Título: 'Política indigenista é incoerente', diz governador de RR
Autor: Cimieri, Fabiana
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/05/2008, Nacional, p. A13

Para Anchieta, governo `esvazia fronteiras¿ e arrisca soberania e `índio não precisa de terra¿

O governador de Roraima, José de Anchieta Júnior (PSDB), classificou ontem a política indigenista do governo Lula de ¿inconseqüente, incoerente e irresponsável¿, em palestra para militares no Clube da Aeronáutica, no Rio. Para ele, o governo federal não tem condições de garantir a cidadania dos índios e cede a pressões internacionais para demarcar áreas de reserva junto à fronteira.

¿Essa política equivocada de demarcação de áreas indígenas esvaziando as fronteiras é um risco à soberania nacional. Índio não precisa de terra e sim de condições de vida.¿ O governador disse que dos 2.212 quilômetros quadrados de fronteira entre Roraima, Guiana e Venezuela, apenas 350 quilômetros quadrados não se encontram em terras indígenas.

Segundo ele, há centenas de ONGs internacionais na região. ¿A Funai é um órgão para servir às ONGs e luta pela demarcação para justificar sua existência. Porque quem está levando saúde e educação aos índios é o governo de Roraima, apesar de ser obrigação do governo federal.¿

Anchieta negou que defenda apenas os empresários do Estado, mas insistiu em que a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol em área contínua compromete a vida de famílias que estão lá há décadas. A reserva tem 1,7 milhão de hectares e inclui área de fronteira. Foi reconhecida em 1998, no governo FHC, e homologada em 2005. Arrozeiros que terão de sair da área são os que mais resistem e propõem uma demarcação em ilhas, que preserve os centros de não-índios.

Para Anchieta, o laudo antropológico que autorizou a demarcação é ¿fraudulento e mentiroso¿. Ele já entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Serra do Sol, que ainda não foi julgada. Em abril, obteve liminar suspendendo a operação da Polícia Federal que retiraria os não-índios. O governador argumentou que a operação poderia criar um clima de violência na região.

¿BODE EXPIATÓRIO¿

Ontem, Anchieta disse que os índios ¿estão sendo usados como bode expiatório¿. E ironizou, afirmando que é ¿coincidência¿ que as áreas de reserva estejam sobrepostas às de riquezas minerais. ¿Estou tentando evitar uma tragédia para nosso Estado. O que essas ONGs mais querem é ter um cadáver indígena para dizer que o País não cuida dos seus índios.¿

Disse ainda ter tido acesso à prestação de contas de uma das principais ONGs que lutam pela demarcação da Serra do Sol, o Conselho Indígena de Roraima (CIR). Segundo ele, a ONG recebeu R$ 14 milhões da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) nos últimos dois anos e gastou R$ 12 milhões apenas com folha de pagamento e encargos.

Em São Paulo, o coordenador do CIR, Dionito José de Souza, reagiu: ¿O governo de Roraima é antiindígena porque considera os índios brasileiros como estrangeiros, o que ele diz são inverdades para manipular a sociedade.¿ Sobre a verba, explicou que o CIR emprega 450 funcionários por meio da Funasa. ¿Tudo é legal, temos prestações de contas, o Tribunal de Contas da União nos fiscaliza e se houvesse alguma irregularidade não teríamos esse repasse que temos desde 1996.¿

O líder dos arrozeiros, Paulo César Quartiero (DEM), prefeito de Pacaraima (RR), também estava na palestra no Rio. Ele disse que acatará a decisão do STF. ¿Vamos ter que acatar, mas temos que tomar uma atitude. Nós nos sentiremos pessoas sem pátria¿, disse. ¿Se o STF der área contínua, eles vão nos varrer do mapa? Vamos resistir com o quê? Vamos protestar.¿ COLABOROU ROBERTO ALMEIDA