Título: CPI analisa faturas de flores, cabeleireiros e restaurantes
Autor: Costa, Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2008, Nacional, p. A4

Segundo parlamentares, documentos mostram que uso de cartão corporativo era feito sem critério algum

De medalhas a coroas de flores, além de cabeleireiros e saca-rolhas. Ou fazer a compra de copos de plástico, talheres e bandejas em uma loja, mas pagar a fatura no bar ao lado. Por enquanto, o que mais revelam os documentos que chegaram à CPI dos Cartões é que o ¿suprimento de fundos¿, que cobre gastos realizados por intermédio dos cartões corporativos do governo, vinha sendo usado sem critério algum.

No dia 12 de dezembro de 2007, por exemplo, o professor Renato Guimarães, ex-chefe do Departamento de Geografia da Universidade de Brasília (UnB), pagou com o cartão uma despesa de R$ 280,00 no Bar Gambar, um botequim conhecido no meio estudantil brasiliense.

A Secretaria de Comunicação da UnB informou que Guimarães utilizou o cartão corporativo para comprar, com nota fiscal, ¿utensílios diversos como garrafa térmica, bandejas, papéis-toalha, colheres e copos, para atender às necessidades do departamento¿. A compra, segundo a assessoria, foi realizada em uma loja que, na ocasião, estava sem a máquina para efetuar o pagamento. Como o prazo para a compra no cartão expirava naquele dia, foi usada a máquina de propriedade do estabelecimento vizinho - o Gambar. ¿Os utensílios adquiridos encontram-se no Departamento de Geografia da universidade¿, sustenta a assessoria.

Em maio de 2004, a coordenação da Administração de Palácios da Presidência pagou R$ 400 por uma coroa de flores. Conforme a prestação de contas, a coroa foi enviada pelo falecimento de Nair Casa Cruz, irmã da primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva. O gasto é pequeno, mas chamou a atenção de parlamentares da CPI.

BRECHAS

¿Tenho dúvidas se uma despesa como essa deveria ser custeada com recursos públicos. A regra é frouxa e abre brechas para gastos que não deveriam ser realizados¿, diz o deputado Índio da Costa (DEM-RJ), que localizou a nota. Em janeiro do mesmo ano, o Palácio do Planalto gastou outros R$ 780 com ¿uma coroa de flores nobres grande¿ entregue no velório de Kiola Sarney, mãe do senador José Sarney (PMDB-AP).

Nas prestações de contas da Casa Civil há, ainda, uma série de despesas com ¿balas diversas¿ e bombons recheados (R$ 113,37 no total), realizadas em janeiro de 2004. Os gastos do palácio também incluíram um saca-rolhas de R$ 5,70 e R$ 250 pagos para dedetizar uma das residências oficiais da Presidência. A Casa Civil informou que não comentaria os gastos identificados pela CPI.

Na UnB, a servidora Letícia Ferreira utilizou o cartão corporativo para pagar R$ 26 em um salão de cabeleireiros em novembro de 2004. No mesmo mês, Letícia fez compras em uma loja de brinquedos e outra de calçados. Segundo a assessoria da instituição, o gasto estaria relacionado a um projeto de extensão, mas até o fechamento desta edição, não havia apresentado justificativa.

Também em 2004, Augusto Neto, então funcionário ligado ao Centro de Seleção e Promoção de Eventos da UnB (Cespe), usou o cartão para pagar R$ 680,40 em uisquerias e restaurantes de Brasília. A assessoria do Cespe informou que o servidor está afastado da UnB desde 2006. ¿As despesas foram realizadas durante a gestão anterior e seus comprovantes encontram-se em arquivo morto da Fundação Universidade de Brasília.¿

AZEITONAS

O ¿suprimento de fundos¿ chegou a ser utilizado para despesas semelhantes no governo FHC. O ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza fez compras de supermercado que incluíam óleo, azeitonas verdes, margarina, creme de leite, frango e feijão.

O hoje deputado tucano chegou a admitir que, entre 1997 e 1998, realizou compras de produtos alimentícios porque almoçava no próprio ministério durante audiências de trabalho - onde uma cozinheira do governo preparava as refeições. Segundo Paulo Renato, as despesas foram interrompidas a partir de julho de 1998, depois que a então Secretaria de Controle da União emitiu parecer contrário aos gastos.

Eunício Guimarães, que foi ministro das Comunicações durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, gastou R$ 1,5 mil em um único pernoite no Hotel Unique, em São Paulo. O ex-ministro informou que viajou para abrir um congresso na capital paulista e declarou que aquela foi a única despesa com hospedagem coberta pelo ministério no período em que comandou a pasta.