Título: Relatório reforça sinais de nova alta dos juros
Autor: Gobetti, Sérgio
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/03/2008, Economia, p. B1

BC eleva estimativa de inflação este ano em razão do descompasso entre expansão da demanda e da oferta

O Banco Central (BC) elevou as expectativas de inflação de 4,3% para 4,6% em 2008 e intensificou a ameaça de elevar a taxa de juros para conter o aquecimento da economia e as pressões inflacionárias. Pela primeira vez desde 2005, a estimativa para o IPCA supera o centro da meta, que é de 4,5%, levando a cúpula do BC a sugerir que está próxima de seguir o caminho de outros bancos centrais no mundo que subiram os juros.

O diretor de Política Econômica da instituição, Mario Mesquita, alertou que bancos centrais devem atuar de forma preventiva para que a inflação seja mantida dentro da meta. 'O BC que espera a inflação divergir muito em relação à meta para agir tem que atuar de forma mais intensa e por mais tempo, o que tende a ser danoso para a atividade econômica', disse ele, ao comentar o Relatório de Inflação do primeiro trimestre, divulgado ontem.

Segundo Mesquita, não existe um 'número mágico' que faça o BC agir, mas um conjunto de indicadores econômicos que são analisados em conjunto. Além das projeções de inflação do mercado (4,7%) e no cenário de referência utilizado pelo BC (4,6%) estarem acima da meta, Mesquita destacou a aceleração do núcleo da inflação e a tendência de maior difusão na alta dos preços - fatores que, segundo ele, preocupariam 'qualquer banqueiro central'.

O Relatório de Inflação também eleva a estimativa de crescimento econômico de 2008 de 4,5% para 4,8% e volta a lembrar 'o persistente descompasso entre o ritmo de expansão da demanda doméstica e da oferta' como o principal fator de risco para o panorama inflacionário. Embora reconheça o cenário favorável à expansão dos investimentos e o crescimento verificado na formação bruta de capital fixo, o documento argumenta que o ritmo de maturação desses investimentos (além do crescimento das importações) ainda não foi capaz de contrabalançar o aumento do consumo, o que se manifesta nos elevados níveis de utilização da capacidade instalada da indústria, a começar pelo próprio setor de bens de capital, onde chega a 88,8%.

Em pelo menos dois trechos da apresentação do relatório, Mesquita tentou responder veladamente às posições do Ministério da Fazenda sobre a política monetária. Primeiro quando apresentou um quadro mostrando que vários países já aumentaram suas taxas básicas de juros nos últimos 12 meses e que o caso americano - de redução da taxa para evitar a recessão - seria uma exceção.

'O número de países que têm elevado a taxa de juros é bastante relevante, mesmo depois das turbulências', disse Mesquita, sugerindo que a prioridade da maioria dos BCs continua sendo o controle da inflação.

Num segundo momento, ao comentar a origem das pressões inflacionárias, o diretor atribuiu um peso secundário à expansão do crédito, que está no centro dos últimos movimentos do ministro da Fazenda, Guido Mantega. 'O crédito é bastante importante para alguns segmentos, como o de bens duráveis, mas existem outros fatores tão ou mais importantes, como a renda e a massa salarial', disse Mesquita, comparando os pesos do setor de bens duráveis (9,8%) e não-duráveis (26,5%) na composição do IPCA.

Em outras palavras, o diretor do BC quis dizer que não adianta limitar o crédito para aquisição de automóveis e outros bens duráveis, como sugeriu a Fazenda, se o restante do consumo - e da renda - também não for contido. Na página 116 do relatório, o BC alfineta a equipe de Mantega ao dizer que o ritmo de expansão da demanda doméstica, sustentado 'pelos impulsos fiscais e pelo estímulo remanescente derivado do relaxamento da política monetária implementado até setembro de 2007', continua colocando 'riscos não desprezíveis' para a dinâmica inflacionária. 'Impulsos fiscais' é o eufemismo normalmente usado pelo BC para se referir ao efeitos dos gastos públicos elevados sobre a demanda da economia.

O documento também avalia que o cenário de evolução da economia mundial segue indefinido, 'mas com viés negativo', predominando em alguns países um quadro de estagflação - desaceleração econômica com pressões inflacionárias. Uma desaceleração mundial mais intensa, segundo o BC, teria efeitos ambíguos sobre o Brasil. Por um lado, contribuiria para conter a inflação, por reduzir nossas exportações e fazer cair o preço das commodities, mas por outros canais - como a maior aversão ao risco - poderia atuar desfavoravelmente sobre as expectativas do mercado. COLABORARAM FERNANDO NAKAGAWA E FÁBIO GRANER

NÚMEROS 4,6% é a nova estimativa do BC para a inflação (IPCA) neste ano

4,3% era a projeção anterior

4,7% é a estimativa de inflação do mercado financeiro

4,8% é a nova previsão do BC para o crescimento econômico este ano

4,5% era a estimativa anterior

Links Patrocinados