Título: Dúvida é se Mugabe aceitará veredicto
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/04/2008, Internacional, p. A13
Chris McGreal*
Mugabe aceitará o resultado? Os zimbabuanos não só falaram contra o governo na eleição presidencial de sábado - eles gritaram, e de maneira tão ensurdecedora que Robert Mugabe e a elite do partido oficial Zanu-PF, que acreditavam em seu direito inquestionável de governar, foram relegados ao silêncio.
A retórica revolucionária desafiadora da interminável guerra de libertação e as acusações de que candidatos de oposição não passariam de títeres do imperialismo britânico evaporaram-se quando o pleno alcance do veredicto popular veio à tona. Rejeitados juntamente com Mugabe estavam pelo menos nove ministros de gabinete e aliados do comando político do Zanu-PF. O partido está diante da perspectiva de perder o poder.
Milhões de zimbabuanos votaram com a esperança nascida do desespero. Mugabe não ofereceu nenhum futuro além da retórica interminável de conflito e a ilusão de que os zimbabuanos estariam mais livres e 'poderosos' por sua política de distribuição de terra enquanto eles mergulhavam mais fundo na pobreza.
Os zimbabuanos podem ver por si mesmos que não há alimentos nas prateleiras, nem empregos, enquanto a elite governante enriquece com transações cambiais no mercado negro e fazendas confiscadas de brancos.
Seu desafio agora é fazer Mugabe - e seus chefes de segurança no Exército e na polícia que disseram que jamais reconhecerão uma vitória do oposicionista Movimento para a Mudança Democrática (MMD) - aceitar o resultado. O MMD está tentando dificultar uma reversão dos resultados pelo governo. Ao compilar e divulgar os resultados oficiais das seções eleitorais antes da Comissão Eleitoral, a oposição procura evitar tentativas de mudar os números na contagem final.
O grande erro de julgamento de Mugabe foi não se afastar do poder em outubro, quando seus camaradas do Zanu-PF insistiram para ele se retirar a fim de preservar a imagem de herói da libertação e salvar o partido, permitindo que um candidato mais jovem se apresentasse. Isso teria impedido a entrada do ex-ministro das Finanças Simba Makoni na disputa. Makoni teve pouca votação, mas sua participação na eleição dividiu o Zanu-PF, minando a campanha de Mugabe e revigorando a oposição.
Sem nenhuma participação no governo, os líderes do Zanu-PF não terão proteção contra investigações de casos de corrupção, da violência patrocinada pelo governo contra adversários políticos, do saque de fazendas pertencentes a brancos e de uma série de outros abusos de poder.
O MMD deu sinais conflitantes sobre o destino de Mugabe, dizendo que ele poderá se retirar calmamente, mas será responsabilizado por alguns crimes. Mesmo que Mugabe saia ileso, é improvável que a proteção se estenda aos que o cercam.
Isso será um incentivo para o atual governo tentar manter o MMD fora do poder - ou para fazer um acordo. O Exército poderá jogar um papel nisso. Ele poderá se apresentar alegando que deseja restaurar a estabilidade e forçar um governo de coalizão. O veredicto popular poderá levar o Zanu-PF a concluir que, para o partido ter um futuro, este será sem Mugabe.
*Chris McGreal é correspondente do 'Guardian' na África
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