Título: Selo do Inmetro, zoneamento, lobby. É o contra-ataque do Brasil
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/04/2008, Economia, p. B4

Para o governo, maioria das objeções se aplica ao etanol de milho americano, mas atingem por tabela o produto nacional, feito de cana

Ao fim de duas semanas ouvindo críticas generalizadas de europeus, de líderes do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e de movimentos sociais à produção de etanol, o governo Lula admite que foi surpreendido pela escalada do ataque, mas avalia que o Brasil está apanhando por tabela no ricochete de uma condenação aos Estados Unidos.

Mapeando os cinco grupos de críticas básicas aos biocombustíveis, o governo concluiu que a maioria das objeções se aplica ao etanol de milho, genuíno produto americano.

O Planalto começou na semana passada a organizar os argumentos do seu contra-ataque. ¿Não estávamos preparados¿, admitiu o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge.

Uma das medidas do contra-ataque é acelerar o certificado do Inmetro ( Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) que vai assegurar ao importador que o etanol não foi produzido usando trabalho escravo ou à custa de prejuízos ao meio ambiente. Assim, são esvaziados dois dos principais problemas identificados pelos críticos dos biocombustíveis.

Em junho ou julho, deverá ficar pronto o zoneamento da produção de cana-de-açúcar, segundo informou ao Estado o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. O trabalho vai dizer onde é possível plantá-la, onde o governo quer que seja cultivada e onde será barrada a entrada dos canaviais.

A Bacia Amazônica e o Pantanal serão preservados do avanço da cana-de-açúcar, numa sinalização importante aos ambientalistas. A prioridade será o cultivo em áreas de pastagens.

Outra iniciativa é contratar uma empresa internacional de relações públicas, já que se trava uma batalha no campo das opiniões. Trabalhos de especialistas brasileiros serão divulgados em publicações e encontros internacionais, onde hoje a maioria esmagadora é contra os biocombustíveis.

O governo aposta suas fichas também na realização de uma conferência internacional sobre o tema, em novembro, em São Paulo. Ao anunciá-la, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que será uma oportunidade para discutir os prós e contras dos biocombustíveis ¿de forma racional¿.

O entendimento é que o etanol e o biodiesel têm sofrido ataques irracionais, principalmente da Europa. Desde que a União Européia decidiu adicionar 10% de biocombustíveis até 2015, começou a pressão dos agricultores do bloco para garantir esse mercado para si. E alguns governantes viram nessa decisão uma forma de tornar mais eficiente o custoso programa europeu de subsídios ao setor agrícola.

O ponto alto dos ataques ocorreu no início deste mês, quando o relator especial das Nações Unidas para o Direito à Alimentação, o suíço Jean Ziegler, classificou os biocombustíveis de ¿crime contra a humanidade¿, pois utilizam terras que deveriam produzir comida. No Brasil, a produção de alimentos cresceu 6,8% na última safra, apesar do avanço do etanol.

Irritado, o presidente Lula chamou os críticos de ¿palpiteiros¿. ¿É muito fácil ficar sentado num banco na Suíça e dar palpite aqui ou na África¿. Não satisfeito, acrescentou: ¿O verdadeiro `crime contra a humanidade¿ será descartar a priori os biocombustíveis e relegar os países estrangulados pela falta de alimentos e de energia à dependência e à insegurança¿.

CRÍTICAS

O governo identificou, até agora, cinco grupos de críticas aos biocombustíveis: 1) que não reduzem a emissão de gases que provocam o efeito estufa; 2) que causam desmatamento; 3) que a produção envolve um consumo elevado de petróleo; 4) que é utilizado trabalho escravo e 5) que os biocombustíveis ¿roubam¿ a terra que produziria alimentos.

O governo não concorda com nenhuma dessas críticas, embora admita casos isolados de trabalho degradante na lavoura, contra a lei.

Na maior parte, as críticas se aplicam ao etanol de milho, produzido nos Estados Unidos. Mas, admitem fontes do governo, o etanol brasileiro produzido a partir da cana-de-açúcar ¿apanha junto¿.

No mês que vem, Lula vai defender os biocombustíveis na Europa. Participará da reunião da Organização para Agricultura e Alimentação (FAO), órgão das Nações Unidas para o combate à fome, em Roma. ¿Vou com a disposição de fazer o debate com a seriedade que precisa ter.¿

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