Título: Governo quer calibrar PIB de 2009 para 4%
Autor: Graner, Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/07/2008, Economia, p. B6

Objetivo é evitar que novo ciclo de alta da taxa de juros desacelere demais a economia, como ocorreu em 2005

A estratégia do governo para estabilizar a economia é impedir que o ajuste seja feito pelo ¿efeito destruidor¿ da inflação, que penaliza as camadas mais pobres da população e desorganiza os preços nos diversos setores econômicos. A calibragem das taxas de juros, capitaneada pelo Banco Central (BC), é ainda o principal instrumento para desacelerar a atividade para algo entre 4% e 4,5% em 2009, sem jogar o País numa recessão desnecessária.

O cenário mais favorável considera que a economia crescerá um pouco abaixo do Produto Interno Bruto (PIB) potencial, controverso cálculo que aponta o ritmo de expansão que não põe em risco o controle dos preços. As estimativas otimistas colocam o PIB potencial em cerca de 5% e as mais pessimistas, na casa dos 4%.

A desaceleração da economia do ritmo de 5,8%, no fim de 2007, para o intervalo entre 4% a 4,5% no ano que vem, não deve ser entendida como uma medida drástica. ¿Ninguém quer fazer uma recessão¿, pondera um ministro. Ele cita como referência o ajuste adotado em 2005, quando o nível de crescimento foi arrastado para a marca dos 3,2%, o que criou ¿um estado de apreensão¿ no governo, mas, ainda assim, não inibiu os investimentos privados. A situação é muito diferente e a economia, agora, tem melhor condição de resposta para se adaptar a um ritmo compatível com o desejo de trazer a inflação para a meta de 4,5%, definida para os próximos dois anos.

O nível de crescimento da economia de 4% é considerado um nível ¿melhor do que o passado¿ e um sinalizador mais importante que os 3,2% de 2005. ¿Um crescimento acima de 4% é uma coisa extraordinária¿, disseram dois ministros ouvidos pelo Estado.

O cenário internacional sugere que os países vão desacelerar suas economias. O processo é irreversível, seja por força do aumento das taxas de juros ou por meio da inflação. ¿É inevitável essa desaceleração; não vamos continuar crescendo porque a capacidade de continuar crescendo chegou ao limite¿, sustentam alguns analistas.

Para que a estratégia seja bem-sucedida, no entanto, algumas premissas devem ser confirmadas nesse período. Por exemplo: a de que, mesmo que o barril do petróleo chegue aos US$ 200, o preço não se sustente nesse novo nível. Outra variável é o comportamento da taxa de câmbio. Existe a avaliação de que é pouco provável imaginar que o dólar continuará caindo na mesma proporção dos últimos quatro anos. Se essa expectativa se confirmar, haverá um limite na continuada ampliação das importações.

A maior preocupação do governo Lula, no momento, é com a escalada da inflação. A percepção é que, se a economia continuar acelerada, estará criado o ¿caldo de cultura¿ para uma próspera especulação com os preços.

Um estudo empírico avalia que uma inflação de até 5% é considerada estável. No intervalo entre 5% e 10%, entra no terreno perigoso. Acima de 10% é nível de absoluto risco para a volta da indexação, principalmente em economias como a brasileira, onde a memória inflacionária pode ser destravada diante de qualquer movimento persistente de alta de preços.

¿Ninguém suporta uma inflação de dois dígitos. Todos vão querer se defender¿, diz, preocupado, um ministro. É por isso que o governo desvincula o reajuste de 8% no valor do programa Bolsa-Família da tentativa de reindexar o benefício. Para autoridades, trata-se de um problema fiscal de baixo impacto nas contas.

Na semana passada, o presidente do BC, Henrique Meirelles, foi claro: vai controlar a desaceleração do ritmo da economia para trazer a inflação de volta ao centro da meta por meio do aumento das taxas de juros. E disse que não será tolerante com a inflação que, no longo prazo, compromete o crescimento econômico. Ele defende uma posição que não foi a que prevaleceu na década de 70, quando o Brasil e outros países optaram pelo crescimento com mais inflação, que redundou nas crises enfrentadas nas décadas de 80 e 90. O presidente Lula, diante desse cenário, também optou pela desaceleração, sem que o País seja lançado em um processo recessivo por um erro na dosagem das taxas de juros.

Entre os ministros, há a percepção de que as condições do País, hoje, são melhores do que as de quatro anos atrás, quando foi iniciado o segundo ciclo de aperto promovido pelo BC. O principal fator que diferencia os dois momentos é o aumento dos investimentos nos últimos anos, que elevou a produção interna. Isso indica que é possível estabilizar a inflação sem dar um tombo na taxa de crescimento. Some-se a essa avaliação a expectativa de que a alta nos preços de commodities, origem da atual crise inflacionária, mesmo que persista, não seguirá no mesmo ritmo em 2009.

PROCESSO LONGO

Para economistas do mercado financeiro, o mais provável é que o crescimento da economia fique entre 3% e 4%. O economista e ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas avalia que o ciclo de alta nos juros será longo. Para ele, esse processo, combinado com uma desaceleração simultânea na Europa e nos países emergentes (incluindo a China), que já iniciaram uma elevação dos juros, criará restrições para a expansão da economia brasileira. Os países emergentes ainda estão com uma taxa de juros média negativa em 0,5%, segundo Freitas.

A situação mundial, agora, como explicou, é inversa à vivida até poucos anos atrás, quando a China exportava deflação para as outras economias, o que estimulou a globalização e uma aceleração mundial.

O economista do Banco Itaú Joel Bogdanski disse que o discurso otimista do Ministério da Fazenda não corresponde à percepção do mercado financeiro, que estaria ¿mais realista¿. Para ele, o crescimento da economia não deverá atingir os 4,5% em 2009. ¿Tudo dependerá da situação internacional e da crise com a inflação¿, afirma.

Bogdanski explica que a desaceleração das economias desenvolvidas vai naturalmente impor um crescimento menor para os países emergentes, que, além disso, estão tendo de subir suas taxas de juros para conter a inflação. ¿Assim, é natural que o crescimento recue para cerca de 3%, mas dever ser algo temporário¿, ressaltou o economista. ¿O País voltará a crescer.¿