Título: Ensino infantil melhora desempenho do aluno em matemática na 4ª série
Autor: Cafardo, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/05/2008, Vida &, p. A24

Estudante que freqüenta creche e pré-escola evolui pelo menos 1 ano de escolaridade quando chega ao fundamental

Crianças que cursam a educação infantil têm melhores notas em matemática nas avaliações feitas pelo Ministério da Educação quando chegam à 4ª série. O fato de freqüentar a creche e a pré-escola faz com que o aluno evolua em um ano de escolaridade. Com isso, seus conhecimentos passam a equivaler ao da média dos estudantes de 5ª série. Em algumas regiões, como no Sudeste, o efeito é ainda maior, e as crianças demonstram desempenho compatível ao da 7ª série.

Os resultados fazem parte do estudo ¿O Efeito da Educação Infantil sobre o Desempenho Escolar medido em Exames Padronizados¿, elaborado pela consultora do MEC Fabiana de Felício e pela economista do Banco Itaú Lígia Vasconcellos. A pesquisa - que trata de crianças entre 0 e 5 anos - é uma das primeiras no Brasil a confirmar numericamente a relevância desse nível de ensino, defendida há anos por educadores. Efeitos semelhantes já foram identificados em outros países.

Segundo Fabiana, os resultados seriam parecidos se fosse analisado o desempenho em português. ¿O impacto é ainda maior em matemática do que em português porque, de um jeito ou de outro, as crianças acabam tendo contato com a linguagem em casa¿, diz a pesquisadora. O estudo analisou os resultados das crianças de 4ª série, apenas de escolas públicas, no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e na Prova Brasil.

O primeiro é um exame de matemática e português feito por amostragem pelo MEC há mais de dez anos. O segundo existe desde 2005 e é realizado com crianças de 4ª e 8ª séries de toda a rede pública nas mesmas disciplinas. As provas analisadas foram feitas em 2003 e em 2005.

A evolução da criança em uma ou mais séries não é algo fora do normal ou além do que seria adequado para a idade. Isso porque o conhecimento demonstrado pelos alunos de 4ª série hoje está longe de ser considerado ideal. Especialistas afirmam que aos 10 anos (4ª série) elas deveriam ter nota equivalente ao que se registra na 8ª série no País. ¿A educação infantil ajuda justamente nisso. As políticas públicas precisam dar importância para esse nível de ensino¿, diz Fabiana.

O estudo mostra o efeito da educação infantil não só no Saeb como também na Prova Brasil e Saeb juntos. No segundo caso, o impacto é maior. Crianças que passaram por esse nível obtiveram, em média, 15,9 pontos a mais que as demais. Segundo os resultados atuais nas duas avaliações, 44 pontos separam o desempenho das crianças de 4ª série das de 8ª, ou seja, a cada 11 pontos a mais, o aluno evolui um ano. A Região Norte foi a que registrou efeito menor (veja quadro).

Estimativas feitas na pesquisa mostram ainda que média seria de 180,5 pontos se todas as crianças brasileiras tivessem freqüentado a educação infantil; quase 15 pontos acima do desempenho que seria registrado se nenhuma criança tivesse acesso à creche e à pré-escola. ¿O desenvolvimento cognitivo, emocional, psicológico e social da criança entre 0 e 5 anos é crucial para a aprendizagem futura¿, diz a coordenadora de educação do Unicef do Brasil, Maria de Salete Silva. Segundo ela, a educação infantil aparece em 36 das 37 redes de ensino do País selecionadas no estudo que aponta bons exemplos.

DÉFICIT DE VAGAS

Atualmente, cerca de 6,5 milhões de crianças freqüentam a educação infantil no Brasil. O atendimento em creches equivale a só 15% da população de 0 a 3 anos - a meta no País, por lei, é chegar a 50%. Na pré-escola, são 67%. Só em São Paulo, apesar de o número diminuir a cada ano, há 120 mil crianças na fila por uma vaga. ¿A demanda pode ser ainda maior porque há mães que desistem. Nosso problema é conseguir terrenos para construir creches¿, diz o secretário municipal da Educação, Alexandre Schneider.

A educação infantil ganhou essa denominação a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996. Antes disso, as creches faziam parte da assistência social dos municípios. Mas isso só começou a sair do papel perto de 2000. Em São Paulo, apenas em 2002 elas foram transferidas para a Educação. As mudanças foram, em parte, influenciadas por resultados de pesquisas científicas mostrando que é na primeira infância que ocorre o maior desenvolvimento do cérebro.

A importância da creche como parte da educação foi selada com a sua inclusão no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Antes dele, havia só o fundo do ensino fundamental (1ª a 8ª séries). Estados e municípios são obrigados a depositar no Fundeb parte dos impostos que arrecadam. O valor total é redividido conforme a quantidade de alunos atendidos pelas escolas de cada rede e com base em um valor mínimo anual por aluno. A União complementa a verba de redes que não chegam ao mínimo.

Quanto menos alunos a rede tiver em cada nível de ensino, menos dinheiro retornará aos cofres públicos. Essa lógica, que já permitiu a quase universalização do fundamental, pode ajudar a aumentar o número de crianças no infantil.

No entanto, o valor determinado para o custo do aluno é motivo de polêmica. Apesar de os gastos serem maiores na educação infantil - cada professor é responsável por menor número de crianças, há mais cuidados com alimentação e saúde -, as prefeituras recebem 80% do valor do fundamental para cada criança em creche. Ou seja, cerca de R$ 85 por aluno ao mês. Na pré-escola, o valor aluno/ano é 90% do fundamental. ¿O cálculo não teve como base critérios técnicos, foi um cálculo político¿, diz o especialista em financiamento na educação Juca Gil.

Nas discussões do Fundeb, os prefeitos, que oferecem o infantil, não tiveram força na queda-de-braço com governadores, que cuidam do médio. Os Estados saíram ganhando e passaram a receber 20% mais que o valor do fundamental para cada jovem matriculado. Segundo a secretária da Educação Básica do MEC, Maria do Pilar, o ministério sabe que o valor está aquém do necessário. Por isso, o governo iniciou um programa de financiamento de escolas nesse nível de ensino, que atendeu cerca de mil cidades.

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