Título: Lula procura alternativas para impedir supervalorização do real
Autor: Abreu, Beatriz
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/05/2008, Economia, p. B3

Preocupação é com a deterioração das contas externas do País, que apresentaram déficit no primeiro trimestre

Ribamar Oliveira e Renata Veríssimo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva avaliou ontem a situação das contas externas e o quadro inflacionário, durante reunião no Palácio do Planalto, que contou com a participação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, do presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, do deputado Ciro Gomes (PSB-CE) e do economista Luiz Gonzaga Belluzzo.

Ao final do encontro, o único a falar foi Mantega, que procurou tranqüilizar. ¿A avaliação sobre a classificação do Brasil para grau de investimento foi positiva¿, disse. ¿O Brasil será objeto de novos investimentos externos de boa qualidade.¿

A área econômica trabalha com dois caminhos para evitar que a classificação do País como grau de investimento e o aumento da taxa de juros possam resultar em queda da cotação do dólar no mercado interno, com uma deterioração ainda maior da balança comercial.

Em primeiro lugar, anunciará segunda-feira uma política industrial, com uma ambiciosa desoneração fiscal ¿de bilhões de reais¿ para as empresas exportadoras. Outra decisão já tomada é a criação de um fundo soberano, a ser administrado pelo Tesouro Nacional, cujo objetivo é retirar cerca de US$ 20 bilhões no mercado.

Com isso, a expectativa do governo é provocar uma elevação da cotação do dólar. Embora a constituição do fundo leve tempo, pois terá de ser aprovado pelo Congresso Nacional e suas operações, incluídas no Orçamento da União, o governo espera que a partir do anúncio já seja criada uma expectativa favorável à alta do dólar.

Do lado da política industrial, uma proposta em estudo é a redução do prazo de apropriação dos créditos da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e da Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) na aquisição de máquinas e equipamentos. Atualmente, o prazo é de 24 meses. Com a medida, o custo dos investimentos cairá.

O diagnóstico feito pela área econômica é que não se pode mais segurar a inflação com o auxílio do câmbio. Ao contrário do que ocorreu nos últimos cinco anos, quando a queda do dólar ajudou a reduzir os preços das mercadorias importadas e a manter a inflação sob controle, o governo não pode mais contar com esse mecanismo, pois a valorização do real está afetando de forma significativa as contas externas do País.

Como a inflação dá claros sinais de aceleração, não apenas por causa do aumento de preços dos alimentos no mercado internacional, mas também pela forte elevação do petróleo e seus derivados, a perspectiva é de que a política monetária executada pelo BC seja mais ativa daqui para a frente, quer com a continuidade da elevação da taxa de juros, ou por uma eventual elevação dos depósitos compulsórios dos bancos.

Analistas de instituições financeiras estão fazendo chegar ao BC a avaliação de que a taxa de juros deveria subir cerca de quatro pontos porcentuais para que as atuais pressões inflacionárias possam ser dissipadas. As apostas do mercado para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) estão migrando de outra elevação de 0,5 ponto porcentual para uma alta de 0,75 ponto.

O problema é que uma forte elevação da taxa de juro ampliará os ganhos dos investidores estrangeiros em títulos públicos no Brasil - por meio das conhecidas operações de arbitragens de taxas -, o que levará a uma maior valorização do real.

Uma valorização adicional do real é vista como perigosa para as contas externas, uma vez que o primeiro trimestre deste ano já fechou com um déficit na conta de transações correntes de US$ 10,7 bilhões. Essa conta é resultado do saldo da balança comercial, da balança de serviços (onde são contabilizados as remessas de lucros e os pagamentos de juros, entre outros) e o saldo das transferências unilaterais. O BC projetava um déficit de US$ 12 bilhões na conta corrente, que será revisto.

A preocupação do governo é definir uma forma de lidar com os efeitos da elevação dos juros e da classificação do Brasil a grau de investimento sobre a cotação do dólar, evitando uma maior valorização do real. É nesse contexto que se discute a criação do fundo soberano.