Título: Luz e sombra na economia
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/06/2008, Notas e Informações, p. A3

A economia brasileira manteve um firme crescimento no primeiro trimestre deste ano, acumulou uma expansão de 5,8% em 12 meses e poderá, ao que tudo indica, sustentar um desempenho satisfatório em 2008 e 2009. As empresas têm feito a sua parte para reforçar e modernizar a capacidade produtiva do País, investindo cada vez mais em máquinas, equipamentos e construções. O valor investido cresceu 14,9% em quatro trimestres e correspondeu, entre janeiro e março deste ano, a 18,2% do PIB do período. Um ano antes, essa participação havia sido de 16,7%.

Esse avanço resultou principalmente do esforço do setor privado, já que a maior parte do setor público continuou com dificuldades para executar projetos. Essas dificuldades têm resultado ou da falta de dinheiro ou, como no caso do emperrado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de grave incompetência administrativa.

Do lado da demanda, isto é, do uso de recursos, a expansão do investimento é o dado mais positivo, não só por seu efeito real - é o motor do crescimento a longo prazo -, mas também por ser um indicador da confiança do empresariado. Cada novo real investido é uma aposta na manutenção de um cenário propício aos negócios. Os empresários mostram-se dispostos a continuar jogando suas fichas no futuro do País, apesar do atraso das reformas prometidas pelo governo.

Do lado da oferta, ou seja, do fornecimento de bens e serviços, o vigor da indústria é o dado mais positivo, por seu potencial de geração de empregos de qualidade e por seu efeito dinâmico sobre outros setores. No primeiro trimestre, a indústria de transformação produziu 7,3% mais do que um ano antes. A da construção civil cresceu 8,8%, impulsionada pelo crédito.

Há dois aspectos preocupantes, no entanto, nas contas trimestrais divulgadas na terça-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O primeiro, e de longe o mais negativo, é o desempenho do setor público.

Medido a preços de mercado, o PIB do primeiro trimestre deste ano foi 5,8% maior que o de janeiro a março de 2007. Esse número pode ser decomposto em duas parcelas. Medida a preços básicos, isto é, sem os tributos, a produção dos primeiros três meses foi 5,5% maior que a de um ano antes. Os impostos sobre produtos ficaram 8% acima do valor coletado de janeiro a março do ano anterior.

Quando se consideram os valores acumulados em quatro trimestres, o cenário não muda muito: crescimento de 5,2% do valor adicionado a preços básicos e de 9,4% dos impostos sobre produtos. O governo, principalmente no nível federal, aumentou sua participação na economia - não pela prestação efetiva de mais e melhores serviços, mas pelo escorchante valor atribuído a essa prestação. Em 12 meses, o consumo da administração pública aumentou 3,6%, com expansão menor, portanto, que a do consumo das famílias (6,7%) e bem menor que a do investimento (14,9%). Mas foi uma retração temporária: nos primeiros três meses deste ano o consumo do governo cresceu 4,5%, enquanto o das famílias aumentou 0,3% e o investimento, 1,3%.

O crescimento real das despesas de governo vem sendo ininterrupto. Essa expansão tem sido determinada principalmente pelo custeio. A administração pública exerce, portanto, uma constante e poderosa pressão de demanda sobre a economia, favorecendo a inflação. O IPCA subiu no mês passado 0,79%, na maior elevação desde maio de 1996, e acumulou em 12 meses uma variação de 5,58%, mais de um ponto acima do centro da meta fixada para o ano (4,5%). Esse e outros indicadores de preços parecem ter incomodado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas não a ponto de levá-lo a frear a expansão do gasto público. Isso tornaria o combate à inflação menos dependente dos juros altos.

O outro ponto preocupante é a deterioração das contas externas, também mostrada nas contas nacionais. O déficit em transações correntes continua administrável, mas poderá converter-se num problema sério, se continuar crescendo com rapidez. Contas externas no vermelho e inflação em alta formam geralmente um composto explosivo. Enfim, há indícios respeitáveis de que a temporada das vacas gordas está chegando ao fim. A melhor forma de neutralizar o perigo é sanear as contas públicas. Alguém conseguirá vender esta idéia ao presidente num ano de eleições?

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