Título: Governo avalia medidas para conter a enxurrada de dólares
Autor: Abreu , Beatriz
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/05/2008, Economia, p. B1

Sem abrir mão da política de câmbio flutuante, saída é aumentar pedágio sobre entrada de capital especulativo

O governo está disposto a recorrer a uma nova calibragem no pedágio cobrado para o ingresso de capitais estrangeiros se, de fato, a chancela do investment grade (reconhecimento de que o Brasil é um País de baixo risco para os investidores) provocar uma enxurrada incontrolável de dólares no mercado doméstico. Nesta quarta-feira, durante a reunião da coordenação política, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, vão avaliar os impactos de curto, médio e longo prazos da reclassificação brasileira pela agência Standard & Poor¿s.

Eles querem criar uma rotina para acompanhar o ingresso de capitais e discutir cenários sobre como tirar proveito do novo patamar da economia, montando uma estratégia de alongamento do perfil da dívida interna e de preservação de um crescimento da economia no ritmo de 5% ao ano. Trata-se de uma reflexão que envolverá o conjunto do governo, sem abrir espaço para idéias que ponham em risco a estabilidade da economia ou mudanças na política cambial. ¿A política é de câmbio flutuante. Ponto!¿, diz um auxiliar de Lula ao Estado.

Segundo essa fonte, o presidente está convencido de que a prática da política de câmbio flutuante trouxe ¿mais vantagens do que desvantagens ao País¿. O câmbio flutuante não impede a valorização do dólar, mas tem o potencial de corrigir eventuais distorções na conta de balanço de pagamento do País ao longo do tempo, como pondera o Banco Central. No entanto, o presidente considera necessária uma reflexão, envolvendo o conjunto do governo, sobre se é necessário ou não criar obstáculos ao capital especulativo.

Esses debates são estimulados pelo desejo de construir um consenso sobre como resolver o problema da crescente valorização do real. A expectativa do Planalto é que o Ministério da Fazenda possa apresentar uma proposta engenhosa, como a que prevaleceu no caso do aumento dos combustíveis. A Fazenda propôs, e Lula aceitou, abrir mão de cerca de R$ 3 bilhões da arrecadação da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para evitar o repasse para os consumidores do aumento de 10% no preço da gasolina nas refinarias.

SEM PRESSA

Ao contrário de outros momentos em que as investidas para frear o ingresso de capital estrangeiro tinham como motivação questões ideológicas, desta vez o governo está mais pragmático. ¿O País mudou de patamar. As soluções exigem uma engenharia financeira sofisticada¿, pondera uma fonte. ¿É preciso agir com ciência e não com emoção¿, diz um assessor, resumindo o pensamento de Lula neste momento.

A aplicação de uma alíquota de 1,5% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre o ingresso de capitais para aplicações em renda fixa e títulos do Tesouro Nacional foi adotada pelo governo em março. Na época, a medida representou um contraponto à decisão do BC de elevar o juro para trazer a inflação para a meta de 4,5% ao ano. Lula entende que a trava do IOF ¿já está posta¿. Uma elevação da alíquota, só deve ocorrer se, de fato, não provocar mais danos do que benefícios à estabilidade da economia.

O presidente não aceitará ponderações contaminadas por uma visão ideológica contra o capital estrangeiro e considera que nada deve ser feito sem a necessária maturação do processo de discussão.

¿Não é preciso fazer nada imediatamente¿, avalia um assessor. Ele lembra que nas conversas que o presidente da República mantém com o presidente do BC, Henrique Meirelles, recebe informações sobre o aspecto benigno do capital estrangeiro que, este ano, estará financiando o déficit em contas correntes. As contas correntes do balanço de pagamentos do País são o resultado das trocas comerciais e financeiras e de serviços com seus parceiros no exterior. Esse déficit saltou no primeiro trimestre para US$ 10,57 bilhões, próximo dos US$ 12 bilhões estimados pelo BC.

Apesar de considerar a possibilidade de os investimentos externos financiarem o déficit em conta corrente, o presidente defende uma melhora no saldo comercial do País, que vem se debilitando desde o início do ano. No quadrimestre, o superávit comercial foi de US$ 4,58 bilhões enquanto, no mesmo período do ano passado, as exportações superavam as importações em US$ 12,9 bilhões.

Para Lula, o anúncio da nova política industrial, no dia 12, e as medidas de desoneração para os exportadores trarão melhor desempenho à balança comercial. ¿Haverá uma melhora no fluxo de caixa das empresas e isso se refletirá na competição dos produtos brasileiros¿, avaliam os assessores envolvidos nos estudos.

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