Título: Commodities já são 65% da receita de exportações
Autor: Chiara, Márcia De
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/07/2008, Economia, p. B3

Fatia de produtos manufaturados na balança comercial é inferior a 50% pela primeira vez desde 1980, diz AEB

Cerca de 65% das receitas das exportações brasileiras são hoje provenientes de commodities, produtos sobre os quais o País não tem o menor controle na formação dos preços, afirma o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Ele observa que neste ano, pela primeira vez desde 1980, a fatia dos produtos manufaturados na balança comercial é inferior a 50%. ¿Estamos voltando ao passado.¿

Números da balança comercial agrupados por setores pela RC Consultores mostram que de janeiro a maio deste ano as exportações de bens intermediários, bens de consumo, bens de capital e de petróleo e derivados avançaram em relação ao mesmo período de 2007. Mas o saldo comercial desses setores ficou bem menor que no mesmo período de 2007 por causa do forte aumento das importações.

O único setor que teve acréscimo no saldo comercial no período foi o agronegócio. De janeiro a maio deste ano, o agronegócio acumulou superávit de US$ 19,2 bilhões, ante US$ 15,2 bilhões de saldo comercial positivo no mesmo período de 2007.

¿O câmbio valorizado estimula as importações de bens de capital e de consumo. Além disso, a indústria nacional não evoluiu no mesmo ritmo do mercado interno, que está sendo fortemente impulsionado pela oferta abundante de crédito e ganhos de salário¿, afirma o diretor da RC Consultores, Fabio Silveira. Ele destaca o expressivo aumento do déficit comercial nos bens de capital e setor de petróleo e derivados. ¿Se a indústria não estiver bem preparada, com o câmbio valorizado ela vai perder a batalha para as importações.¿

É exatamente esse movimento que ocorre nos bens de capital. De janeiro a maio, as importações de máquinas e equipamentos, que são uma parcela dos bens de capital, somaram US$ 8,057 bilhões , segundo estatísticas da Associação da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). O acréscimo foi de 43,5% em relação a igual período do ano passado.

Já as exportações atingiram US$ 4,44 bilhões no período e cresceram apenas 10,7% entre janeiro e maio deste ano ante os mesmos meses de 2007. O déficit acumulado até agora é de US$ 3,6 bilhões, 125,8% maior que em 2007.

¿O déficit comercial de máquinas e equipamentos será recorde neste ano¿, prevê o presidente da Abimaq, Luiz Aubert Neto. Ele projeta um déficit entre US$ 10 bilhões e US$ 12 bilhões para 2008 e observa que o crescimento nos últimos anos foi exponencial. Em 2006, por exemplo, o déficit comercial de máquinas e equipamentos foi de US$ 500 milhões. No ano passado, aumentou para US$ 4,5 bilhões.

Na análise do presidente da Abimaq, o aumento das importações é resultado de dois fatores: câmbio valorizado e aquecimento do mercado interno. O fator de maior peso é, segundo ele, o câmbio. ¿Esse movimento não é uma questão de competência e qualidade, mas é resultado do câmbio.¿

PARADOXO

O aquecimento da demanda interna por máquinas e equipamentos concentra-se nos segmentos de petróleo e gás, açúcar e álcool, cimento e mineração, siderurgia, papel e celulose, destaca Aubert Neto.

O paradoxo é que são justamente essas commodities que estão com os preços nas alturas e, por isso, demandam vultosos investimentos em bens de capital, que, realizados por meio de importação, acabam reduzindo o saldo da balança comercial.

¿Não somos contra as importações, desde que venham para melhorar a competitividade das empresas¿, afirma Aubert Neto. Mas, na sua avaliação, não é isso que ocorre no momento. O preço de importação das máquinas compradas da China, por exemplo, não cobre o custo de fabricação desses mesmos equipamentos no Brasil.

Por isso, segundo ele, empresas nacionais deixaram de ser fabricantes: compram máquinas e equipamentos chineses e só revendem os produtos para sobreviver.