Título: Cotas na TV paga provocam reação
Autor: Lopes, Eugênia; Marques, Gerusa
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/06/2008, Negocios, p. B10

Deputados temem inundação de enlatados via TV paga e rebaixamento das produções nas emissoras de TV aberta

Uma aliança em defesa da manutenção do conteúdo nacional das produções brasileiras de televisão - que reúne parlamentares, representantes do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT)-, deve barrar, nesta semana, a votação na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara do substitutivo do deputado Jorge Bittar (PT-RJ) ao projeto de lei 29.

O projeto abre o mercado de distribuição de conteúdo na TV por assinatura às empresas de telefonia.

A disputa começou quando Bittar, além de relatar a proposta original para regulamentar a participação das teles na TV a cabo, resolveu discutir o conteúdo das programações. Na avaliação de boa parte dos deputados e das emissoras de TV aberta, a começar pela TV Globo, ao propor uma ¿cota de produção nacional¿ para as emissoras a cabo Bittar pode, na prática, criar um nicho para confinar produtos sem qualidade, ainda que realizados no País.

¿É ingenuidade imaginar que o capital internacional (das teles) vai investir no País para construir, por exemplo, um Projac¿, diz o secretário-geral do FNDC, Celso Schröder, referindo-se ao centro de produção da Rede Globo, no Rio, que emprega milhares de trabalhadores. ¿Os projetos das teles vão chegar prontos ou vai haver um rebaixamento de qualidade. É preciso cuidar para que o capital que chegar não seja predador¿, afirma.

Ex-ministro das Comunicações, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) vai votar contra o PL 29. Ele diz que o projeto ficou confuso ao tratar de convergência tecnológica e do conteúdo. ¿Se não separarem os assuntos, vou votar contra.¿

Em sua avaliação, o Brasil é hoje ¿um País de ponta em termos de qualidade do conteúdo¿ das produções da TV aberta. ¿Acho péssimo se permitir que empresas de telefonia transmitam pay per view (pacotes pré-pagos) e enlatados¿, diz. ¿Empresa de telefonia faz telefonia e empresa de comunicação faz comunicação.¿

¿O problema do projeto é que permite a entrada das teles no negócio de TV a cabo, mas não cria mecanismos que filtrem isso¿, acrescenta Schröder, referindo-se à possibilidade de, por conta do ¿capital predador¿, o País assistir a uma invasão de enlatados via TV paga.

A proposta de Bittar mantém o limite de 30% para a participação das teles na produção de conteúdo e cria um sistema de cotas na programação da TV paga. O objetivo, segundo o relator, é incentivar a produção nacional e independente. Para Bittar, a entrada das empresas de telefonia no mercado de TV por assinatura poderá, nos próximos anos, ampliar o número de assinantes dos atuais 5,3 milhões para 30 milhões.

Autor do projeto original, o deputado Paulo Bornhausen (DEM-SC) diz que a inclusão da discussão sobre conteúdo no projeto é ¿um complicador porque mistura ideologia com profundos interesses comerciais¿.

Contrário à instituição de cotas, Bornhausen promete apresentar um destaque para a retirada desse artigo. ¿A instituição de cotas vai criar um setor despreocupado com a qualidade ao longo do tempo. Vai virar uma igreja¿, diz. ¿O consumidor vai receber um pacote que não comprou.¿

Para o secretário-geral da CUT, Quintino Severo, as cotas até podem ser vistas como forma de proteger o mercado. ¿O Brasil tem boas produtoras, que precisam ser estimuladas.¿ Mas a CUT quer mesmo é que o PL 29 não vá para votação e propõe que seja convocada uma ¿conferência nacional¿. O centro do debate para a CUT é a manutenção do limite de 49% ao capital estrangeiro no cabo. ¿O projeto deixa tudo nas mãos do capital externo.¿

O relator Bittar adverte: ¿Não vou fazer jogo de nenhum grupo privado isoladamente¿. Para ele, a maioria dos grupos está a favor do projeto. ¿Não posso legislar para a Globo.¿ A emissora tem dito que está apenas defendendo interesses legítimos e que rejeita a competição predatória contra uma produção que criou um padrão de televisão aberta no País.

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