Título: Um absurdo na Legislação Trabalhista
Autor: Costa, Sérgio Amad
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/04/2008, Economia, p. B2

Há 30 anos venho estudando as relações trabalhistas de nosso país e, a cada ano que passa, só vejo tais relações degringolarem. Agora assisto a mais uma aberração nesse campo do mundo do trabalho. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, recentemente, uma lei que acrescenta novo artigo à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), determinando que o período de experiência exigido para contratos de trabalho não poderá ultrapassar o período de seis meses. A CLT passa agora a vigorar acrescida do seguinte artigo 442-A: ¿Para fins de contratação, o empregador não exigirá do candidato a emprego comprovação de experiência prévia por tempo superior a 6 (seis) meses no mesmo tipo de atividade.¿

Trata-se de uma lei execrável para as relações trabalhistas, embora, numa primeira leitura, seja possível perceber que a intenção do governo, com tal dispositivo legal, é favorecer os jovens a ingressarem no mercado de trabalho. Hoje, é fato que, em muitos casos, o jovem, ao procurar emprego, é barrado pela exigência da experiência anterior. Mas não será com essa nova lei que tal contexto será revertido. Essa dificuldade para os jovens poderia ser minimizada mediante, por exemplo, estímulos fiscais para as empresas quando admitem profissionais com parca experiência prática de trabalho.

Esse dispositivo legal, agora inserido na CLT, só vem atrapalhar ainda mais o já complexo e engessado processo de contratação de empregados, que as empresas têm de enfrentar ao buscar um profissional no mercado de trabalho para ocupar uma vaga nela existente.

Quando o empregador procura realizar uma contratação, ele visa a preencher um cargo que já existe e está vago ou que está agora sendo criado. Geralmente, esses cargos estão vinculados a um plano de carreira básico da empresa, que existe formal ou informalmente. Tais planos definem tecnicamente para cada cargo ou conjunto de cargos uma série de competências, habilidades e tempo de experiência que o profissional deve ter para realizar as atividades que o cargo exige. Essa nova lei vem conflitar com essas estruturas de carreira, hoje arquitetadas em boa parte das empresas no País.

A nocividade desse dispositivo legal também pode ser vista numa situação prática e imediata. Por exemplo, a empresa está procurando um profissional para ocupar um cargo de nível sênior. Esse empregador não poderá fazer um anúncio adequado para buscar o colaborador desejado. Ou seja, para um cargo sênior é mais do que natural que se procure um candidato com pelo menos cinco anos de experiência nas atividades que se pretenda que sejam por ele realizadas. Agora a empresa está impedida de manifestar tal exigência de tempo de experiência no anúncio. A meu ver, o empregador está sendo impelido a ter uma atitude hipócrita.

Há observadores menos atentos que imaginam que a nova lei coíbe exigências discriminatórias. Grave equívoco. É mais do que plausível não ser permitido exigências, para contratar um profissional, quanto à crença, à raça e ao sexo. Isso, sim, são quesitos discriminatórios, que, aliás, nunca se vêem manifestados nos planos de cargos e carreiras nas empresas. Mas solicitar experiência profissional não é discriminação, e sim diferença de qualificação, inerente à vida profissional.

Na prática o que vai ocorrer é que as empresas, impossibilitadas de solicitar em seus processos de recrutamento experiência maior de seis meses, receberão uma infinidade de currículos e terão um trabalho muito maior no já árduo processo seletivo. Um fardo trabalhista que não agrega nada para o empregador nem para o candidato, pois esse só se ilude ao achar que a empresa estará descartando a exigência da experiência, principalmente quando se tratar de vagas em que a vivência prática urge ser imprescindível.

Caberá ao empregador decidir se vai contratar profissionais com pouco tempo de experiência para cargos que exigem, por exemplo, colaboradores experientes. Embora a empresa ainda tenha a prerrogativa da livre escolha, poderão ocorrer, em alguns casos, creio, reclamações trabalhistas alegando que o empregador agiu ilegalmente, num processo seletivo, por ter preterido um candidato por outro com mais tempo de experiência. Oxalá esteja eu, em minha crença, equivocado.

*Sérgio Amad Costa é professor de Recursos Humanos e Relações Trabalhistas da FGV-SP

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