Título: Negociação fracassa e Vale desiste de comprar a Xstrata
Autor: Tereza, Irany ; Lacerda, Ana Paula
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2008, Négocios, p. B18

Vale diz que lei britânica garante o direito de fazer nova tentativa de compra nos próximos seis meses

Três meses depois de confirmar seu interesse na compra da mineradora anglo-suíça Xstrata, a Vale comunicou oficialmente na noite de ontem o encerramento das negociações. As cifras que envolveram o negócio não foram reveladas mas, desde janeiro, as especulações variaram de US$ 75 bilhões e US$ 90 bilhões. Horas antes do anúncio oficial do insucesso do acordo, o presidente da Vale, Roger Agnelli, que recebeu em São Paulo um prêmio como ¿Personalidade de Vendas de 2007¿, já antecipava o resultado malogrado: ¿Os presidentes da Xstrata e da Glencore (controladora da anglo-suíça) são brilhantes e não gostam de ceder. Eu não sou tão brilhante, mas também não gosto de ceder¿, falou, com ironia.

Mais tarde, durante um evento do jornal Valor Econômico, Agnelli disse que o grande entrave às negociações foi realmente a exigência da Glencore de manter direitos sobre a comercialização de minérios, cláusula com a qual a Vale não concordava. ¿Preço não foi problema, nem crédito. Mas não chegamos a um acordo e não seria benéfico para as partes manter uma negociação tão longa¿, disse. Ele afirmou ainda que a Vale já tem novas operações sendo avaliadas. ¿Os mercados de cobre e carvão são nossos maiores interesses.¿

Na nota distribuída ao mercado, a mineradora brasileira deixou em aberto a possibilidade de tentar uma nova oferta nos próximos seis meses, se outra concorrente entrar no páreo pela Xstrata. É o que determina a legislação britânica, de acordo com o City Code on Takeovers and Mergers. ¿A Vale entende que essa oferta criaria considerável valor para os acionistas de ambas as empresas. No entanto, não foi alcançado acordo entre as partes, o que acarretou no encerramento das negociações¿, diz o texto.

Há duas semanas, os presidentes da Xstrata, Mick Davis, e da Glencore, Ivan Glasenberg, vieram ao Brasil para se encontrar com Agnelli. Foi uma das últimas tentativas de acordo num negócio em que o preço também foi motivo de discórdia. A primeira proposta da Vale foi de £ 40 por ação, o que correspondia a um volume total de cerca de US$ 76 bilhões em janeiro; a Glencore pedia £ 50 por ação, elevando o valor para mais perto de US$ 100 bilhões, já que o assédio levou a uma enorme valorização das ações da Xstrata. Um meio termo entre as cifras parecia possível.

Segundo fontes ligadas ao negócio, a última oferta da Vale ficou na casa de £ 45 por ação (pouco menos de US$ 90 bilhões no total). Mas a mineradora brasileira, a segunda no ranking mundial do setor, não abriu mão de seu direito de comercialização dos preços de minério. Liderar a dança dos preços internacionais é um dos grandes trunfos da companhia brasileira e a Glencore, que se dedica ao negócio de comercialização, mantinha a determinação de participar também dessas negociações.

A Vale temia, entre outras coisas, uma enxurrada de reclamações de seus acionistas minoritários diante da vantagem financeira que os acionistas da Glencore passariam a ter. Durante a negociação com os executivos da Xstrata/Glencore, foi tentada até mesmo a criação de uma terceira empresa, com participação minoritária da Vale (em torno de 30%) para comercialização, mas a Glencore queria também vantagem financeira no contrato de exclusividade. A Vale não aceitou.

Foi na reunião que ficou claro que as chances de o negócio sair eram mínimas. Além da distância entre as propostas, Agnelli teve dificuldades em avançar nas conversas com o presidente da Glencore, um negociador duro, habituado a brigar por cada centavo dos contratos.

As negociações chegaram a envolver também o governo federal. O presidente Lula foi convidado para um jantar com Agnelli em janeiro, para afastar a resistência do governo (também acionista da Vale, por meio do Tesouro e do BNDESPar). Na casa do executivo, Lula ouviu o compromisso de manter os investimentos da Vale, de US$ 59 bilhões até 2012, prioritariamente no País.

A tentativa de compra da Xstrata, que produz alumínio, carvão, cobre e níquel, vinha de encontro à determinação da Vale de diversificar seu portfólio, reduzindo a concentração no minério de ferro. A Vale, porém, tem outras alternativas de aquisição em vista. Segundo pessoas ligadas à empresa, a Vale estudou detalhadamente as dez maiores mineradoras do mundo, pensando na possibilidade de um dia fechar negócio. A própria Xstrata pode voltar a ser uma opção no futuro.

Ontem, analistas disseram que o comunicado ao mercado, avisando que a empresa tem um prazo legal de seis meses para fazer nova proposta, é um indicativo do que ainda pode ocorrer. ¿A Vale não renunciou por completo, mas deu uma indicação de que chegou ao seu limite¿, disse o analista da Prosper Corretora, Alan Cardoso. COLABOROU NATALIA GÓMEZ

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