Título: PF investiga só quem vazou gasto de FHC; oposição cobra autor do dossiê
Autor: Recondo, Felipe ; Rosa, Vera
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2008, Nacional, p. A4

Casa Civil, suspeita de ter montado papelada, não será alvo da apuração; adversários falam em `farsa¿

Felipe Recondo, Vera Rosa, Cida Fontes, Denise Madueño e Jair Rattner

Duas semanas depois da divulgação de um dossiê sobre os gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e da ex-primeira-dama Ruth Cardoso, o governo convocou ontem a Polícia Federal e determinou a abertura de um inquérito para investigar o vazamento das informações. E apenas o vazamento. A autoria e a responsabilidade pelo dossiê ficarão de fora do inquérito, isto é, a PF não investigará a Casa Civil, principal suspeita de ter montado a papelada. A oposição reagiu, classificando de ¿farsa¿ a investigação, aberta a pedido da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

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¿O governo está preocupado em saber quem viu o assassinato e não quem assassinou¿, ironizou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). Segundo ele, a opinião pública precisa saber quem fez o dossiê. ¿O que é fato é fato. Queremos investigar os cartões presidenciais e, inclusive, quem vazou, mas sobretudo quem fez o dossiê. Investigar apenas o vazamento não satisfaz a nenhum analista de bom senso.¿

Para o governo, contudo, coletar dados não é crime. A única irregularidade seria a divulgação de informações protegidas por sigilo. ¿O resto é debate político entre governo e oposição¿, afirmou o ministro da Justiça, Tarso Genro.

TEMPERO

¿O foco da investigação é o vazamento de dados, o que constitui um crime flagrante. A manipulação de dados no âmbito das repartições, enquanto não vazar, não é crime¿, confirmou, em Lisboa, o diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa.

¿Não vamos trazer para dentro do inquérito o tempero político. Agora temos um fato que agride o estatuto do Estado, que é o vazamento, e é isso que vamos investigar¿, explicou Corrêa. ¿O problema é que vocês da imprensa têm um enfoque diferente do nosso. Nós pretendemos saber quais as pessoas envolvidas no vazamento. Não vamos entrar na politização do inquérito. Ninguém vai botar palavras na boca da Polícia Federal.¿

Indagado se a pessoa que reuniu as informações para montar o dossiê seria chamada a depor, uma vez que isso estabeleceria o caminho percorrido até o vazamento dos dados de FHC, ele se esquivou. ¿Isso vai depender da avaliação de quem estiver conduzindo o inquérito¿, disse.

DISCURSO AFINADO

Apesar da distância entre ambos, as declarações do diretor da PF em Lisboa estavam sintonizadas com a fala de Tarso em Brasília. ¿A Polícia Federal vai investigar delitos; não vai investigar situações políticas. Situações políticas quem investiga é a CPI, é o debate político de oposição e governo. A Polícia Federal não é polícia política¿, disse o ministro. O problema é que pelo menos algumas das informações do dossiê, como admitiu na sexta-feira a ministra Dilma Rousseff, também aparecem no banco de dados da Casa Civil.

A entrada da PF no caso era avaliada internamente pelo governo como algo inevitável. O governo resistia a envolver a Polícia Federal nesse assunto, calejado pelo caso da quebra de sigilo do caseiro Francenildo Santos Costa, que acabou na queda do então ministro da Fazenda Antonio Palocci. Na sexta-feira, por exemplo, Dilma cogitou a possibilidade de ter ocorrido a violação dos computadores do Planalto. Para investigar essa suspeita, que classificou como um problema interno, afirmou que acionaria apenas o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), órgão ligado à própria Casa Civil. Até ali a convocação da PF estava descartada.

No fim de semana, contudo, a ministra conversou com Tarso sobre o que seria a melhor saída para o caso. Os dois concluíram que uma sindicância interna do governo seria insuficiente. A solução seria acionar a Polícia Federal e restringir as investigações ao vazamento do dossiê. O inquérito foi entregue ao delegado Sérgio Menezes, segundo na hierarquia da Superintendência da PF em Brasília, que terá 30 dias para concluir a apuração, prazo que pode ser prorrogado.

INSUSTENTÁVEL

O presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), avaliou que a situação da ministra está ¿insustentável¿. Segundo ele, assim como Palocci teve de deixar o cargo depois de acusado de uso do cargo para quebrar ilegalmente o sigilo do caseiro, a ministra vai acabar tendo de sair da chefia da Casa Civil. Ele acusou Dilma de estar usando a PF para tentar esconder o fato principal. ¿Vai-se atrás de tentar desvirtuar o fato relevante, que é o crime que ela (Dilma) cometeu¿, afirmou.

A mesma avaliação foi feita pelo líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA). ¿É um absurdo e uma falta de bom senso pensar que o vazamento é mais importante do que a elaboração do dossiê¿, afirmou ACM Neto. Para ele, o episódio deixa claro o uso da máquina pública para atender a fins políticos do PT. ¿Isso mostra que o governo não tem escrúpulos nem limite na utilização do poder do Estado. É mais uma tentativa de intimidar a oposição.¿

A defesa da investigação da PF foi feita pelo líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PE). Ele repetiu a versão de Dilma de que o crime reside no vazamento da informação e não na elaboração do dossiê. ¿Fazer um banco de dados é obrigação de qualquer ocupante da Casa Civil e não há irregularidade nisso. A irregularidade é o vazamento¿, insistiu Rands.

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