Título: OMC tenta a última cartada para salvar Doha
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/06/2008, Economia, p. B13

Entidade convoca ministros dos países membros para fechar acordo no dia 21 de julho; se não, só em 2010

A Organização Mundial do Comércio (OMC) dará sua última cartada para fechar um acordo na Rodada Doha. A entidade convocou para 21 de julho uma reunião ministerial para tentar superar as diferenças entre os governos. Um fracasso colocaria toda a rodada no congelador pelo menos até 2010. Para o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, um fracasso em julho pode pôr em risco a própria existência da OMC.

Ontem, o diretor da organização, Pascal Lamy, convocou os governos após reunião com 30 países. A idéia é tentar chegar a um acordo antes do fim do mandato do presidente americano, George W. Bush, em janeiro de 2009. O processo foi lançado em 2001 e deveria ter sido concluído em 2005. Mas os países não se entendem sobre como deve ocorrer a liberalização dos setores agrícola e industrial.

Um dos pontos cruciais da discussão é a permissão para que países emergentes mantenham certas barreiras para a importação de produtos industriais. Para americanos e europeus, cada país deve ter apenas 10% de suas importações protegidas. O Brasil, alegando tentar salvar o Mercosul, exige que um número maior de linhas tarifárias possam ser protegidas.

Na semana passada, o embaixador brasileiro Roberto Azevedo disse que não haveria como negociar se as demandas do País não fossem atendidas. Índia e outros emergentes afirmam que não podem cortar suas tarifas em até 60%, como querem países ricos.

No setor agrícola, os países ricos alegam que não têm como fazer concessões no corte de tarifas e de subsídios se não obtiverem um ¿pagamento¿ dos emergentes em forma de acesso a seus próprios mercados.

REPERCUSSÃO

Para Brown, a convocação para a reunião é um sinal de que o processo está em seu momento crítico. ¿Esse é o capítulo final das negociações¿, afirmou. ¿Tenho certeza de que conseguiremos fechar a rodada.¿ O britânico disse que as atividades diplomáticas nos bastidores vão se intensificar nos próximos dias e que o G-8, o grupo dos países mais ricos do mundo, tratará do assunto em sua cúpula.

¿Eu sei que isso (convocar uma reunião) representa um risco. Mas acho que temos mais de 50% de chance de chegar a um acordo¿, afirmou Lamy. Antes do encontro, os mediadores das negociações apresentarão os novos rascunhos do acordo.

Mas o jogo de tentar encontrar um culpado para um fracasso já começou. O comissário de Comércio da Europa, Peter Mandelson, afirmou que um acordo agrícola já estava quase pronto, insinuando que só faltaria o compromisso dos emergentes, como o Brasil, de abrirem seus mercados para os produtos industriais. O Itamaraty se irritou com os comentários.

Para os americanos, ainda há muito trabalho pela frente. ¿Apesar de termos visto alguns progressos nos últimos dias, há muitas diferenças em capítulos como agricultura, manufaturas e serviços¿, afirmou Sean Spicer, porta-voz do Escritório Americano para o Comércio.

Se um acordo não for fechado agora, a administração Bush terminará e o novo governo terá de ser incorporado ao processo. Por isso, já se fala que um fracasso em julho significaria que a negociação seria retomada apenas em 2010. Para os mais pessimistas, isso pode significar o fim de um processo.

Para os europeus, só haverá acordo se os demais países ¿mostrarem que estão dispostos a flexibilizar posições¿. Na próxima semana, a França assume a presidência da União Européia e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, já disse que não está disposto a abrir seu mercado agrícola. ¿Não obtivemos nada em troca por enquanto.¿