Título: Projeto de cotas em TV paga provoca polêmica
Autor: Teixeira, Michelly; Cruz, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/06/2008, Economia, p. B22

Para algumas empresas do setor, proposta em discussão na Câmara é excessiva, para outras, tímida

É difícil encontrar quem goste do sistema de cotas para o conteúdo nacional contido na proposta que abre o mercado de TV a cabo para as concessionárias de telefonia local, o chamado projeto de lei 29, em discussão na Câmara. ¿Nunca vai haver consenso entre as empresas¿, afirmou ontem o deputado Jorge Bittar (PT-RJ), relator do projeto, que participou ontem do evento Painel Telebrasil. ¿Meu compromisso é com a população.¿

Segundo ele, a posição contrária às cotas reflete a posição de um grupo dominante. ¿Que se chama Organizações Globo¿, completou. O deputado disse que espera votar o projeto na próxima semana. ¿Eu sempre espero, toda semana.¿ Na semana passada, a votação foi adiada a pedido do governo. Presente ao evento, o diretor da Central Globo de Engenharia, Fernando Bittencourt, preferiu não comentar o projeto: ¿O que eu posso dizer é que é uma ilusão pensar que o aumento da capilaridade vai ampliar a oferta de conteúdo¿.

O Grupo Bandeirantes também não está satisfeito com as cotas, mas pelo motivo contrário. ¿O projeto propõe uma mudança para daqui a quatro anos, o que pode consolidar uma situação nefasta¿, disse ontem Walter Vieira Ceneviva, vice-presidente-executivo do Grupo Bandeirantes, durante o Painel Telebrasil, na Bahia. Ele considera a proposta muito tímida quando ela oferece um período de quatro anos para que as companhias de TV paga distribuam pelo menos três canais nacionais que não sejam produzidos por empresas do mesmo grupo.

¿Nós sozinhos temos três canais¿, exemplificou Ceneviva. ¿A Abril também tem três canais.¿ Para ele, um bom projeto exigiria que as empresas de TV paga se adequassem imediatamente às cotas, e imporia um limite de 50% aos canais nacionais produzidos por empresas do mesmo grupo. ¿O projeto precisa reafirmar o acesso às redes e ser punitivo com o porteiro de boate¿, disse o executivo, referindo-se à posição da Globo, que tem participação na Net e na Sky, as duas maiores empresas de TV paga do País. Bittar admitiu reduzir o prazo de transição ou aumentar a participação de produtores independentes, mas não retirar as cotas.

As operadoras de telecomunicações acham que o melhor seria tirar a discussão de conteúdo do projeto. ¿Isso só resolveria o problema das teles¿, afirmou Ceneviva. ¿Seria como se o Congresso Nacional trabalhasse pelos interesses do México e da Espanha.¿ A mexicana Telmex está no controle da Net e a espanhola Telefónica no da TVA. A lei atual, que o projeto quer modificar, impõe um limite de 49% ao capital estrangeiro nas empresas de TV a cabo. Ela também impede que as concessionárias locais façam parte do controle de empresas de cabo na sua área.

O consultor jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara, teme que o projeto emperre pela falta de consenso entre as partes envolvidas. ¿O meu grande receio é que não tenha mais projeto nenhum.¿ Ele acredita que, para acelerar sua aprovação, a proposta poderia ser fatiada, separando as discussões sobre distribuição e sobre conteúdo.

¿Não há possibilidade de fatiar o projeto¿, afirmou Bittar. ¿Isso seria o resultado de um acerto entre as teles e o radiodifusor dominante. Eu me posiciono contra. Assim como eles podem bloquear o projeto, nós também podemos bloquear. Eu e os parlamentares que pensam igual a mim.¿ Para ele, fatiar o projeto é um eufemismo para jogar a regras do conteúdo ¿para debaixo do tapete¿. Um executivo de telecomunicações, que defendeu a aprovação do projeto como está, disse que o pior seria que a discussão continuasse a se arrastar. Segundo ele, ¿é melhor um fim horroroso do que um horror sem fim¿.

O senador Antônio Carlos Magalhães Júnior (DEM-BA) indicou que há uma tendência de o Senado modificar o projeto, se ele for aprovado na Câmara como está. ¿Acabou entrando no projeto o conteúdo, e uma discussão que merece ser feita é se o conteúdo deve ficar com outro diploma legal¿, disse Magalhães Júnior. ¿Corremos o risco de afastar empresas internacionais capitalizadas, que podiam investir na produção de audiovisual brasileiro.¿

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