Título: Guimarães Rosa assessorou generais em conflito com Paraguai
Autor: Moraes, Marcelo de
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2008, Nacional, p. A8

Documento revela que, em 1966, escritor discutiu problema de fronteira com Castello Branco, Geisel e Costa e Silva

Documentos inéditos da ditadura revelam os bastidores do dia em que João Guimarães Rosa, um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos, foi um dos protagonistas de uma reunião do Conselho de Segurança Nacional. Em 11 de março de 1966, o conselho reuniu os principais integrantes do governo militar, incluindo o presidente Humberto Castello Branco e seus futuros sucessores, os generais Arthur da Costa e Silva (então ministro da Guerra) e Ernesto Geisel (secretário-geral do conselho), para discutir questões de fronteira entre o Brasil e o Paraguai.

No meio de generais, como o chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), Golbery do Couto e Silva, e de ministros pesos-pesados, como Octávio Gouvêia de Bulhões (Fazenda) e Roberto Campos (Planejamento e Coordenação Econômica), entre outros, o autor de Grande Sertão: Veredas era figura importante para a discussão. Afinal, paralelamente à construção dos mundos de Riobaldo, Diadorim e Augusto Matraga, entre muitos de seus personagens antológicos, Guimarães mantinha respeitável carreira diplomática e respondia pela chefia da Divisão de Fronteiras do Itamaraty. Sabia de cor cada detalhe das questões de limites entre o Brasil e seus vizinhos.

No caso do Paraguai, não era diferente. Segundo os registros da ata da 36ª sessão do Conselho de Segurança Nacional, guardada no Arquivo Nacional, em Brasília, à qual o Estado teve acesso, o governo reuniu seus principais integrantes nessa reunião para deliberar sobre o tom de uma nota que divulgaria para tentar conter os pleitos paraguaios em relação a parte do território brasileiro.

A principal divergência dizia respeito à reivindicação feita pelo Paraguai de áreas no Salto de Sete Quedas, a maior cachoeira do Rio Paraná, onde o Brasil havia iniciado anos antes levantamentos para um grande aproveitamento hidrelétrico. Mais tarde, esse processo acabaria levando à construção da usina de Itaipu, justamente em parceria com o Paraguai.

Em 1966, porém, esse acordo ainda era impensável. O clima era de discordância total com o vizinho. Na reunião do conselho, Castello Branco queria ouvir a opinião de todo o governo, principalmente a área técnica do Ministério de Relações Exteriores, para definir os termos de uma nota que rechaçasse as pretensões paraguaias.