Título: A anti-reforma da Previdência
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/04/2008, Notas e Informações, p. A3

O Senado aprovou, na noite de quarta-feira, dois projetos que anulam regras aprovadas nos últimos anos para conter o crescimento do déficit do sistema previdenciário, que neste ano deverá alcançar R$ 44 bilhões. Um dos projetos estabelece que o valor dos benefícios previdenciários dos aposentados terá correção igual à do salário mínimo; outro extingue o fator previdenciário adotado em 1999 para retardar os pedidos de aposentadoria. Esses projetos aumentam despesas, sem prever a fonte de receita para cobrir os gastos adicionais - e isso já bastaria para que fossem considerados inconstitucionais. As mudanças terão de passar pela Câmara dos Deputados antes de serem submetidas à sanção do Executivo.

O autor das mudanças, que, se transformadas em lei, aumentarão o rombo da Previdência, é o senador Paulo Paim (PT-RS), que freqüentemente tenta aumentar o salário mínimo sem levar em conta as possibilidades fiscais do País. Desta vez, ele contou com o apoio demagógico das bancadas oposicionistas do PSDB e do DEM - que há alguns anos travaram difícil batalha para aprovar as medidas de austeridade que agora querem eliminar - e com a conivência de parte da base governista.

A primeira proposta aprovada foi uma emenda a projeto do Executivo sobre o salário mínimo. Trata-se do texto que estabelece regras para a correção do mínimo até 2011 e que foi apresentado no início do ano passado, como parte do pacote legislativo do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). De acordo com o projeto, a partir de 2008 os reajustes do salário mínimo corresponderão à variação acumulada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), acrescida do porcentual de crescimento do PIB ocorrido dois anos antes. O projeto estabelece ainda que a data para a entrada em vigor do novo salário mínimo será antecipada gradativamente, para que a data-base do reajuste passe a ser, em 2011, o dia 1º de janeiro.

A emenda do senador Paulo Paim, apresentada durante o exame do projeto pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado e aprovada pelo plenário, assegura a todos os benefícios da Previdência Social, inclusive aos dos aposentados, ¿o mesmo reajuste e a mesma política de valorização¿ do salário mínimo. Como essa decisão altera o texto aprovado pela Câmara, o projeto voltará a ser examinado pelos deputados.

Na mesma sessão, o Senado aprovou um antigo projeto de Paim, de 2003, que extingue o fator previdenciário, em vigor desde 1999. Também esse projeto terá de ser examinado pela Câmara. O fator previdenciário, utilizado na determinação do valor do benefício, leva em conta a alíquota de contribuição, a idade do trabalhador, o tempo de contribuição e a expectativa de vida do brasileiro, calculada anualmente pelo IBGE. O fator foi instituído com o objetivo de acabar com as aposentadorias precoces que oneravam a Previdência. E a medida funcionou. Em sete anos, a idade média em que os trabalhadores pedem aposentadoria passou de 48 anos para 53 anos.

O ex-ministro da Previdência José Cechin teme que o fim do fator previdenciário estimule os pedidos de aposentadoria precoce. Cechin estima que, sem o fator, o número de pedidos pode aumentar 50%, onerando ainda mais as contas da Previdência. Já o economista Marcelo Caetano, do Ipea, receia o surgimento de um esqueleto financeiro, se os que se aposentaram durante a vigência do fator previdenciário pedirem a revisão do valor de seus benefícios.

Quanto ao impacto da correção dos benefícios previdenciários de acordo com o salário mínimo, Cechin calcula em R$ 5,7 bilhões os gastos extras no primeiro ano de vigência desse critério. Nos cálculos de Caetano, o impacto seria ainda maior: em 2009, os gastos adicionais seriam de R$ 10,6 bilhões e, em 2010, de R$ 16 bilhões, crescendo de maneira exponencial daí em diante.

Em 1998, os gastos do INSS correspondiam a 5,2% do PIB. Mesmo com as medidas de contenção aprovadas desde então, o custo hoje é de 7,2% do PIB. De uma só tacada, o Senado acabou com duas medidas que vinham contribuindo decisivamente para conter o crescimento do déficit previdenciário. Só se pode esperar que a Câmara interrompa a tramitação dessa anti-reforma, rejeitando as mudanças propostas pelo senador Paim e endossadas demagogicamente - para causar constrangimentos ao governo - pelo PSDB e pelo DEM.

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