Título: MPs afetam processo democrático livre, critica novo presidente do STF
Autor: Recondo, Felipe; Samarco, Christiane
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/04/2008, Nacional, p. A8

Gilmar Mendes avalia como perigosa tentação de outros Poderes a substituir Congresso no ato de legislar

Ladeado pelos chefes do Executivo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e do Legislativo, o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN) e o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), o novo presidente do Poder Judiciário, ministro Gilmar Mendes, disse ontem, na solenidade de posse, que a forma como são editadas as medidas provisórias ¿afeta a construção de um processo democrático livre e dinâmico¿ no País. Mendes - que considera as MPs necessárias - pede que se encontre ¿um modelo de aplicação das medidas provisórias¿, mas avalia como perigosa a tentação de outros Poderes quererem substituir o direito de o Congresso legislar.

Gilmar Mendes chamou de ¿modelo desgastado¿ a edição de MPs em profusão. Na opinião dele, ¿os Poderes da República encontram-se preparados e maduros para o diálogo político inteligente, suprapartidário, no intuito de solucionar um impasse que, paralisando o Congresso, embaraça o processo democrático¿.

Na posse, que reuniu 3.600 pessoas no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), Mendes fez, em um discurso curto, um apelo ao ¿equilíbrio constitucional¿, dizendo que o tribunal ¿tem a real dimensão de que não lhe cabe substituir-se ao legislador, muito menos restringir o exercício da atividade política, de essencial importância ao Estado constitucional¿. E acrescentou: ¿Democracia se faz com política e mediante a atuação de políticos.¿

O ministro considera positiva ¿a ampla aceitação da jurisdição como via institucional de resolução de conflitos¿, mas criticou a via ¿judicialista, o que faz o Judiciário ser chamado a atuar na solução de questões cotidianas, mais afetas às atribuições de competência de setores administrativos¿. Como solução, disse estar ¿na hora de a sociedade civil, as organizações não-governamentais, as entidades representativas de classe e órgãos como a Defensoria Pública, por exemplo, mobilizarem-se para combater esse quase hábito nacional de exigir a intermediação judicial para fazer-se cumprir a lei¿. Ele avalia que, ¿por mais eficiente que se torne, o Judiciário não pode tudo¿.

Em um longo discurso, que durou quase uma hora, o ministro Celso de Mello, que falou em nome dos colegas da corte, tratou quase exclusivamente de um tema: o fato de que nenhum dos Poderes da República pode ¿submeter a Constituição a seus desígnios e manipulações e razões de conveniência política¿. Mello pediu ¿respeito incondicional¿ à Constituição e defendeu o eventual ¿ativismo judicial¿ do STF como um remédio para combater a ¿omissão do poder público¿. Sentenciou: ¿É perigoso achar que uma Constituição existe para ser cumprida pela metade.¿

Todos os discursos da solenidade de posse - falaram também o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, e o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Brito - demonstraram preocupação com a ¿crise de funcionalidade do Judiciário¿, o que pode, diante dos gargalos, da morosidade e da burocracia, afetar a ¿credibilidade institucional¿ do Poder.

Mendes disse que o Judiciário está diante ¿de uma imensa demanda reprimida¿, provocada pelos ¿cidadãos que têm consciência de seus direitos¿. A receita, afirmou, é abandonar ¿a obsoleta burocracia judicial, o hermetismo dos ritos processuais e da linguagem jurídica¿. Mendes defendeu ainda fazer mais com os mesmos recursos e pregou ¿a busca incessante pela melhoria da gestão, com a diminuição de custos¿.

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