Título: Levei um soco no estômago
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/06/2008, Nacional, p. A12

Tucano nega envolvimento em esquema do BNDES e diz que convidará Lula para inauguração de obra feita com recursos do banco

Acuado pela Operação Santa Tereza, que o citou em suposto esquema de desvio de verbas do BNDES, o prefeito Alberto Mourão (PSDB), de Praia Grande (SP), afirma não ter ligação com o grupo de Paulinho da Força (PDT-SP) e anuncia que sua meta é concluir até julho parte da obra de saneamento e pavimentação construída com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) liberados pelo banco. ¿Minha idéia é levar o presidente Lula e a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) para a festa, é uma obra fantástica¿, anunciou Mourão.

Ele atribui a seu próprio assessor especial de gabinete, Jamil Issa Filho, o envolvimento de seu nome na trama. ¿É como se eu tivesse tomado um soco no estômago... quando você vê que aconteceu na sua ante-sala, né?¿, defende-se o tucano, alvo de procedimento no Tribunal Regional Federal. Seus advogados, Mariz de Oliveira e Sérgio Eduardo Mendonça de Alvarenga, entregaram ao tribunal 11 documentos que, segundo eles, atestam a regularidade do empréstimo que Mourão tomou ao BNDES - R$ 123 milhões, dos quais R$ 40 milhões foram liberados para 12 obras na cidade que administra pela terceira vez.

Parcela desse valor teria sido repartida entre integrantes da organização, inclusive Paulinho, segundo suspeita a Polícia Federal. ¿Ficou clara a participação de Paulinho e Mourão na organização criminosa¿, diz a PF.

Leia a seguir entrevista concedida pelo prefeito:

A obra existe mesmo?

São 12 obras. Essa é a minha grande indignação. Falam em financiamento irregular. Mas, para conseguir um empréstimo desses, as exigências são rigorosas. Eu sei a via-crúcis que passei. Esse empréstimo levou quase 2 anos, não foi uma coisa assim, no prestígio político, no lobby.

Qual a participação do lobista João Pedro de Moura, ligado a Paulinho, na liberação desse dinheiro?

Acho que vi esse Pedro uma única vez. Em 2007, o presidente Lula resolveu colocar o financiamento do BNDES como parte do PAC. Me lembro bem da ministra Dilma, ela se levantou numa reunião, ela é meio ríspida, né? Ela falou assim: ¿Vou avisar um negócio pra vocês, nós queremos celeridade nesse programa. Aqueles que escolheram obras têm que ter projeto. A gente quer velocidade.¿

Se alguém tinha poder de decisão para liberar dinheiro era a Dilma. Eles tinham uma diretriz, fazer o máximo numa velocidade maior e que atendesse o plano do governo. Não sou advogado do BNDES, mas nunca vi tanta lisura nos procedimentos de um banco.

Qual sua relação com Maneco, foragido da Santa Tereza?

Sou prefeito por 3 mandatos, mas sou meio desligado, não procuro vida pregressa de ninguém. Sou empresário, você acaba conhecendo.

Eu o conheci mais através do Jamil. Freqüentavam a mesma marina, de vez em quando eu ia almoçar lá. Sei da amizade do Jamil com o Maneco.

Freqüenta o prostíbulo WE, reduto do esquema BNDES?

Não conheço. Não sei se é prostíbulo. Não chamo de prostíbulo porque é perigoso, é um flat.

Seu nome aparece na contabilidade da WE como beneficiário de dinheiro para viagens.

Por que eu precisaria que pagassem se posso tirar quantas passagens quiser por dia, dentro da legalidade, com recursos da prefeitura? Fiquei pasmo, irritadérrimo. O Jamil para fazer média ou qualquer coisa fez isso. Ele vai ter que explicar. Mas não é um crime, concorda que não é crime isso? Mas é absurdo o que ele fez.

Foi traído por ele?

Traído é quando você pactua. Acho que ele errou. Eu vou cobrar? Ele tem que depor, explicar as conversas com o cara (Maneco). O seu estômago fica meio virado. Aquele buraco no estômago de quem está chateado, de quem construiu uma vida pública sólida, transparente.

O sr. é citado nos grampos, diálogos de aliados de Paulinho. Nega que seja amigo deles?

Não sou amigo. Tem gravação minha com eles? Não tem. Se eu tivesse tanta intimidade ficava no telefone pendurado com essas pessoas. Tem gravação minha com o Paulinho? Não. É a prova mais clara de que, se foram vender o que não tinham, foram usando o meu serviço. Deduzo que usaram informação privilegiada para fazer alguma coisa que eu não sei se é criminosa ou não. Quem vai dizer é a Justiça. Uma coisa é certa: não há desvio de dinheiro público.