Título: Câmbio, consumo e especulação causam alta de 1.000% em 9 anos
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/05/2008, Economia, p. B4

Para analistas, problemas do aumento do preço do petróleo são estruturais e sem solução no médio prazo

Em 1999, o preço do barril de petróleo atingiu o fundo do poço das últimas décadas: US$ 11,30. De lá até a última sexta-feira, quando foi registrado novo nível recorde, US$ 125,96, a valorização superou 1.000%. Segundo especialistas, são diversas as razões que explicam a disparada dos últimos anos.

A primeira, e mais importante delas, diz respeito à oferta e demanda. Segundo o mais recente relatório da Agência Internacional de Energia (AIE), divulgado no dia 11 de abril, a procura por petróleo em 2008 deve ser de, na média, de 87,2 milhões de barris diários. A oferta é de 87,3 milhões de barris/dia.

¿Nesse ambiente, qualquer problema pontual, como um ataque a oleodutos na Nigéria, provoca forte alta dos preços¿, explica o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor do Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE), Adriano Pires.

A demanda crescente deve-se à expansão dos países emergentes nos últimos anos, sobretudo da China. Nas contas da AIE, o gigante asiático consumia 6,4 milhões de barris de petróleo/dia em 2004. Hoje, são 8,1 milhões de barris/dia, alta de 26,5%. De acordo com analistas, o país tem causado uma pressão adicional nos últimos meses, em razão de compras realizadas com o objetivo de elevar os estoques durante as Olimpíadas de Pequim.

A produção, por sua vez, tem se mantido estável, graças, sobretudo, a dois fatores. O primeiro é que não houve descobertas relevantes nos últimos anos no mundo. Por isso, há tanta expectativa em torno das reservas brasileiras na Bacia de Santos.

O segundo fator é que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), que responde por 40% da oferta e 77% das reservas mundiais, não tem mostrado muita disposição de elevar a produção.

¿O petróleo é um bem finito¿, observa Walter De Vitto, analista da Tendências Consultoria. Ou seja, não interessa a esses países acelerar a extração das reservas, principalmente se a tendência para a cotação da commodity ainda é de alta. ¿O problema (de oferta e demanda) é estrutural e vai se prolongar por mais alguns anos ainda¿, avisa Marcos Paulo Fernandes Pereira, analista do Banco Fator.

A segunda razão do salto recente das cotações está relacionada com o mercado mundial de câmbio. O petróleo tem como referência o dólar, que nos últimos meses se desvalorizou fortemente ante outras moedas. O euro, por exemplo, ganhou quase 15% em relação ao dólar de 12 meses para cá. ¿Para compensar as perdas cambiais, os produtores forçam a alta¿, explica o ex-ministro da Fazenda e ex-deputado Delfim Netto.

A terceira razão diz respeito à especulação financeira. Vários analistas acreditam que a crise das hipotecas de alto risco (subprime) nos Estados Unidos levou muitos investidores que apostavam nesses produtos imobiliários a migrar para o mercado de commodities, principalmente de energia e alimentação. ¿É difícil calcular que parcela dessa alta se deve à especulação, mas há algum impacto¿, diz Francisco Carlos Pessoa Faria Júnior, coordenador técnico da LCA Consultores.

Por tudo isso, os especialistas afirmam que, ao menos no curto e médio prazos, a tendência para os preços ainda é de alta. No fim de abril, a Comissão Européia elevou a projeção para o preço médio do barril em 2008, para US$ 101,20. Foi a primeira vez que a entidade fez uma estimativa do gênero acima dos US$ 100.