, o senador Bezerra, é um ex-presidente da CNI. Enquanto a proposta permanece empacada na Comissão de Constituição e Justiça, o Executivo - detalhe não mencionado no documento - continua ¿liberalizando¿ lentamente a política, numa tentativa de reduzir o influxo de dólares na economia brasileira.

Desde o dia 17 os exportadores estão dispensados de trazer para o Brasil a moeda estrangeira obtida com suas vendas. Até essa data, só podiam deixar no exterior 30% de sua receita. Essa e outras duas medidas de revisão da política de câmbio foram tomadas por meio de decretos presidenciais e de resoluções do Banco Central.

Aquele projeto de 2006 é muito mais amplo e mais complexo do que essas medidas do Executivo. Sua vagarosa tramitação dá uma idéia do abismo entre o sentido de urgência dos agentes econômicos - e dos cidadãos em geral - e a escala de prioridades da maioria dos parlamentares. Mas indica, também, o pouco esforço do Executivo para apressar, por meio da atuação de seus líderes, a tramitação de projetos importantes para a política econômica.

A Agenda Legislativa da Indústria é uma leitura útil, enfim, para todo cidadão interessado nos grandes debates econômicos e no funcionamento das instituições.

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