Título: Documentode militares via Itaipu como ajuda
Autor: Moraes, Marcelo de
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/04/2008, Economia, p. B19

Texto sigiloso de 1986 considera que usina desenvolveu o Paraguai

Se agora o governo brasileiro já admite discutir o pagamento de compensações para o Paraguai por causa do aproveitamento da Usina Hidrelétrica de Itaipu, documentos sigilosos do Conselho de Segurança Nacional mostram que a posição do Brasil já foi bem diferente. Papéis inéditos, guardados na sede do Arquivo Nacional, em Brasília, mostram que o governo brasileiro praticamente considerava ter feito um favor ao Paraguai ao construir Itaipu num projeto de caráter binacional.

Documento chamado ¿Análise da Conjuntura Sul-Americana - Situação Político-Institucional e Estratégico-Militar¿, datado de outubro de 1986, analisa os conflitos existentes ou potenciais entre os dois países e trata diretamente de Itaipu. Nessa data, os militares já haviam deixado a Presidência do Brasil, mas ainda eram responsáveis diretos pela concepção de segurança nacional do País. E o texto, classificado pelos militares como secreto, não deixa dúvidas sobre as vantagens que o Brasil considerava ter garantido ao Paraguai com a construção da usina.

¿Com a construção da Hidrelétrica de Itaipu e a conseqüente inundação de grande área fronteiriça, inclusive o trecho que criava estorvo nas relações de Assunção com Brasília, praticamente desapareceu qualquer fricção entre os dois países. Itaipu representou para o Paraguai um mecanismo de desenvolvimento jamais esperado pela nação guarani. Não só pela usina em si, pois a indústria nacional é incipiente. Mas pelas facilidades oferecidas pelo governo brasileiro, como resultado dos acordos bilaterais¿, afirma o documento.

A avaliação feita pelos setores de inteligência brasileiros aponta também que Itaipu era tão vantajosa para o Paraguai que até mesmo a conclusão de suas obras se transformou num fator de crise para o país. Tudo porque os trabalhadores empregados na construção da usina já não tinham mais onde conseguir emprego.

¿No campo econômico, é patente que uma crise está em andamento. Desde que cessaram as obras da Hidrelétrica de Itaipu, que absorviam, direta e indiretamente, grandes contingentes de trabalhadores, a taxa de desemprego ascendeu a patamares nunca vistos. E a incipiente indústria nacional não pôde absorver essa mão-de-obra desqualificada¿, analisa o relatório brasileiro.

STROESSNER E A IGREJA

O crescimento do tom crítico da Igreja Católica em relação ao governo do general Alfredo Stroessner, ditador do Paraguai desde 1954, também é abordado no documento. Eleito como novo presidente paraguaio, Fernando Lugo é ex-bispo católico, que chegou a ter parentes perseguidos pelo governo Stroessner. Os documentos citam a mudança de comportamento político que a Igreja começava a adotar no Paraguai, deixando de ser incondicionalmente alinhada ao governo Stroessner.

¿A Igreja Católica vem, progressivamente, assumindo uma postura mais crítica aos poderes constituídos. Alguns setores progressistas da Igreja vêm se comportando como opositores ao regime, pregando com insistência a garantia plena das liberdades individuais, o estabelecimento de uma paz real, alicerçada na observância dos direitos humanos, a revogação da lei de segurança, o retorno dos exilados e a eliminação de corrupção no governo¿, descreve o texto.

Segundo o documento, o governo de Stroessner se apoiava em um tripé formado pelas Forças Armadas, Igreja Católica e pelo Partido Colorado, mas já começava a enfraquecer pela mudança de posição que os religiosos passavam a sinalizar. ¿Aos membros desse tripé, em troca do respaldo, o regime distingue e privilegia. São castas¿, diz o documento. ¿As Forças Armadas fazem jus a todas as benesses do poder, seus membros recebem até mesmo alimentação gratuita e os crimes comuns que cometem são ocultados. O partido não perde eleições em face da corrupção nos bastidores e dos instrumentos legais na vanguarda, como o mecanismo de distribuição de cadeiras no Parlamento (o partido obtém sempre 60% do total)¿, descreve a análise feita pelas autoridades brasileiras.

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