Título: Petróleo caro é incentivo a revisões
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/04/2008, Economia, p. B20

Escalada do combustível desencadeou onda de renegociações e despertou interesse por novas fontes de energia

A escalada do preço do petróleo nos últimos anos mudou os parâmetros do setor energético mundial, desencadeou uma onda de renegociações contratuais entre países e despertou o interesse por novas fontes de energia. Nesse cenário de petróleo a US$ 118 o barril, nem a hidreletricidade, produzida com a água, conseguiu sair ilesa.

Recém-eleito presidente do Paraguai, Fernando Lugo já espalhou aos quatro cantos da América Latina que pretende rever os tratados das hidrelétricas binacionais de Yacyretá (com a Argentina) e Itaipu (com o Brasil), a maior usina em operação do mundo, com potência de 14 mil MW. A briga promete esquentar, já que o governo brasileiro disse que o Tratado de Itaipu, assinado em 1973 e que divide em partes iguais a hidrelétrica, não pode ser alterado. Ao mesmo tempo se mostrou disposto a conversar.

Lugo adotou o mesmo discurso que Evo Morales usou quando assumiu o comando da Bolívia, em 2006, e prometeu devolver o país a seus legítimos donos. Um dos primeiro atos do presidente boliviano foi decretar a nacionalização de gás e petróleo, o que provocou conflitos com várias multinacionais. A estatal brasileira Petrobrás foi a mais prejudicada, já que tinha uma série de investimentos em exploração de gás na Bolívia.

Na época, muitos especialistas acusaram o Brasil de não ter atuação firme nas negociações por causa da grande dependência ao gás boliviano, que abastece 50% do mercado brasileiro. O fato é que, apesar das discussões, Morales saiu vencedor e tomou o controle da exploração do gás natural. ¿Nesse ambiente de preços elevados, quem detém os recursos energéticos tem muito mais condições para rever seus contratos, especialmente porque a dependência do resto do mundo é muito grande¿, afirma o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Nivalde Castro.

Ele lembra que desde 2004 Rússia e Ucrânia travam uma guerra pelo gás por causa de divergências sobre o reajuste no preço do produto e renegociações de dívidas. O conflito trouxe apreensão aos países do oeste europeu, que são abastecidos pela Rússia por meio de gasoduto que passa pela Ucrânia.

Além do pagamento da dívida pela Ucrânia, o governo russo exigia um reajuste de 460% no valor do gás, o que não foi aceito e provocou a redução do abastecimento para a Europa. Um quarto do gás consumido no velho continente vem da Rússia e 80% desse fornecimento passa pela Ucrânia. ¿Por causa dessa exposição a União Européia já reabriu um programa nuclear e começou a projetar usinas a carvão¿, diz Castro.

O professor da Universidade de São Paulo (USP), José Goldemberg, destaque que todo esse movimento de alta dos combustíveis fósseis (petróleo e gás) deve-se especialmente a forte retomada do crescimento mundial. ¿Hoje as nações em desenvolvimento, como China, Índia e até Brasil, estão se tornando grandes consumidores de energia. Isso tem provocado um equilíbrio muito justo entre oferta e demanda.¿

Goldemberg é favorável ao uso diversificado dos combustíveis para não ficar refém dos produtores. ¿O declínio das reservas de gás do Mar do Norte, por exemplo, aumentaram a dependência da Europa à Rússia¿, observa o professor. Segundo ele, o Brasil também precisa reduzir sua dependência ao gás da Bolívia, o que deverá ocorrer com a produção das novas reservas. ¿Esse novo patamar de preços está dando origem ao nacionalismo energético. A pressão por novos acordos e contratos só tende a piorar nos próximos anos se o mundo continuar dependente do petróleo.¿

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